Gabinetes vigiados
Ameaças levam a Polícia Federal e a Polícia Legislativa a reforçar esquemas de segurança dos filhos do presidente
Desde o início do mês, quando tomaram posse os novos parlamentares em Brasília, dois gabinetes do Congresso chamam atenção pelo movimento atípico. No 350, que fica no prédio conhecido como Anexo IV da Câmara, dois homens de terno permanecem postados diante da porta fechada. No corredor, eleitores de várias partes do país se aglomeram, formando uma pequena fila. A placa “entre sem bater” foi retirada. Nesse gabinete, ninguém entra sem se identificar — e há uma inspeção rigorosa para checar as intenções dos visitantes. Os homens de terno — na verdade, seguranças armados — pedem identidade, anotam os dados, perguntam o motivo da audiência, entram, conversam, entram de novo, telefonam, devolvem o documento, pedem às pessoas que aguardem. Percebe-se uma certa dose de tensão quando o dono do gabinete, o deputado Eduardo Bolsonaro, o Zero Três, aparece.
De acordo com os serviços de inteligência do governo, especialmente os da área militar, as ameaças contra a família do presidente são reais e não devem ser negligenciadas. O protocolo estabelece que o deputado tem de ser acompanhado 24 horas por dia por seguranças. Uma equipe de doze homens da Polícia Legislativa foi destacada para a missão. Mas eles não fazem só vigilância. Além de ficarem de olho em todos que se aproximam, têm outros cuidados. O Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência recomendou que o carro do parlamentar seja conduzido por um motorista treinado em direção defensiva. Mas Eduardo prefere ele mesmo dirigir o carro e já requisitou um blindado à Câmara. Outra medida: quando viaja, mesmo acompanhado dos seguranças, usa bonés para dificultar sua identificação.
Do outro lado do Congresso, no Senado, a rotina de Flávio Bolsonaro, o Zero Um, segue o mesmo protocolo. Na quarta-feira 20, um grupo de uns dez eleitores aguardava o parlamentar na recepção em frente de seu gabinete. Antes de qualquer coisa, cada um deles também teve de apresentar a carteira de identidade e informar o motivo da visita — um senhor queria entregar uma carta ao senador, um segundo queria pedir ajuda para a promoção do filho e uma senhora dizia-se portadora de uma mensagem de um general, entre outros. Atentos, dois policiais acompanhavam tudo de perto. Ninguém foi atendido naquele dia.
É ao redor de Carlos, o Zero Dois e o filho mais próximo do presidente, que se percebe o maior cinturão de proteção. O vereador carioca tem à sua disposição uma equipe de agentes da Polícia Federal. Em dupla, os policiais ficam postados diante do gabinete 905, no 9º andar do anexo do Palácio Pedro Ernesto, onde funciona a Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Encontrar o Zero Dois é tarefa ainda mais difícil. Na terça-feira, VEJA esteve no prédio em dois momentos ao longo do dia. Na portaria, no intervalo de duas horas, viu três pessoas pedindo para subir ao gabinete. Os funcionários da recepção dispensaram todos os visitantes de imediato. “Ninguém sobe”, diziam. Um deles afirmou que a orientação era para barrar todo mundo que não tivesse uma autorização prévia do vereador ou de seu chefe de gabinete. O controle estrito é determinação do próprio presidente. Depois da crise com o ministro Bebianno, Carlos foi orientado a submergir e sumir dos holofotes.
“A gente sempre ignorou ameaça de internet, até que teve a questão do Adélio (Bispo, autor do ataque a Bolsonaro). Tenho de reconhecer que eu sou um alvo compensador para atingir o presidente. Ele pode representar uma ameaça a qualquer tipo de coisa, ao crime organizado, a interesses escusos”, disse Eduardo a VEJA. O deputado é policial federal e tem direito à posse e ao porte de arma. Seu revólver costumava ficar em casa. Nos últimos tempos, no entanto, ele tem andado armado, inclusive nos deslocamentos ao Congresso. O deputado confirma que tem recebido ameaças, todas elas pela internet e devidamente encaminhadas à Polícia Federal. Mas garante que isso não é, nas suas palavras, “mimimi”. “Acha que eu vou ficar falando que tenho recebido ameaças ou que vou sair do país por causa disso? Isso é ridículo”, ironizou, provocando o ex-deputado Jean Wyllys, que renunciou ao mandato e se mudou para a Alemanha, alegando ser vítima de ameaças por parte de grupos bolsonaristas.
Os militares que cuidam da segurança do presidente Jair Bolsonaro tentaram convencê-lo, sem sucesso, a não desfilar em carro aberto na cerimônia de posse. Havia o receio de que ele fosse alvo de um novo atentado. A preocupação continua em nível elevado. Recentemente, o GSI gastou quase meio milhão de reais para adquirir e equipar um carro. O veículo, um SUV Pajero, recebeu uma blindagem especial que protege a lataria, os vidros, o tanque de gasolina, o assoalho e até os pneus contra disparos de armas pesadas.
Com reportagem de Hugo Marques
Publicado em VEJA de 27 de fevereiro de 2019, edição nº 2623
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