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Entre ambientalistas, o óbvio nem sempre floresce

VEJA conversou com líderes de ONGs que defendem a pauta ecológica; para eles, Marina Silva larga na frente, mas há ressalvas

Por Fabio Pontes
Atualizado em 6 jun 2018, 17h35 - Publicado em 6 jun 2018, 07h00

No ano em que são lembrados os trinta anos do assassinato do líder ambientalista Chico Mendes, as pessoas que hoje estão à frente de instituições que defendem pautas ecológicas — algumas delas fundadas pelo próprio seringueiro — ainda não encontraram um representante entre os pré-candidatos à Presidência da República.

Para os “herdeiros” de Chico Mendes, nem mesmo Marina Silva (Rede), que conta com um passado de defesa da Amazônia ao lado do seringueiro e de atuação enquanto ministra do Meio Ambiente no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), é uma certeza de voto. Apesar de contar com a simpatia de cinco dos seis entrevistados por VEJA, ela é vista com desconfiança por alguns.

O único consenso é que uma vitória de Jair Bolsonaro (PSL) para o Palácio do Planalto representaria um retrocesso às políticas ambientais do país.

Presidente da SOS Amazônia, organização não governamental sediada em Rio Branco (AC) e que teve Chico Mendes como um de seus fundadores, Miguel Scarcello vê Marina Silva como a candidata mais compromissada com a pauta ecológica. No entanto, ele faz ressalvas: “Acho que o cenário político não favorece muito para que ela conduza com tanta determinação a questão ambiental”.

Scarcello queria mesmo é que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) fosse candidato. “Considero que o governo do PSDB com FHC foi bastante relevante para a parte ambiental. Em partes com o governo do Lula também, até determinado momento”, diz. Para ele, a principal contribuição do mandato do petista foi a redução nos índices de desmatamento, que voltou a crescer no início do segundo mandato de Dilma Rousseff (PT), em quem ele votou no segundo turno em 2010 e 2014 — no primeiro, foi de Marina nas duas eleições.

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Ele sustenta, no entanto, que ambientalistas não devem ter bandeira política-partidária. Para Scarcello, o movimento deve estar aberto para dialogar e buscar parcerias com quem estiver no poder, independentemente da legenda. “Todos têm que ser aliado da causa”, afirma. Ele diz, no entanto, que há políticos com quem não é possível dialogar, buscar parcerias e projetos. “Acho o Bolsonaro impossível de abrir portas.”

De modo geral, ficar em cima do muro é a regra entre dirigentes de ONGs. Por se tratar de entidades que atuam de forma direta com políticas públicas — em parceria com órgãos estatais — mostrar simpatia pelo candidato A ou B pode implicar em perda de apoio político e financeiro.

“O voto é secreto”, responde Nilo D’ávila, diretor de campanhas do Greenpeace. Apesar de preferir não expor suas preferências, ele faz críticas aos presidenciáveis por não terem uma agenda ambiental clara. As mais contundentes também são voltadas deputado federal pelo PSL: “Ele ameaça todo tipo de minoria com uma agenda de retrocessos, que pode colocar a segurança hídrica, a segurança climática e dos povos da floresta em risco”, afirma. “Aquilo de que menos precisamos na Amazônia e no Brasil como um todo é de mais fuzis, de mais armas. Precisamos de mais diálogo.”

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Quanto a Marina Silva, D’ávila diz que a ex-ministra “larga na frente” entre os que melhor representam o ambientalismo. “Ela tem um acúmulo programático”, define.

Para o diretor do Greenpeace, a ex-ministra deverá disputar os votos do eleitorado ecologicamente correto com Guilherme Boulos. O motivo é, na verdade, a escolhida como vice na chapa do PSOL: Sônia Guajajara, ex-presidente da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e uma das principais porta-vozes do movimento indígena nacional.

D’ávila, porém, prefere aguardar as propostas dos presidenciáveis para definir o voto. “Estou realmente dentro desse emaranhado, nesse engarrafamento de candidatos, esperando o momento em que os programas dos candidatos serão protocolados”, explica.

‘Aquilo de que menos precisamos na Amazônia e no Brasil como um todo é de mais fuzis, de mais armas. Precisamos de mais diálogo’, diz Nilo D’ávila, diretor do Greenpeace (Heitor Feitosa/VEJA.com)

Assim como ele, Adriana Ramos, coordenadora de Política e Direito do Instituto Socioambiental (ISA), vê em Guajajara uma oportunidade para a agenda ambiental ser reforçada no debate eleitoral de 2018. O ISA desenvolve trabalhos em comunidades tradicionais da Amazônia, com destaque para as indígenas.

A candidata da Rede também é vista com bons olhos: “A Marina tem uma relação de vida com essa causa e com o próprio Chico Mendes, o que deve se refletir nos vários aspectos do seu programa de governo”, analisa ela, que já foi tanto eleitora quanto fez campanha para a ex-ministra. Em 2018, declara que vai esperar a definição de todas as candidaturas para escolher em quem votar.

Sobre Bolsonaro, Ramos é enfática: “[Ele] Se manifesta reiteradamente como um cético climático, incapaz de compreender a essencialidade dessa agenda no mundo de hoje”. Ela crê que, caso o deputado seja eleito, os compromissos assumidos pelo Brasil para reduzir suas emissões de gases que contribuem para o aquecimento global sejam cancelados.

Adriana Ramos, do ISA (Instituto Socioambiental)
‘A Marina tem uma relação de vida com essa causa e com o próprio Chico Mendes, o que deve se refletir nos vários aspectos do seu programa de governo’, analisa Adriana Ramos, coordenadora do ISA (Claudio Tavares/ISA/Divulgação)

Virgílio Viana, presidente da Fundação Amazonas Sustentável (FAS), organização que tem como principal atuação o pagamento de auxílio (Bolsa Floresta) a famílias que moram em comunidades rurais no interior do Amazonas, avalia o nome de Bolsonaro como o mais desvantajoso entre os já postos. Para ele, a proposta do deputado federal de fundir os ministérios da Agricultura e Meio Ambiente representa um sério retrocesso. “Teria muito mais cara de agricultura do que meio ambiente para enfraquecer a agenda ambiental, e não o contrário”, diz.

Ele afirma ver com simpatia as candidaturas de Marina e Ciro Gomes (PDT), mas defende a ideia de que a agenda ambiental brasileira “não fique estigmatizada como sendo de direita ou de esquerda”. “Ela é uma agenda de sobrevivência, ela tem uma base científica. Nós estamos diante de fundamentações com ciências exatas e biológicas. Portanto, ela aponta para uma determinada lógica e não ‘ideológica’.”

Virgílio Viana, presidente da FAS, do Amazonas
‘É uma agenda de sobrevivência, ela tem uma base científica. Nós estamos diante de fundamentações com ciências exatas e biológicas. Portanto, ela aponta para uma determinada lógica e não ‘ideológica”, diz Virgílio Viana, presidente da FAS (FAS/Divulgação)

André Guimarães, diretor executivo do Instituto de Proteção Ambiental da Amazônia (Ipam), prefere citar os partidos aos candidatos. Para ele, legendas como a Rede Sustentabilidade e o PSOL são as mais alinhadas com a pauta ambiental. Vindo por fora e um pouco apagado está o Partido Verde, pelo qual Marina disputou pela primeira vez a Presidência em 2010. Foi naquele ano que Guimarães votou nela. Em 2014 estava fora do Brasil. Para 2018 diz não ter definido ainda um candidato, mas que sua escolha não se dará somente a partir de sua visão ambientalista.

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“Há um conjunto de partidos de linhas ideológicas, que estão muito reacionárias, muitas vezes pseudonacionalistas. Esse tipo de visão mais conservadora traz implicações para o meio ambiente. Em geral, tendem a deixar as questões sociais e ambientais em segundo plano”, diz.

O diretor do Ipam enxerga essa visão de direita e centro-direita como a mais forte entre os postulantes ao Planalto, o que, para ele, representa “riscos para as conquistas socioambientais”. “Estamos vivendo um momento de potencial retrocesso, que é o que deve fazer a gente ter consciência na hora de votar.”

André Guimarães, diretor executivo do IPAM
‘Estamos vivendo um momento de potencial retrocesso, que é o que deve fazer a gente ter consciência na hora de votar’, afirma André Guimarães, diretor executivo do Ipam (IPAM Amazônia/Divulgação)

Joaquim Belo, presidente do Conselho Nacional das Populações Extrativistas, que até 2007 se chamava Conselho Nacional dos Seringueiros, instituição fundada por Chico Mendes, em 1985, afirma não ver em nenhum dos candidatos ao Planalto aquele que tenha uma proposta de desenvolvimento econômico “que tenha zelo pela questão ambiental”. Ele defende uma política nacionalista, de defesa da soberania e não “entreguista do patrimônio nacional ao capital internacional”.

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Ele, que vive do cultivo e extração de açaí, conta que votou em Lula e em Dilma nas últimas eleições. Para 2018, afirma esperar a definição do cenário para saber se o ex-presidente poderá concorrer. Caso o petista fique de fora, afirma que votaria no candidato indicado pelo PT. Isso não ocorrendo, Ciro seria sua primeira opção.

Sobre Marina, ele diz não ter certeza se a ex-senadora seria a representante legítima da causa ambiental entre os presidenciáveis. “Acho que ela hoje representa muito mais a Neca Setubal e o banco Itaú do que a nossa luta. Acho que nós perdemos a Marina em determinado momento”, afirma. Sobre Jair Bolsonaro, ele é ainda mais duro: “É um maluco. Ninguém entende o que aquele cidadão diz”.

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