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Do PSOL à militância conservadora: a mulher que hostilizou Butler

Ex-candidata pela esquerda, Celene Carvalho, tradutora de 52 anos, é anticomunista, anti-PT e liderou protestos contra a filósofa americana, Lula e Suplicy

Por Ricardo Chapola
Atualizado em 17 nov 2017, 18h01 - Publicado em 17 nov 2017, 17h47

Defensora ferrenha dos valores da família tradicional brasileira e integrante de movimentos anti-PT e anticomunismo, a tradutora Celene Salomão de Carvalho, de 52 anos, que se tornou célebre por participar de protestos recentes, recebeu a reportagem de VEJA durante consulta ao podólogo que frequenta há mais de 15 anos. Ezequiel Rocha atende Celene, o time profissional do Corinthians e já cuidou dos pés do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante todo o primeiro mandato do petista.

“Sempre falava para o Ezequiel passar tétano para ele [Lula], mas nunca deu certo”, afirmou Celene em tom de piada, antes de o podólogo fazer uma imitação de Lula.

Celene virou notícia pela última vez na semana passada depois de ter agredido a filósofa americana Judith Butler no aeroporto de Congonhas – ela nega ter sido autora de qualquer tipo de agressão. Butler é professora e referência no estudo da teoria de gênero no mundo e veio ao Brasil para participar do seminário “Os Fins da Democracia”, organizado pela Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade de Berkeley, onde dá aulas.

No seminário, realizado no Sesc Pompeia, na zona oeste de São Paulo, já havia ocorrido, com a presença de Celene, um ruidoso protesto contra Butler, que teve um boneco seu incendiado aos gritos de “queimem a bruxa” pelos manifestantes. Depois, a americana também foi hostilizada em Congonhas.

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“Não teve nenhuma agressão. Eu fiquei sempre a um metro, um metro e meio de Judith. E o tempo todo só falava que ela não era bem-vinda aqui”, disse Celene, segundo quem foi a namorada da filósofa que começou a confusão. De acordo com o relato da tradutora, enquanto ela empunhava placas de protesto e proferia palavras de ordem contra Butler, a namorada da americana travou o carrinho de bagagens na frente de Celene e a xingou.

“Então fiquei naquele vai-vem para tentar me desvencilhar do carrinho, que a minha bolsa estava em um também. E aí dou uma guinada, ela dá uma empurrada no carrinho e eu puxo… Não houve nenhuma agressão ali, foi mais uma disputa de puxa carrinho”, contou Celene.

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A delegada Fernanda Herbella, da Delegacia de Atendimento ao Turista do Aeroporto de Congonhas (Deatur), disse que Butler foi perseguida por uma mulher que portava uma placa com mensagem de protesto e proferia xingamentos contra a filósofa. Testemunhas afirmam que Celene também teria dado um tapa em uma mulher que saiu em defesa da americana durante a confusão.

Na versão da tradutora, ela é que foi vítima de agressões físicas. Celene disse que um rapaz chegou a jogar café quente em cima dela. “Uma hora veio um cara e despejou café quente em mim. Eu catei esse cara por trás, porque eu recuo um pouco, e tiro ele do caminho, jogo ele para o lado. Pego a placa de novo e continuo atrás da Judith Butler”, disse. “Mas sempre distante dela, um metro, um metro e meio. E aí chega uma outra moça e começa a me falar: “Homofóbica, homofóbica”.

Questionada sobre a origem da notícia de que tinha agredido Butler, a tradutora disse ter sido invenção dos apoiadores da filósofa. “Eles sempre fazem isso. São eles que xingam a gente de racista, fascista, homofóbico (…)”, disse Celene, que explicou o motivo do protesto contra a intelectual – para ela, a filósofa tenta difundir ideias com o objetivo de “destruir a família”.

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“A ideologia de gênero é uma sequência de coisas. Você tem o aborto, você tem o casamento gay, você tem a zoofilia, o incesto, a mudança de sexo. Esse é o plano do negócio. E a finalização disso é a destruição da família. Essa é a meta delas”, afirmou.

Outros protestos

O protesto contra Butler não foi o primeiro do qual Celene participou. A tradutora fez parte de alguns movimentos que foram às ruas pedir o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Durante as manifestações, ficou conhecida por ter sido uma espécie de guardiã do “Pixuleco” gigante, o célebre boneco inflável de Lula vestido como presidiário usado por manifestantes antipetistas. Era Celene quem cuidava do boneco, inclusive levando-o para costurar quando sofria algum ataque de manifestantes de esquerda e era furado.

Celene esteve em outro protesto que terminou em confusão em 2015, quando participou de um ato contra o vereador Eduardo Suplicy (PT), na Livraria Cultura, na Avenida Paulista. Na época, o petista era secretário do então prefeito Fernando Haddad (PT). Em vídeos divulgados na internet, ela aparece hostilizando Suplicy, esgrimindo um “Pixuleco”.

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Ela também foi vista em dois barulhentos protestos no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM) por causa da participação de uma menina em uma performance na qual o artista Wagner Schwartz ficava nu e era tocado pela criança. Em uma dessas manifestações, um funcionário do museu chegou a ser agredido.

Celene de Carvalho (à direita, na foto), durante protesto em frente ao Museu de Arte Moderna (MAM), em São Paulo (SP) (Renato S. Cerqueira/Futura Press/Folhapress)

Candidata pelo PSOL

Nascida em 1965, em São Lourenço, cidade com cerca de 50 mil habitantes em Minas Gerais, Celene disse ser uma anticomunista de carteirinha desde os 15 anos, muito por causa do pai, Célio Martins de Carvalho, um mineiro do ramo hoteleiro. “Estive nos países comunistas com meu pai. Ele disse um dia para mim: ‘minha filha, você vai fazer 15 anos, vamos lá para você ver que esse troço não funciona.’ Então, eu tenho essa turma comunista, socialista, atravessada na garganta desde os 15 anos”, afirmou.

Apesar de morar em São Paulo, Celene foi candidata à Prefeitura de São Lourenço nas eleições de 2012 – pelo PSOL, uma legenda identificada com o discurso de esquerda. Questionada se não achava incoerente a candidatura por um partido com um discurso oposto ao seu, Celene afirmou que era a única alternativa na época e disse ter combinado com o então presidente da sigla, Plínio de Arruda Sampaio, morto em 2014, que deixaria a legenda se fosse eleita.

“Não tinha partido nenhum mais. Estavam todos ou coligados ou vendidos. O PSOL não tinha nada a ver comigo. Mas conversei com Plínio, disse que não concordava com nada do PSOL. Mas disse que precisava de um partido para me candidatar”, contou Celene. “Se acontecesse um milagre e eu fosse eleita, prometi sair da sigla. E ele aceitou.”

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VEJA foi até a Justiça Eleitoral teve acesso ao programa de governo apresentado por Celene em 2012, no qual a tradutora propunha “promover a inclusão social e a igualdade entre os gêneros, raças e etnias, e o respeito à diversidade sexual”. Questionada sobre se tinha mudado de opinião, a tradutora se espantou: “Olha… Isso aí é novidade para mim”, disse. E emendou depois de um tempo: “Tem que olhar lá com calma, porque tem coisas que você não pode sair muito da linha do partido. Pode ser por isso que isso esteja aí.”

O desempenho eleitoral dela foi bem modesto: apenas 370 votos ou 1,5% do total, o que lhe rendeu a última posição entre quatro candidatos à prefeitura.

Resultado final da eleição para prefeito em São Lourenço (MG), que Celene de Carvalho disputou pelo PSOL (Reprodução/Reprodução)
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