Dilma estuda criar de fundo de compensação para índios
Já se preparando para o 'efeito Marina Silva' na campanha do ano que vem, governo vai tirar da gaveta propostas ambientais engavetadas há 11 anos

Sem uma agenda concreta que contemple a questão indígena no país – e já diante da necessidade de reforçar o discurso ambiental para 2014 -, a presidente Dilma Rousseff estuda criar um fundo de compensação para índios que vivem em áreas próximas às hidrelétricas previstas no plano de energia do governo para 2021. O Planalto também prepara a regulamentação de um artigo da Constituição que obriga o poder público a consultar as comunidades indígenas antes de operar essas usinas.
As ações de Dilma fazem parte de uma estratégia para reforçar o governo federal no embate com a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva (PSB) – crítica da política de desenvolvimento do país, que, segundo ela, não é sustentável. Ex-petista, Marina aliou-se ao projeto presidencial do governador Eduardo Campos (PSB), e cogita-se que dispute a sucessão presidencial do ano que vem na condição de vice do pernambucano. As duas medidas que o governo tenta reativar por causa do “efeito Marina Silva” ficaram paradas por quase onze anos de gestão petista no Palácio do Planalto.
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A primeira delas, o fundo de compensação, é uma antiga reivindicação dos índios. Ele seria criado com dinheiro da Compensação Financeira pela Utilização dos Recursos Hídricos (CFURH), paga pelas empresas que exploram as hidrelétricas. A verba equivale a 6,75% do valor total de energia mensal produzida pelas usinas. Só entre janeiro e setembro deste ano, foram repassados 1,3 bilhão de reais da seguinte forma: 45% para os municípios atingidos pelos reservatórios, 45% distribuídos aos estados onde estão as usinas e 10% para a União.
Uma das propostas que circula no governo, elaborada pelo Instituto Acende Brasil, voltado ao setor elétrico, prevê que a União abra mão de metade do que recebe, e os estados abram mão de 22% da sua cota.
O Plano Decenal de Energia 2021 do governo federal prevê a construção de 34 hidrelétricas na Região Norte do país. Atualmente elas estão em fase inicial ou ainda só no papel. Nesse plano, para o qual valeriam as novas regras de compensação dos índios, não estão incluídas as polêmicas usinas de Belo Monte, Jirau e Santo Antônio, alvos de constantes embates entre as comunidades atingidas e o governo federal.
A segunda medida prevista no pacote pró-indígenas de Dilma se refere ao artigo 231 da Constituição, que prevê que os potenciais energéticos oriundos de recursos hídricos só podem ser aproveitados após consulta às comunidades que vivem no local de instalação do empreendimento. Segundo integrantes do governo, essa medida já é considerada urgente no Planalto.
Adicionalmente, o governo também regulamentará a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário desde 2003. Essa convenção também estabelece critérios para consulta aos índios.











Belo Monte – As comunidades indígenas atingidas na construção da usina de Belo Monte, no Pará, dizem não ter sido consultadas – o governo alega que fez a consulta. Os índios que vivem próximos a Belo Monte chegaram a invadir o canteiro de obras da usina, que deve ser entregue em 2015.
“Sem uma regra, fica esse mal estar generalizado. A Funai [Fundação Nacional do Índio] garante que consultou todas as comunidades indiretamente afetadas por Belo Monte, mas diversos líderes indígenas asseguram que isso não ocorreu. Como não há uma regulamentação, essa insegurança permanece”, diz o secretario nacional de articulação social da Secretaria-Geral da Presidência, Paulo Maldos.
“Os povos indígenas têm suas próprias formas de debater temas sobre seu futuro, e nossa regulamentação precisa dar conta disso, quer dizer, vamos criar um mecanismo que absorva o protocolo de cada povo, de cada etnia”, diz Maldos.
Na avaliação do secretário, as crescentes dificuldades enfrentadas pelo governo federal na construção da usina hidrelétrica de Belo Monte detonaram a necessidade de regulamentar o artigo 231 da Constituição e a Convenção 169 da OIT. Segundo ele, os critérios para a consulta de comunidades indígenas antes da operação das usinas hidrelétricas estarão prontos até o fim do primeiro semestre deste ano.
Maldos destaca o artigo 7.º da convenção da OIT, que prevê que os povos afetados devem participar da formulação, implementação e avaliação de “planos e programas de desenvolvimento nacional e regional que possam afetá-los diretamente”.
“Temos 325 diferentes povos no Brasil, e 180 línguas distintas. Então a regulamentação deve contemplar os diferentes protocolos para o Estado se relacionar com os nossos povos”, afirma Maldos. “Levei caixas com o texto da Convenção 169 para o Xingu, e todos os líderes o receberam muito bem. Sabem que esse será um instrumento importante para eles”, completa o secretário.
(Com Estadão Conteúdo)