Derrota acachapante
STJ diminui pena de Lula — e sua defesa tenta cantar vitória. Não deu. Com a redução, veio uma péssima notícia para o petista: a condenação por unanimidade
Enganou-se quem viu na comemoração de alguns militantes petistas uma gloriosa vitória de Lula no julgamento ocorrido na terça-feira passada no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Foi exatamente o contrário. O ex-presidente sofreu uma monumental derrota. Por unanimidade, quatro ministros reconheceram mais uma vez que ele é culpado de crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Agora, são oito magistrados de três instâncias a chegar ao mesmo veredicto — o que praticamente aniquila a fantasia de que o ex-presidente é vítima de perseguição política. O julgamento do STJ também reduziu a zero uma das últimas esperanças da defesa no processo em que Lula foi condenado por receber um apartamento tríplex no Guarujá, litoral de São Paulo, como pagamento de propina no escândalo da Petrobras. Os advogados sabiam que a possibilidade de absolvição era considerada remotíssima e trabalharam ao longo de meses para conseguir pelo menos um voto favorável ao recurso em que tentavam reverter a condenação. Quebrar a unanimidade poderia abrir caminho para uma discussão no Supremo Tribunal Federal. Mas nem isso deu certo.
O STJ funciona como uma espécie de terceira instância na Lava-Jato. Um voto isolado de um dos quatro ministros da 5ª Turma pela absolvição ou pela anulação do crime de lavagem, por exemplo, trincaria a espinha dorsal da sentença — decretada pelo ex-juiz Sergio Moro em julho de 2017 e confirmada posteriormente por três desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). A quebra da unanimidade também daria força ao discurso político e ao argumento jurídico de que o petista poderia ter sido alvo de exagero de juízes de outras instâncias. A defesa de Lula levantou dezoito teses jurídicas para tentar anular a condenação, incluindo a suspeição do ex-juiz Moro e dos procuradores da Lava-Jato, uma suposta falta de provas, a prescrição do caso, o cerceamento de defesa e a dupla condenação pelo mesmo crime. Todas foram rejeitadas.
No julgamento, os ministros, também por unanimidade, decidiram reduzir o tempo da pena imposta pelo TRF4 ao ex-presidente, de doze anos para oito anos, dez meses e vinte dias. Ainda foi definido que o petista terá de pagar multa de cerca de 180 000 reais e mais 2,4 milhões de reais em reparação de danos à sociedade. O relator do caso, ministro Felix Fischer, disse que, na acusação de corrupção contra Lula, está certo considerar como agravantes a reprovação pelo crime cometido, o dano provocado e o comprometimento da “estabilidade democrática” com o esquema de corrupção. O magistrado julgou, porém, que o TRF4 adotou agravantes em excesso e “motivações vagas” para definir a penalidade de Lula pelo crime de lavagem de dinheiro.
Segundo a votar, Jorge Mussi criticou o fato de a segunda instância ter aumentado em 375% a pena-base de corrupção definida pelo ex-juiz Sergio Moro e disse que o tribunal não deveria ter estabelecido a sanção de Lula influenciado pelas reprimendas aplicadas a outros réus. Os ministros Reynaldo Fonseca e Marcelo Navarro adotaram argumento semelhante ao do relator e também consideraram que as penas fixadas pelo TRF4 eram desproporcionais e não seguiam o “elementar senso de justiça”.
Em tese, o ex-presidente, que está preso há um ano, poderia deixar a cadeia para trabalhar durante o dia já a partir de setembro. Mas nem é certo que isso aconteça. Lula responde a outras seis ações penais, sendo a mais adiantada delas a que apura o recebimento de propina por meio da reforma de um sítio em Atibaia. Nesse caso, ele já foi sentenciado em primeira instância a doze anos e onze meses. Se essa condenação for confirmada, as duas penas serão somadas e ultrapassarão vinte anos. Ou seja, Lula continuaria preso em regime fechado por, no mínimo, mais dois anos.
É o Supremo Tribunal Federal, em última análise, que vai definir se Lula continuará na cadeia. A defesa argumenta que o ex-presidente só poderia ser preso depois que seu caso transitasse em julgado, ou seja, depois de passar por todas as instâncias, incluindo o próprio STF. Nem isso pode ser considerado uma janela de esperança. A Corte não é conhecida pela celeridade, o que tem dado fôlego a políticos acusados de corrupção que ainda estão soltos. É o que acontece, por exemplo, com o ex-deputado federal Nelson Meurer, condenado a treze anos e nove meses de prisão por recebimento de propina também no escândalo da Petrobras. Na terça-feira 23, os ministros do STF rejeitaram um novo recurso do ex-parlamentar. O caso já se arrasta há quatro anos — e ele continua livre.
Publicado em VEJA de 1º de maio de 2019, edição nº 2632
Qual a sua opinião sobre o tema desta reportagem? Se deseja ter seu comentário publicado na edição semanal de VEJA, escreva para veja@abril.com.br