Com MDB-SP sob Baleia Rossi, irmão faturou com campanhas do partido
Nas eleições de 2012 e 2014, produtora de Palu Rossi ampliou mais de dez vezes os ganhos com candidatos do MDB e aliados em relação a pleitos de 2004 a 2010
Antes de chegar à presidência nacional do MDB, em 2019, o candidato à presidência da Câmara Baleia Rossi (SP) presidiu por mais de oito anos o diretório do partido em São Paulo. O então deputado estadual assumiu o cargo em janeiro de 2011, após a dissolução do diretório local, sob as bênçãos do recém-empossado vice-presidente da República, Michel Temer, aliado dele e de seu pai, Wagner Rossi, àquela altura ministro da Agricultura do governo Dilma Rousseff (PT). Baleia só deixou o comando da ala paulista do partido para assumir o MDB nacionalmente.
Foi durante este primeiro momento de protagonismo político do deputado, sua gestão na presidência do então PMDB em São Paulo, que um dos irmãos dele, Paulo Luciano Tenuto Rossi, o Palu, e a sua produtora de vídeos e filmes, a Ilha Produção, ganharam espaço prestando serviços a campanhas políticas de candidatos do MDB e de aliados no estado. Em apenas duas eleições, as de 2012 e 2014, a Ilha multiplicou em mais de dez vezes o faturamento com campanhas obtido nas quatro eleições anteriores, de 2004 a 2010. A empresa afirma que o deputado “jamais teve influência na escolha das poucas campanhas políticas de que a Ilha participou”.
Com um porfólio que atualmente inclui empresas como Scania, MRV, Unimed, Amil e Lupo, a Ilha Produção foi criada em 2000 para produzir programas de TV então apresentados por Baleia e transmitidos no interior paulista, enquanto ele foi vereador e deputado estadual. Nas eleições de 2004, 2006, 2008 e 2010, a produtora recebeu um total de 728.500 reais de campanhas eleitorais, conforme prestações de contas à Justiça Eleitoral. Parte do dinheiro, 178.500 reais, veio das campanhas do próprio Baleia em 2004, quando foi derrotado na disputa pela prefeitura de Ribeirão Preto, em 2006, quando se elegeu deputado estadual pela segunda vez, e em 2010, ano em que conseguiu o terceiro mandato na Assembleia Legislativa. O deputado declarou à Justiça Eleitoral em 2006 possuir 47.500 reais em quotas da empresa, metade do capital social. No pleito de 2010, o mesmo valor foi informado pela campanha dele como quotas em nome de sua esposa, Vanessa Cunha Rossi.
Em 2008, os serviços eleitorais da Ilha e se dividiram entre 300.000 reais do DEM em Ribeirão Preto, cuja candidata a prefeita foi Dárcy Vera, aliada de Baleia em sua base eleitoral; 200.000 reais da campanha de Nério Costa (PPS) a prefeito de Sertãozinho (SP), cujo vice era do PMDB; 50.000 reais de Uebe Rezeck, que disputou a prefeitura de Barretos (SP) pelo PMDB.
A partir de 2012, já com Baleia Rossi no comando do partido em São Paulo, a produtora de Palu mudou de patamar. Passou a atuar em cidades maiores e na capital, sempre contratada por candidatos do MDB ou aliados, e as cifras subiram substancialmente: naquele pleito e no seguinte, em 2014, a Ilha recebeu pouco mais de 8 milhões de reais das campanhas.
No pleito municipal de 2012, foram 4,8 milhões de reais auferidos dos caixas eleitorais. O campeão de gastos com a produtora foi o então peemedebista Gabriel Chalita, derrotado na disputa pela prefeitura de São Paulo, com 2,492 milhões de reais. Outro candidato do MDB a contratar a Ilha foi Gustavo Reis, de Jaguariúna (SP), que pagou à produtora 100.000 reais. Naquele mesmo ano, o candidato do PDT à prefeitura de Campinas, Pedro Serafim, cuja vice era do PMDB, gastou 2 milhões de reais com a Ilha, e Nério Garcia, de Sertãozinho, também com vice emedebista, pagou 250.000 reais pelos serviços.
Da atuação em eleições às prefeituras municipais, a Ilha Produção passou em 2014 a uma disputa majoritária estadual, com a campanha do candidato do MDB ao governo de São Paulo, Paulo Skaf. Ele foi o único cliente da produtora naquele ano, fora o próprio Baleia, que recebeu apenas 6.500 reais em serviços da empresa. As cifras desembolsadas por Skaf foram mais elevadas: 3,2 milhões de reais pagos à Ilha pela produção de seus programas, segundo a prestação de contas ao TSE. VEJA revelou em fevereiro de 2017 que o marqueteiro de Skaf, Duda Mendonça, disse em depoimento ao Ministério Público Federal ter ouvido do emedebista que Baleia Rossi pressionava pela contratação da empresa do irmão. A delação premiada do marqueteiro não foi aceita pelo MPF, mas ele acabou conseguindo um acordo com a Polícia Federal, homologado pelo Supremo Tribunal Federal.
As informações de Duda Mendonça sobre a campanha de Skaf foram usadas pelo Ministério Público Eleitoral de São Paulo em uma denúncia contra o emedebista, Palu e o próprio Duda, entre outros, por supostos crimes de falsidade ideológica eleitoral, corrupção passiva e lavagem de dinheiro na campanha do emedebista. A Justiça aceitou a acusação e abriu processo contra eles, que serão julgados. Skaf e Palu negam irregularidades.
A denúncia sustenta que o irmão de Baleia recebeu pessoalmente, em hotéis de São Paulo, duas parcelas de 500.000 reais de emissários do departamento de propinas da Odebrecht. Segundo os promotores, as prestações de contas da campanha de Paulo Skaf com serviços da produtora e da empresa do marqueteiro “dissimularam os recursos pagos pelo Grupo Odebrecht, com origem no crime de corrupção passiva”. O dinheiro do caixa dois, diz a Promotoria, é parte dos 6 milhões de reais que a empreiteira se comprometeu a pagar ao grupo político do ex-presidente Michel Temer por meio da campanha de Skaf em 2014.
Baleia Rossi, que não está entre os acusados neste processo da Justiça Eleitoral, é investigado em um inquérito que apura se a Odebrecht pagou a ele, por meio da empresa de Palu, dinheiro de caixa dois na campanha de 2014. A empresa também foi citada na delação premiada do empresário Joesley Batista, dono da JBS, que relatou ter pago ilegalmente 240.000 reais à Ilha Produção entre agosto e setembro de 2010, a pedido de Michel Temer.
Depois das eleições de 2012 e 2014, a produtora do irmão de Baleia voltou a prestar serviços eleitorais apenas à campanha do deputado, em 2018, no valor de 13.000 reais. A empresa não aparece como fornecedora nos pleitos de 2016 e 2020.
A assessoria do deputado informou que a produtora Ilha Produção responderia aos questionamentos da reportagem e ele não se manifestou.