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Com anos de rua, taxistas querem presidente ‘novato’ para sair da crise

Motoristas profissionais não exigem experiência do futuro ocupante do Palácio do Planalto e rejeitam partidos tradicionais

Por Alessandra Medina
Atualizado em 5 out 2018, 20h26 - Publicado em 5 out 2018, 17h31

A fama de bons conversadores — e por vezes psicólogos — dos taxistas está suspensa momentaneamente. Nas ruas do Rio de Janeiro, muitos estão evitando falar sobre o assunto do momento com os passageiros: a eleição mais polarizada dos últimos tempos.

Giselli Alvarenga, 29 anos e há sete ganhando a vida como motorista, não conversa sobre política em casa nem no trabalho. “Digo que o voto é secreto e ponto final”, explica ela, eleitora de Guilherme Boulos (PSOL). “Acho importante o eleito olhar não só para a economia e para a geração de empregos, como também para questões como o combate ao racismo e contra a opressão aos negros, a defesa dos direitos das mulheres e das minorias e pela livre expressão sexual”, afirma.

Giselli Alvarenga não conversa sobre política em casa nem com passageiros; ela vai votar em Guilherme Boulos (PSOL) (Daniel Ramalho/VEJA.com)

Nomes novos na política — ou nem tão novos, mas que passam a ideia de ser “contra o sistema”, os chamados outsiders — levam vantagem entre esses trabalhadores que ganham a vida com o taxímetro e ouvidos ligados.

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“Hoje, a experiência não quer dizer nada. O cara precisa estar cercado de bons profissionais. O Lula entendia de economia, por acaso?”, indaga Rogério Cicarone, 48 anos e vinte de profissão, que vem acompanhando com interesse o noticiário político e diz que tem a impressão de que nunca houve tanta corrupção. “Está uma bagunça! Na minha opinião, a impunidade é uma das responsáveis por isso. Hoje, os políticos têm certeza de que as possibilidades de responder pelo ato praticado são pequenas. Então, isso é quase um convite ao crime”, afirma ele, que aposta em Jair Bolsonaro (PSL) para mudar essa situação.

Há seis anos ganhando a vida levando e buscando passageiros pelas ruas do Rio, Luiz Carlos Lyra também escolheu um postulante que está concorrendo à Presidência da República pela primeira vez. “Só um candidato novo, que não faça parte de um partido tradicional, pode ter a moral para mudar a situação. Do jeito que está, não dá mais. O povo não aguenta mais tanta roubalheira”, acredita ele, que está entre o 1% que pretende eleger o Cabo Daciolo (Patriota), segundo a última pesquisa Datafolha, divulgada no dia 4 de outubro.

O taxista Luiz Carlos Lyra escolheu Cabo Daciolo (Patriota) como candidato no primeiro turno (Daniel Ramalho/VEJA.com)

Cicarone e Lyra não são exceção. De acordo com uma pesquisa do Instituto Ipsos, realizada a pedido da UFPE, 82% dos entrevistados rejeitam os velhos políticos e querem votar num candidato novo. Apenas 17,78% dos que opinaram acreditam que a pessoa mais adequada para conduzir o país deveria ser de um partido tradicional. Forças políticas, como PT e PSDB, que monopolizaram a disputa ao longo das últimas seis eleições presidenciais, estariam em baixa na preferência popular: 57,05% querem um candidato que se oponha ao atual sistema político.

Na opinião dos taxistas, são os outsiders que têm potencial para tirar a categoria da crise. Segundo o Sindicato dos Taxistas Autônomos do Município do Rio de Janeiro, que estima que existam 48.000 taxistas na cidade, houve uma queda de 50% na procura pelo serviço nos últimos três anos.

A recessão, no entanto, não é a única culpada pela queda da arrecadação. O uso dos aplicativos, como Uber, Cabify e 99, que dão descontos nas corridas, também contribuíram para a queda do rendimentos. “A economia está parada e ficou ruim para todo mundo. O próximo dirigente do país tem que ter boas propostas para mudar essa situação. O Bolsonaro, por exemplo, já declarou que vai dar um gás na economia cortando privilégios e fixando uma cota única de 20% de imposto de renda para quem ganha mais de cinco salários mínimos. Quem recebe menos fica isento”, diz Gilson Oliveira, 38 anos, que atua na praça desde 2013, quando a firma em que trabalhava como segurança faliu.

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Como uma espécie de compensação pelo impacto causado aos taxistas com a legalização dos aplicativos de transporte individual de passageiros, há um projeto de lei em tramitação no Senado, o PLS 462/2017, que quer garantir que os motoristas de táxi paguem menos imposto de renda. O texto está em análise na Comissão de Assuntos Sociais (Cas). Em caso de aprovação, será concedido um benefício temporário de cinco anos para a categoria dos taxistas, período em que haverá redução de 60% para 20% do porcentual de renda líquida tributável desses trabalhadores. Ou seja, se hoje o motorista de táxi paga imposto de renda sobre 60% dos ganhos brutos com a atividade, passará a pagar apenas sobre 20% de seus rendimentos.

“Precisamos ter melhores condições de concorrência no mercado. Só para aferir o taxímetro, desembolsamos 250 reais, todos os anos. Além disso, a prefeitura determina a troca de carro a cada seis anos. Como ter dinheiro para essas despesas todas se o número de passageiros caiu? Tenho colega que devolveu o veículo porque não conseguiu pagar as prestações, que ficou sem casa… Está difícil para todo mundo”, conta Gerson Loureiro Cossich, de 69 anos, há dezenove trabalhando como motorista. Ele é eleitor de Alvaro Dias (Podemos).

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Para esses profissionais, que ficam no mínimo dez horas no volante, a mobilidade urbana também é uma preocupação. “Hoje, a cidade está parada. Acho que o futuro presidente deve pensar em maneiras de pressionar governadores e prefeitos para investir mais em transporte de massa. Para isso acontecer é lógico que um financiamento federal ajuda bastante. Em Nova York, você anda de metrô para todos os lados. Aqui, o morador da Pavuna dá uma volta na cidade quando quer ir à Barra. Esse tipo de iniciativa iria melhorar muito o trânsito. E acredito que o movimento nos táxis não iria cair. Quem escolhe esse tipo de transporte não gosta de andar de metrô ou ônibus”, diz Vicente Santos, 74 anos e há dezessete dirigindo um táxi, que pretende votar no empresário João Amoêdo (Novo).

O taxista Vicente Santos deve votar em João Amoêdo (Novo) (Daniel Ramalho/VEJA.com)

Essa situação de caos viário e econômico do Rio de Janeiro tem um culpado, segundo Rogério Napoleão Soares e Silva, 65 anos de idade e há 36 ocupando-se de um táxi: “Qual foi o legado de treze anos da esquerda no poder? Quase 14 milhões de desempregados e uma crise sem precedentes”, diz ele, que deseja Bolsonaro como autoridade máxima do país. “Estão desesperados. Tentaram até matá-lo, mas esse atentado foi tiro no pé. O capitão vai ganhar mais voto depois disso”.

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Aos 59 anos de idade e há 32 ganhando a vida como motorista, Paulo Cesar Honorato da Silva justifica o seu voto no candidato do PSL por outra razão: educação. “Durante o regime militar, as escolas funcionavam e havia mais respeito à figura do professor. Tenho consciência de que ele não vai ser a salvação, mas acho que as boas maneiras podem ser resgatadas. Hoje, os alunos batem nos professores. No Japão, até o imperador se curva diante de um mestre”, afirma ele, que mandou a filha “esquerdista”, estudante de desenho industrial na UFRJ, para Cuba.

“Proporcionei a ela essa experiência. Só tomava banho de água fria, não tinha sabonete e só ganhava dinheiro suficiente para a passagem de ônibus. Está sem falar comigo até hoje”, conta.

O taxista Paulo Cesar Honorato da Silva mandou a filha ‘esquerdista’ para Cuba; ele escolheu Jair Bolsonaro (PSL) como candidato (Daniel Ramalho/VEJA.com)
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