Colapso nas cadeias reflete décadas de gestão Sarney
Grupo político de José Sarney se aproxima de cinco décadas no poder. E os maranhenses, já acostumados aos péssimos serviços públicos, agora estão à mercê de facções criminosas
Por Gabriel Castro, de Brasília
7 jan 2014, 14h35
José Sarney, Roseana Sarney, Edison Lobão e Lobão Filho Fotoarena e Divulgação Governo do Estado do Maranhão e ABr e Agência Câmara/VEJA
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A sequência de horror registrada nos últimos vinte dias no Maranhão chocou até mesmo uma sociedade já acostumada ao noticiário de crimes brutais. O banho de sangue, com imagens de presos decapitados e esquartejados na penitenciária de Pedrinhas, na Grande São Luís, já deixou 62 detentos mortos no período de um ano. O retrato da barbárie nas cadeias maranhenses inclui ainda estupros de familiares de presidiários nos dias de visitas íntimas. Na última sexta-feira, a selvageria ultrapassou os muros do presídio: ataques a ônibus e delegacias espalharam terror nas ruas de São Luís. Uma criança de 6 anos morreu queimada. O criminoso obedecia a uma ordem de dentro do presídio de Pedrinhas.
Políticos costumam culpar os antecessores pelos problemas crônicos enfrentados por suas gestões. Mas a governadora Roseana Sarney (PMDB), no quarto mandato no Maranhão, não poderá fazê-lo: com exceção de um período de dois anos, o Estado é governado desde 1966 pelos integrantes do clã político de José Sarney.
O único revés do grupo ocorreu em 2006, quando Jackson Lago (PDT) derrotou Roseana nas urnas. Mas ele só resistiu até o começo de 2009, dois anos depois da posse: a Justiça Eleitoral tirou o cargo do pedetista sob a acusação de compra de votos. Roseana herdou o mandato, e venceu também as eleições de 2010.
Sarney nunca fez oposição a um presidente da República: apoiou a ditadura militar enquanto lhe interessou e foi pulando de barco até firmar a improvável aliança com o PT de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Dos dois, recebe deferências – e o poder de nomear afilhados em órgãos importantes da administração federal.
Enquanto isso, os maranhenses convivem com um cenário desolador: segundo dados do Atlas do Desenvolvimento, o Estado tem o penúltimo lugar no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), à frente apenas de Alagoas. A renda per capita, de 348 reais, é a menor do país. Apenas 6,5% dos municípios do estado têm rede de esgoto.
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Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 20,8% dos maranhenses eram analfabetos em 2012. Pior: o número significa um aumento em relação a 2009, quando 19,1% da população não sabiam ler e escrever. Ou seja, durante o governo de Roseana, a situação se agravou – o Maranhão foi o único Estado do Nordeste que regrediu no período.
Um dos poucos índices nos quais o Maranhão não se destacava negativamente no plano nacional era a violência. Mas, como mostra o episódio de Pedrinhas, isto também é passado: entre 2000 e 2010, a taxa de mortes por armas de fogo no Estado subiu 282%, de acordo com o Mapa da Violência. O surgimento de facções criminosas tornou mais evidente o fracasso do governo nessa questão. O governo do Estado falhou ao evitar o conflito sangrento entre criminosos encarcerados e novamente depois, ao tentar debelá-lo. Por fim, receberá ajuda do governo federal para resolver a situação, com a transferência de detentos para outras unidades prisionais do país.
O Maranhão já era pobre quando Sarney assumiu o poder. E sabe-se que não é fácil resolver o problema do subdesenvolvimento crônico. Mas, em 2014, isso já não pode ser usado como desculpa.
1/35 Agentes do Conselho Nacional de Justiça e da Polícia Federal em vistoria ao presídio (Karlos Geromy/OIMP/D.A Press/VEJA)
2/35 Presos pulam muro para fugir do presídio de Pedrinhas (Reprodução / Globonews/VEJA)
3/35 Pedrinhas, o maior Complexo Penitenciário do Maranhão (Divulgação/ Governo do Maranhão/VEJA)
4/35 Buraco aberto por caminhão caçamba no Complexo de Pedrinhas, no Maranhão (Gilson Ferreira/O Pequeno/Folhapress)
5/35 Quadrilha do Bonde dos 40 acusada de fuzilar em São Luís (MA) dois parentes de presos que haviam sido decapitados em Pedrinhas, em 2013 (Divulgação/Gilson Teixeira/Polícia Civil/VEJA)
6/35 Sistema de vigilância de câmeras do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís, Maranhão (Felipe Frazão/VEJA)
7/35 Sistema de vigilância de câmeras do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís, Maranhão (Felipe Frazão/VEJA)
8/35 Sistema de vigilância de câmeras do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís, Maranhão (Felipe Frazão/VEJA)
9/35 Sistema de vigilância de câmeras do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís, Maranhão (Felipe Frazão/VEJA)
10/35 Local onde está sendo construída a base do sistema de monitoramento de presos por tornozeleira eletrônica em São Luís, Maranhão (Clayton Montelles/Divulgação Sejap/VEJA)
11/35 Neuton Correa delegado titular do 12º Distrito Policial de São Luís (Maranhão) (Felipe Frazão/VEJA)
12/35 Detentos de Pedrinhas sendo transferidos para presídios federais (Handson Chagas/VEJA)
13/35 Detentos que trabalham na limpeza do Presídio São Luís I caminham sob olhar de PM do Batalhão de Choque (Felipe Frazão/VEJA)
14/35 Tabletes de maconha, celulares e serras apreendidas pela PM com mulher de preso que tentava entrar em Pedrinhas (Felipe Frazão/VEJA)
15/35 Enterro de Ana Clara, em São Luís (VEJA.com/VEJA)
16/35 Preso é levado para receber atendimento médico depois de ter sido ferido durante uma briga entre gangues rivais dentro do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís do Maranhão (Douglas Cunha/O Estado do Maranhão/Reuters/VEJA)
17/35 Comoção marca velório da menina que morreu após ser queimada em ônibus. Centenas de pessoas estão levando os sentimentos à família da menina Ana Clara, que morreu na manhã desta segunda-feira (6), no Hospital Juvêncio Matos, em São Luís (Honório Moreira/OIMP/D.A Press/VEJA)
18/35 Comoção marca velório da menina que morreu após ser queimada em ônibus. Centenas de pessoas estão levando os sentimentos à família da menina Ana Clara, que morreu na manhã desta segunda-feira (6), no Hospital Juvêncio Matos, em São Luís (Honório Moreira/OIMP/D.A Press/VEJA)
19/35 Armas artesanais e celulares foram apreendidos durante revista da PM no Complexo Penitenciário de Pedrinhas (Francisco Silva/Jornal Pequeno/VEJA)
20/35 Armas artesanais e celulares foram apreendidos durante revista da PM no Complexo Penitenciário de Pedrinhas (Francisco Silva/Jornal Pequeno/VEJA)
21/35 Armas artesanais e celulares foram apreendidos durante revista da PM no Complexo Penitenciário de Pedrinhas (Francisco Silva/Jornal Pequeno/VEJA)
22/35 Ônibus incendiado no bairro do João Paulo, em São Luís (MA) na noite da sexta-feira (03) (Karlos Geromy/OIMP/D.A Press/VEJA)
23/35 Ônibus foram incendiados em São Luís no Maranhão na sexta-feira (03), em retaliação à ocupação, do Complexo Penitenciário de Pedrinhas pela polícia militar (Francisco Silva/Jornal Pequeno/EFE/VEJA)
24/35 Ônibus foram incendiados em São Luís no Maranhão na sexta-feira (03), em retaliação à ocupação, do Complexo Penitenciário de Pedrinhas pela polícia militar (Francisco Silva/Jornal Pequeno/EFE/VEJA)
25/35 Presos filmam decapitados em penitenciária no Maranhão (Reprodução/VEJA)
26/35 Presos filmam decapitados em penitenciária no Maranhão (Reprodução/VEJA)
27/35 Detendo ferido dentro de presídio em Pedrinhas, no Maranhão (Reprodução TV Folha/VEJA)
28/35 Detento ferido durante rebelião é retirado do Complexo Penitenciário de Pedrinhas (Honório Moreira/OIMP/D.A Press/VEJA)
29/35 Familiares ajudam no resgate de detento ferido durante rebelião (Honório Moreira/OIMP/D.A Press/VEJA)
30/35 Polícia Militar tenta conter rebelião em Pedrinhas (Honório Moreira/OIMP/D.A Press/VEJA)
31/35 Polícia Militar controla rebelião em Pedrinhas após carnificina (Reprodução/TV Globo/VEJA)
32/35 Rebelião em outubro de 2013 deixou 10 mortos e 20 feridos na penitenciária (Honório Moreira/OIMP/D.A Press/VEJA)
33/35 Superlotação em Pedrinhas: presídio comporta 1.700 homens, mas abriga atualmente 2.200 detentos (Neidson Moreira/OIMP/D.A Press/VEJA)
34/35 Vistoria realizada no Complexo Penitenciário (A.Baêta/OIMP/D.A Press/VEJA)
35/35 Polícia descobriu armas escondidas pelos presos em Pedrinhas (Reprodução/TV Globo/VEJA)