As quatro cláusulas do ‘acordo de paz’ do governo com o Judiciário
Proposta de armistício foi levada ao Supremo Tribunal Federal pelo ministro da Economia Paulo Guedes
Há pouco menos de um mês, Jair Bolsonaro verbalizou em diferentes reuniões privadas um conjunto de tormentas que o têm consumido, desestabilizado a campanha pela reeleição e catalisado seus ataques verbais contra o Poder Judiciário – a maior delas a convicção de que ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estão trabalhando para que ele seja derrotado nas eleições de outubro. Embora o presidente reclame de ativismo judicial desde o primeiro ano de governo, o tom das conversas às vésperas do primeiro turno levou o Executivo a discutir a possibilidade de um “pacto pela paz”, composto de quatro cláusulas.
Mesmo sem traquejo de negociador e sem interlocução direta com a maior parte do STF, a quem primeiro seriam submetidas as propostas do Executivo, o ministro da Economia Paulo Guedes se apresentou como articulador de uma trégua que incluía acenos públicos a um país polarizado e cenários sobre o futuro ideal para o mandatário caso vença as eleições de outubro – e mais importante – também caso saia derrotado.
A primeira das cláusulas do acordo prevê que, a partir de um gesto de boa vontade do TSE, o ex-capitão abrandaria os ataques verbais contra o Supremo, alguns ministros e as urnas eletrônicas. Uma segunda cláusula, de cunho simbólico e pensada para reverberar no noticiário do exterior, estabelecia que, ao fim de um provável segundo turno, independentemente do resultado, Bolsonaro e o ex-presidente Lula, hoje líder de intenção de votos, apertariam as mãos de público e posariam juntos para fotos em um recado de que não haveria perseguição ao derrotado nem turbulências na formação do próximo governo.
As duas outras disposições do pacto – mais controversas – foram tratadas de forma mais reservada na tentativa de aproximação com o Supremo. Em sigilo, Guedes expôs a ideia de que o criticado inquérito das fake news, relatado no Supremo pelo ministro Alexandre de Moraes e que tem como foco apoiadores do presidente, deveria preferencialmente sumir do mapa, sendo arquivado logo no início oficial da campanha presidencial. Alternativamente, o caso sairia das mãos de Alexandre Moraes, considerado pelos bolsonaristas como algoz do presidente.
Até o fim do segundo turno, previa o pacto, com o inquérito das fake news em outras mãos, nenhuma medida mais ostensiva contra alvos bolsonaristas, como ordens de busca, surgiria durante o processo eleitoral. Se o presidente fosse reeleito, o passo seguinte seria se arquivar monocraticamente o processo que investiga a propagação e o financiamento de notícias fraudulentas, aberto de ofício pelo Supremo no início de 2019 quando os ataques de Bolsonaro e de seus seguidores começavam a ganhar corpo.
Na hipótese de o presidente não conseguir a reeleição, um último gatilho do acordo seria acionado: a aprovação de uma emenda constitucional para instituir a figura do senador vitalício para ex-presidentes, o que garantiria a eles foro privilegiado no STF e barraria a possibilidade, por exemplo, de um deles ser preso preventivamente. Tanto Bolsonaro quanto Lula rechaçaram recentemente em entrevistas a ideia de criação de um mandato vitalício.
Embora algumas dessa propostas tenham perdido força, o armistício ainda pode funcionar. A presença de Alexandre de Moraes na quarta-feira 10 no Planalto para entregar ao presidente o convite de sua posse, seria, de acordo com aliados do governo, a prova disso.