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Alvorada: O palanque do presidente

Recados a adversários, afagos a simpatizantes, demissão de auxiliares, futricas e as crises que nascem na porta do Palácio da Alvorada

Por Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 7 out 2019, 13h01 - Publicado em 5 out 2019, 08h00

O presidente Jair Bolsonaro ainda tomava café da manhã quando começou uma movimentação na frente do Palácio da Alvorada, a residência oficial do governo, na última quarta-feira (2). Eram famílias, idosos, youtubers e turistas que compartilhavam o mesmo sentimento: a expectativa de ver o chefe da República ao vivo. A aposentada Aureliana Carvalho, 68 anos, foi a primeira chegar. Sozinha, ela vestia uma camisa amarela com o slogan da campanha, ‘Meu Partido é o Brasil’, e aguardava Bolsonaro apoiada na grade que foi montada para separar os fãs do presidente dos profissionais da imprensa. Moradora de Teresina, no Piauí, Aureliana estava de férias em Brasília e dizia que queria dar um abraço em Bolsonaro.

Do lado de dentro do palácio, o presidente, ao fim do café da manhã, passou por uma sessão de reabilitação – ainda fruto da cirurgia decorrente da facada que levou – e ouviu a recomendação de falar pouco e evitar a fadiga. Passado o tratamento, colocou terno e gravata e saiu de casa. A primeira agenda do dia previa uma reunião com parlamentares. Antes, ao passar pela guarita da Alvorada, deu uma ordem ao motorista – e descumpriu a ordem dos médicos. “Tem gente aí? Então para!”. Aureliana ganhou o abraço do presidente – assim como a dezena de apoiadores que o esperava e que conseguiu falar com ele, tirar fotos e até entregar currículos profissionais.

A confraternização já se tornou rotina. Bolsonaro, que caiu nas graças da população ao se lançar em manifestações, atos de rua e aeroportos, adotou como regra atender quem vai visitá-lo nas primeiras horas do dia – atitude que remete aos tempos áureos do ex-presidente Fernando Collor, quando saia da Casa da Dinda para cumprimentar os populares e praticar corrida. A chegada de Bolsonaro segue um protocolo de segurança. Um carro precursor deixa a Alvorada e estaciona logo na saída. Militares saem do veículo e fazem uma avaliação do local. Minutos depois chega o comboio de Bolsonaro, que é recebido sob aplausos e pedidos para que desça do carro.

Os fãs do presidente ficam em um local cercado. Para chegar até lá, passam por um pórtico e depositam bolsas e mochilas na esteira de raio-x. Há restrições: copos e garrafas de água são proibidos, sob o risco de serem lançados contra o mandatário. Da mesma forma, é vetada a entrada de quem porta cartazes contrários a Bolsonaro ou vestem camisas de protesto – cenas comuns, conforme relato dos seguranças à reportagem. Os seguranças também estão em constante alerta: postam-se ao lado do presidente e posicionam uma pasta-escudo, à prova de balas, abaixo da cintura dele.

Protegido, o presidente já instou um pastor a puxar uma oração do outro lado da grade, pegou crianças no colo e deu explicações sobre medidas do governo, como a Reforma da Previdência e o pacote anticrime. Ao fim, costuma ser ovacionado. “Disse para o presidente que ele é lindo. Ele respondeu que linda sou eu”, contou Maria de Lourdes, que chegou ao local às 6h50 da última quinta (03). “Ser chamada de linda por um presidente? Agora eu me derreto”, completou. Além dos elogios, Lourdes também entregou a Bolsonaro o currículo de sua filha, que está desempregada.

A porta da Alvorada representa mais que um palanque para Bolsonaro manter-se próximo de sua claque. O local também funciona como uma poderosa ferramenta de comunicação: é onde que ele costuma mandar seus recados e pautar a imprensa com notícias que considera importante. Foi lá, por exemplo, que ele antecipou a demissão do então presidente do BNDES, Joaquim Levy – prerrogativa que caberia ao ministro da Economia, Paulo Guedes, a quem Levy era diretamente subordinado. Sem sequer ser questionado, afirmou que o chefe do BNDES estava “com a cabeça a prêmio”. Após a repercussão da fala, o executivo pediu demissão. Bolsonaro também anunciou o contingenciamento de 2,5 bilhões de reais, antecipou a um visitante detalhes sobre novas regras para o uso de armas no país e pediu a um jovem que indicasse um livro do torturador Brilhante Ustra para a sua professora, que seria de esquerda.

Auxiliares do presidente afirmam que ele passou a tornar-se mais presente no local após seus conselheiros – entre eles o filho Carlos – criticarem os cafés da manhã que fazia com jornalistas. A avaliação é a de que apenas pautas negativas eram publicadas na imprensa. Já na porta de casa, Bolsonaro apenas responde às perguntas quando elas lhe interessa, escapa dos contraditórios, manda os recados quando necessário e ainda garante sua presença no noticiário logo pela manhã. “Quando vocês fizerem uma matéria real do que aconteceu na ONU, eu dou entrevista a vocês”, afirmou a jornalistas na última segunda-feira (30). Visitantes do palácio pegam carona nas críticas de Bolsonaro e costumam hostilizar a imprensa, chamando-a de “lixo” e “vendida”.

As entrevistas de Bolsonaro na frente da Alvorada não são registradas no site do Planalto, que costuma transcrever as declarações do mandatário em ocasiões oficiais. Por outro lado, os próprios auxiliares de Bolsonaro gravam vídeos. Em um deles, escapou a troça que o presidente fez com um apoiador que estava desempregado e lhe pedia ajuda. “Só pelo bafo, não vai ter emprego”, cochichou com um segurança. A conversa acabou sendo captada em gravação e viralizou, gerando críticas sobre a declaração, típica da verborragia do presidente em sua intimidade. Na porta de casa, Bolsonaro é ainda mais Bolsonaro.

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