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Alcolumbre: “O Brasil esteve à beira da insolvência institucional”

O presidente do Congresso fala sobre o pacto de não agressão firmado entre os poderes que evitou uma crise de consequências imprevisíveis

Por Thiago Bronzatto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 23 ago 2019, 15h15 - Publicado em 23 ago 2019, 06h30

Da ampla varanda da residência oficial do Senado, em Brasília, o presidente do Congresso, Davi Alcolumbre, 42 anos, discorre sobre sua rápida ascensão no organograma político nacional. Ex-deputado e senador de primeiro mandato, ele derrotou o grupo de Renan Calheiros (MDB-AL), que dominou a Casa por cerca de três décadas — um sinal claro de que alguma coisa diferente se apresentava no horizonte. A dimensão dessa mudança ainda será conferida, mas os primeiros sinais emitidos já permitem certas conclusões. Apontando para um campinho de futebol em frente, Alcolumbre relembra sua atuação como zagueiro do Matapi, time de peladeiros de Macapá (AP), sua cidade natal. Na política, essa vocação defensiva tem gerado críticas. Em vez de distribuir caneladas, o senador tem se revelado um conciliador — qualidade que, segundo ele, foi determinante para que o Brasil não entrasse numa espiral de autodestruição institucional, quando o governo, o Parlamento e o Judiciário esgrimiam publicamente. O presidente da República acusava o Congresso de travar projetos importantes. O Congresso ameaçava o Supremo Tribunal Federal (STF) com o impeachment de ministros e a instalação de uma CPI. O Supremo, por sua vez, acusava o Planalto de tentar intimidá-lo. Nesse ambiente de conflagração, de acordo com o senador, a democracia estava perdendo forças e o Brasil caminhando em direção à insolvência. Em entrevista a VEJA, Alcolumbre conta como o pacto firmado entre ele e os presidentes Bolsonaro, Dias Toffoli (do Supremo) e Rodrigo Maia (da Câmara) evitou o pior e pacificou, ao menos temporariamente, a relação entre os três poderes.

O país esteve à beira de uma crise institucional? Esse foi um episódio importante. Após a eleição do presidente Bolsonaro, o Brasil estava muito polarizado e dividido. E essa situação se arrastou até abril, maio. Foi um período de muita tensão. As pessoas não se deram conta de que as agressões que estavam sendo feitas contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal eram ataques contra a democracia. Tivemos de tomar a decisão de que a conciliação era um caminho e a pacificação era necessária. Se fôssemos agir pela emoção, talvez não estivéssemos vivendo o que estamos vivendo hoje no Brasil.

O que isso quer dizer? É improvável prever o que teria acontecido, mas certamente não teria sido bom para os brasileiros. As agressões que os poderes Legislativo e Judiciário sofriam naquele momento estavam enfraquecendo a democracia, a política. Se embarcássemos na tese de devolver as agressões, o que alguns estimulavam, o Brasil não sairia do fundo do poço.

O que seria exatamente esse enfraquecimento da democracia? Se não tem o Congresso, o Judiciário e o Executivo fortes, você fragiliza as instituições, dando oportunidade para que outras coisas antidemocráticas aconteçam. Não acredito que a gente poderia ter vivido um novo golpe. Isso não. Mas, como a situação estava, nós não iríamos votar nada no Congresso. O Legislativo estava acuado e fraco diante das agressões. O Supremo estava sendo agredido todos os dias. O Brasil esteve à beira da insolvência institucional.

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Qual a responsabilidade do governo Bolsonaro por essa situação? Fui deputado com Bolsonaro durante doze anos. Ao longo de sua vida, ele se posicionou claramente contra certos assuntos. Ele sempre falou essas coisas polêmicas que são criticadas agora, e as repetiu na eleição também. As pessoas votaram nele. Então, ele tem legitimidade. É o estilo dele. Se eu ficar todo dia criticando o governo, o presidente da República criticando o Supremo e o Supremo criticando o Poder Legislativo, não vamos avançar. Colocamos um ponto-final nisso com o pacto.

Esse pacto já teve resultado prático? A reforma da Previdência. O governo não participou ativamente das negociações nos primeiros meses do ano. A partir de maio, as coisas passaram a melhorar muito porque Bolsonaro entendeu que precisava se aproximar da política. E foi quando ele começou a dar declarações de que confiava no Rodrigo e em mim. No fim, essa conflagração prejudicaria o governo dele também. Bolsonaro acabaria sendo cobrado pelas mudanças que prometeu e não fez. Os ataques ao Congresso e ao Supremo nas redes sociais também diminuíram bastante.

Até que ponto as declarações do presidente Bolsonaro incomodavam o Congresso? A relação esteve muito esgarçada. O presidente tem a sua metodologia, faz as suas manifestações, ponderações e observações. Mas, como eu disse, é o jeito dele. Quero me sentar com o presidente Bolsonaro e tratar do que vamos fazer para gerar empregos. O que depender de pauta legislativa, vou botar para votar e fazer as coisas acontecer. Quero conversar sempre com os presidentes dos poderes para encontrar a saída para os problemas, e não para criar mais problemas.

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O senhor é criticado por alguns colegas por ter arquivado a CPI do Judiciário e não dar andamento aos pedidos de impeachment de ministros do STF. No Senado há muitos pedidos de impeachment de ministros do Supremo. O corpo técnico da Casa, concursado e altamente qualificado, avaliou que esses pedidos são inconstitucionais. Sou eu quem vai levar isso à frente? Não vou fazer, não vou atender à vontade de meia dúzia. Um processo de impeachment não vai ajudar o Brasil. Fico envergonhado de estar discutindo o processo de impeachment de um ministro do Supremo ou mesmo a instalação de uma CPI enquanto os brasileiros estão pensando em emprego e comida. Não vou ser levado pelo movimento de paralisar o Brasil para agradar a alguns.

“O Legislativo estava acuado e fraco diante das agressões. O Supremo estava sendo agredido todos os dias. O Brasil esteve à beira da insolvência institucional”

Qual a marca que o senhor gostaria de imprimir em sua presidência? Durante cerca de trinta anos, o mesmo grupo político governou o Senado. Vencemos a eleição, com 42 votos. Aí o Brasil conheceu o Davi. E quem é o Davi? É o Davi conciliador, pacificador e que não procura alongar a discussão. As pessoas querem abrir a porta da casa e ver o asfalto, querem chegar ao hospital e ver o médico atendendo e saber que o filho vai voltar vivo da escola. Então, vou trabalhar para ser pacificador, conciliador, muitas vezes desagradando àqueles que estão pensando apenas numa curtida ou num like das redes sociais. O Brasil real não é esse.

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A indicação do filho do presidente para ocupar a Embaixada do Brasil nos Estados Unidos pode paralisar o Congresso? Pelo que estou escutando, há uma polarização muito grande. Constitucionalmente, não vejo nenhum problema na indicação. As pessoas estão falando muito: “Ah, é nepotismo”. Não é. Não está escrito em lugar nenhum. Os senadores me têm dito que a atuação do Eduardo Bolsonaro como presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara sempre foi voltada para essa área. Os votos se dividirão entre apoiadores e opositores das causas do governo. Será uma sabatina política.

Qual a avaliação que o senhor faz do governo Bolsonaro? É um governo que está começando, que tem sete meses. Assim como eu aqui no Senado, o presidente Bolsonaro está aprendendo. Ele é muito criticado por suas declarações. Mas esse Bolsonaro, repito, todo mundo conhecia. Ninguém pode dizer que ele não existia, que está surpreso. Respondendo objetivamente, acho que está sendo um governo de aprendizado. É muito prematuro avaliar se está indo muito bem ou dar uma nota agora. Digamos que, por enquanto, ele está passando na média. Todos nós estamos na média.

“A partir de maio, Bolsonaro entendeu que precisava se aproximar da política. E foi quando ele começou a dar declarações de que confiava no Rodrigo e em mim”

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O senhor promoveu recentemente um almoço com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o ministro Paulo Guedes para discutir a pauta do segundo semestre. Como foi esse encontro? Liguei para o ministro Paulo Guedes e pedi que fizéssemos um almoço de avaliação do primeiro semestre e planejamento para o segundo semestre. O Paulo Guedes está mais político que muitos ministros do governo Bolsonaro. Estou gostando dele. O foco desse almoço foi avaliar acertos e erros, tropeços e vitórias e planejar os próximos meses, com a nova Previdência, o pacto federativo e a reforma tributária. Eu queria que o segundo semestre começasse muito bem, porque não vou ficar procurando confusão. Quero buscar solução.

O senhor é a favor da privatização das estatais como defende o ministro Paulo Guedes? Não. Temos de ter um equilíbrio. O setor privado precisa avançar, mas é necessário que isso seja cuidadosamente estudado. Já no que diz respeito à modernização da lei de telecomunicações, sou 100% a favor. Desde fevereiro estou trabalhando num projeto de levar internet para as pessoas. Com a mudança do regime de concessão para autorização, podemos ter investimentos de cerca de 30 bilhões de reais nos próximos dois anos. O objetivo é expandir a rede de comunicação, de fibra ótica e telefonia por regiões que precisam, como o Norte e o Nordeste.

E sobre a privatização de estatais como Eletrobras, Correios, Petrobras? Em relação à Eletrobras, acho que não é o momento, mas precisamos amadurecer o debate sobre o sistema elétrico brasileiro. Ele é muito caro e ineficiente. Acho que é necessário fazer um novo modelo. Temos de avaliar os Correios. Quanto à Petrobras, há que avaliar. Não pode ser oito ou oitenta. É preciso que haja equilíbrio. Tem de ser tudo muito bem estudado.

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Num ambiente politicamente polarizado, onde o centro que o senhor representa se encaixa? Acho que estas eleições municipais vão ser decisivas para isso. Vamos ter o primeiro modelo de eleição sem coligação. Será um grande teste. Sem coligação, os partidos terão de estar fortes em 2022 — e precisarão se juntar. Em função disso, teremos três ou quatro candidaturas viáveis à Presidência da República. Nesse cenário, imagino, o presidente Bolsonaro deverá ter um porcentual, o outro lado deverá ter um porcentual parecido, em torno de 25% do eleitorado. Portanto, o centro é que vai definir se apresentará um nome ou se vai pender para a esquerda ou a direita.

O seu partido, o DEM, tem candidato à Presidência da República? Acho que não. O presidente Rodrigo Maia pode ser visto como um nome, mas ele não se manifesta sobre isso. O presidente ACM Neto é candidato a governador da Bahia. O Ronaldo Caiado, que disputou o governo de Goiás, deve buscar a reeleição. O DEM, por enquanto, não se coloca para uma candidatura presidencial. Pode surgir alguém? Pode… De repente, o DEM me lança como presidente da República. Já pensou? Seria uma honra e privilégio. Mas, por enquanto, penso apenas em disputar a reeleição ao Senado.

Publicado em VEJA de 28 de agosto de 2019, edição nº 2649

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