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A briga pela recriação da UDN, o partido que apoiou o golpe de 1964

Dois grupos disputam a legenda conservadora que foi extinta pelos militares e sonha em ter Bolsonaro como seu candidato à reeleição

Por Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 12 jul 2019, 16h47 - Publicado em 5 jul 2019, 07h17

Jânio Quadros foi o último presidente da República eleito com o apoio da União Democrática Nacional (UDN), o partido que representou o conservadorismo na política brasileira durante vinte anos. Extinta em 1965 por um Ato Institucional da ditadura militar, a UDN quer retomar o protagonismo na defesa do liberalismo econômico, do combate à corrupção e de uma agenda moralista. A legenda ainda não existe formalmente, mas já tem sede fixa em Brasília, um estatuto de 29 páginas e um plano ambicioso para as eleições de 2022: convencer Jair Bolsonaro a abandonar o PSL e disputar a reeleição pelo novo partido. É uma tarefa difícil e delicada. Talvez por isso a UDN disponha de dois presidentes empenhados na mesma missão. Dois presidentes?

O advogado Marco Antonio de Vicente Junior, conhecido como Marco Vicenzo, escreve em suas redes sociais, dá entrevistas e circula pelo Congresso Nacional como presidente nacional da UDN. Nos encontros que já manteve com parlamentares do PSL, distribuiu o estatuto da legenda, discutiu as perspectivas eleitorais do partido para as eleições municipais do ano que vem e enumerou os principais itens da pauta conservadora que uniria bolsonaristas e udenistas — a redução da maioridade penal e a facilitação da posse e do porte de armas de fogo. Vicenzo já procurou os deputados Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o filho Zero Três, Hélio Lopes (PSL-­RJ), amigo e braço-direito do presidente da República, e Carla Zambelli (PSL-SP), além do líder do governo na Câmara, deputado Major Vitor Hugo (PSL-GO). Eles são considerados peças-chave na estratégia de cooptação da UDN. “Ainda são conversas iniciais, mas elas foram muito boas”, resume o presidente da UDN.

NO PASSADO - Jânio Quadros, que renunciou à Presidência: apoio da UDN (CPDOC-GV/Arquivo)

Na quinta-feira 4, o comerciante Marcus Alves de Souza procurou o 9º Distrito Policial de Guarulhos, em São Paulo, e registrou um boletim de ocorrência no qual acusa Vicenzo de falsidade ideológica e concorrência desleal. Alves se diz o verdadeiro presidente da UDN. “Esse cidadão é um impostor”, afirma o comerciante, autor do pedido de recriação do partido apresentado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em outubro do ano passado. Alves formalizou em cartório o nome da sigla e registrou a logomarca udenista. O processo de recriação está na fase de coleta das 500 000 assinaturas exigidas pela legislação. Já foram obtidas mais de 300 000, segundo ele. “Apenas eu tenho autoridade para negociar como representante do partido”, garante. No site do TSE, realmente consta o nome do comerciante como presidente nacional da UDN.

Marcus Alves contou a VEJA que o advogado Marco Vicenzo participou do início do processo de recriação do partido e ajudou a colher assinaturas no Distrito Federal. O problema é que os dois se desentenderam e, depois disso, Vicenzo, segundo Alves, se autoproclamou presidente da legenda, passou a se reunir com congressistas e viajar pelo Brasil articulando a formação dos diretórios. Em outra investida para tentar ter o controle da futura UDN, o advogado impetrou uma ação no TSE pedindo a revogação do Ato Institucional que extinguiu os partidos políticos durante a ditadura. Ou seja, a UDN voltaria a existir automaticamente caso o recurso seja admitido. É uma tese jurídica exótica com pouquíssimas chances de prosperar.

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NO CONGRESSO - Vicenzo, com a deputada Zambelli: o outro presidente (//Reprodução)

Marco Vicenzo, por sua vez, acusa o comerciante de agir em nome de “interesses subjetivos, para não dizer espúrios”, e de ser uma “pessoa perturbada”. “O registro cartorial não garante a ninguém o comando da sigla”, afirma o advogado. Apesar das divergências, os dois supostos presidentes da UDN têm um ponto em comum: ambos querem o partido como principal representante da direita no Brasil e o presidente Bolsonaro como candidato em 2022. “O PSL não é e nunca foi um partido de direita. É só um partido pequeno que cresceu com o Bolsonaro, com novas caras fazendo as mesmas coisas de sempre”, afirma Marco Vicenzo. “Vejo que foi um partido criado na última hora para poder receber o presidente e que já vive um problema institucional em que se misturam denúncias de corrupção e problemas de caixa dois”, afirma Marcus Alves.

A UDN surgiu na década de 40 pregando o liberalismo econômico, o conservadorismo nos costumes, o combate implacável à corrupção, a aproximação com os militares e guerra ao comunismo — agenda muito parecida com a do presidente Bolsonaro. Os dois postulantes a cacique da nova UDN acreditam que há boas chances de a sigla, por sua história, conseguir atrair os descontentes do PSL, principalmente aqueles que estão incomodados com as irregularidades investigadas pela Polícia Federal na campanha do ano passado e com a atual disputa pelo controle das finanças do partido. No ano passado, quando Bolsonaro se filiou à legenda, o PSL tinha três deputados federais e recebeu 8 milhões de reais de verba do Fundo Partidário. Hoje, o partido tem 54 parlamentares e vai embolsar 119 milhões até o fim do ano. Não há nada que indique que o presidente da República pretenda trocar de partido. Afinal, migrar para a UDN, no atual cenário, seria deixar um problema para se filiar a outro.

Publicado em VEJA de 10 de julho de 2019, edição nº 2642

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