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Doutor matemática

O inglês Stephen Wolfram, criador do site Wolfram Alpha, quer trocar os médicos por algoritmos na hora de fazer diagnósticos, "a mais matemática das áreas médicas"

Por Olívia Fraga, de Nova York
4 nov 2012, 14h34

O inglês Stephen Wolfram, de 53 anos, é especialista em transformar números e dados aparentemente desconexos em informações que fazem sentido. Londrino, adotou os Estados Unidos como lar aos 20 anos, quando foi convidado a ensinar cálculo na Caltech (o respeitado Instituto de Tecnologia da Califórnia). Antes disso, havia passado por Eton, a famosa escola da elite inglesa, e Oxford. Não demorou muito até a nomeação para a bolsa de gênios da Fundação MacArthur – Wolfram foi o mais jovem bolsista a recebê-la.

Depois de deixar a Caltech, Wolfram “exilou-se” no Instituto de Estudos Avançados de Princeton, que deu emprego a Albert Einstein em todo o tempo em que o físico alemão permaneceu nos EUA. Foi ali, em 1988, que lançou o Mathematica. Hoje, o programa é usado em grandes empresas de engenharia e ciência aplicada, da Ford à Petrobras. Foi Steve Jobs quem o convenceu a voltar atrás em relação ao nome da ferramenta – Wolfram preferia Omega, “mais romântico”. O programa rende à Wolfram mais de 20 milhões de dólares por ano.

Em maio de 2009, foi a vez de lançar o site Wolfram Alpha (www.wolframalpha.com), buscador que, no lugar de páginas sobre o tema procurado, volta com cruzamento de dados e informações. Enquanto o Google retorna para uma busca sobre ‘Brasil’, por exemplo, o site do governo brasileiro e o verbete correspondente na Wikipedia, o Wolfram Alfa mostra uma coleção organizada de dados sobre o país, desde seu mapa e bandeira até o PIB, expectativa de vida e índices de saúde e educação. Agora, Wolfram quer usar essa capacidade de organizar informação para melhorar os diagnósticos da medicina. “Vejo uma quantidade enorme de pessoas, inclusive médicos, incapazes de interpretar dados. Diagnóstico é informação. Os algoritmos saberão o que fazer.”

Ele próprio já organizou sua vida em números, coletados desde a infância (uma amostra pode ser vista na página de “recados” de seu site: stephenwolfram.com/scrapbook). Tudo está lá: quantos e-mails envia por dia, quantas horas passa fazendo exercícios por semana, rotinas, atividades, até a frequência com que contrai resfriados. Em conversa por telefone, após participar da conferência Living by Numbers, promovida pela revista americana Wired, em Nova York, Stephen Wolfram falou ao site de VEJA sobre a revolução na medicina diagnóstica, “a mais matemática das áreas médicas”, segundo ele.

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O que o buscador Wolfram Alpha consegue fazer hoje, no campo médico? Muito pouco. Nós temos como suporte todo tipo de informação que foi jogada na rede, e a processamos com a calculadora do Mathematica, que combina dados, estabelece relações entre duas variáveis, trabalha com algoritmos. Então, por exemplo, a busca “sanduíche de presunto e queijo”, no Wolfram Alpha, voltará com informações nutricionais, quantidade de calorias em gordura, comparações entre o quociente nutricional de um sanduíche e outros alimentos, nível de colesterol. Hoje, a informação no site ainda não pode ser cruzada, mas esta é uma guinada inevitável, porque diagnóstico é isso: computar informação. E tudo no universo pode ser computado.

Toda essa informação não depende de uma análise médica, de um especialista, para ser útil? Tudo pode ser computado, mas ainda precisamos decidir o que pode ser automático ou automatizado – esta é uma questão ética que está no horizonte. Eu acredito que podemos combinar o resultado automático com conhecimento, criando um corpo de informações médicas mais sensível.

O senhor coleciona dados de sua vida, toma notas de batimentos cardíacos, horas diárias passadas na frente do computador, passos que dá nas caminhadas sem se cansar. Como utilizar estas informações simples com fins médicos? As pessoas ainda não dão o devido valor a pequenos sinais e hábitos – se prestassem atenção, poderiam prever problemas. Tome como exemplo alguém que tenha arritmia ou palpitação. Em geral, ela vive uma sucessão de episódios e não se dá conta, até que algum dano cardíaco mais grave ocorra. Muitas vezes ela sequer foi ao médico antes. E se ela notasse, dada a frequência, que as palpitações estavam fora do padrão de um ser humano saudável? Um cenário possível é imaginar um diário médico, em que um indivíduo possa computar pequenas ocorrências, insônias, palpitações, dores localizadas.

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E como ver estes resultados? Serão de domínio público? O sistema de saúde terá um tipo de acesso; nós, apenas no nível pessoal, como uma conta de e-mail. Isso deve revolucionar a medicina, que deverá se tornar, imagino, mais adequada ao alto nível de especialização que vemos hoje. Porque o que vejo é uma quantidade enorme de pessoas, inclusive médicos, incapazes de interpretar dados. Diagnóstico é informação. Há pacientes que não sabem identificar sinais e não conseguem passar informação adequada aos médicos. E há médicos que não fazem as perguntas corretas e, se as fazem, não conseguem transformá-las em diagnóstico preciso. Os algoritmos saberão o que fazer. Os dados e gráficos, a meu ver, dizem mais que o paciente.

Qual seria, então, a função dos médicos? A primeira parte do tratamento – a da coleta e análise inicial das informações – deve ser computadorizada e automatizada. Há computadores muito bons para receber dados e números e estabelecer relações. O papel dos médicos é o da atualização destes parâmetros, investigar o que passou a ser importante no diagnóstico de determinada doença e o que não é mais um dado confiável. Vejo os médicos como pesquisadores e juízes, o macro-olhar sobre o diagnóstico.

Como será o acesso de países pobres a este tipo de abordagem médica e científica? O lado bom de automatizar a informação é justamente a democratização dos processos que vem junto. Lugares distantes de centros de medicina diagnóstica poderão fazer uso intenso do diagnóstico via computador. Como a comunicação entre médico e paciente é falha (ou falta ao médico conhecimento suficiente sobre o conjunto de sintomas apresentados), o diagnóstico é falho. Acertar no diagnóstico é fundamental. Por isso, os países pobres podem pressionar o governo e o sistema médico a adotar a medicina automatizada, porque, em síntese, automatizar o diagnóstico vai salvar mais vidas.

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