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Alianças para a paz

Em artigo exclusivo, Secretário de Estado dos EUA John Kerry aponta os desafios que terão de ser vencidos no ano que vem para que o mundo avance em diplomacia e cooperação

Por John Kerry
31 dez 2014, 07h10

Cresci à sombra da Segunda Guerra Mundial e do surgimento da Guerra Fria. O trabalho de meu pai como diplomata me deu a oportunidade de ver a história de uma forma mais próxima: nunca me esquecerei de quando andei pelas praias da Normandia com ele, vendo cascos de navios queimados em suas margens, poucos anos depois que tantos jovens morreram para nós fôssemos livres. Tampouco esquecerei a sensação estranha de cruzar de bicicleta o Portão de Brandeburgo da Berlim Ocidental para a Oriental, vendo o contraste entre as pessoas que eram livres e as que ficaram presas atrás da Cortina de Ferro.

O que vejo agora, tantos anos depois, é que uma geração de líderes ganhou não apenas uma guerra, mas também a paz. Eles fizeram isso juntos. Os Estados Unidos e nossos parceiros trabalharam para criar alianças que trouxeram prosperidade e estabilidade à Europa Ocidental, ao Japão e à Coreia do Sul. Velhos inimigos se tornaram novos aliados e juntos criamos um novo sistema econômico global que tornou o mundo mais próspero. E até mesmo com a Guerra Fria, os líderes encontraram formas de cooperar no controle de armas e prevenir um desastre nuclear.

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Em resumo, ao construir instituições internacionais e parcerias estratégicas, não apenas evitamos outra guerra mundial catastrófica, mas também colocamos fim à Guerra Fria e elevamos o padrão de vida de centenas de milhões de pessoas. Essa é a história notável que vai emergir no século XXI.

Hoje, a ordem mundial enfrenta novos desafios. A agressão russa causa turbulência. Extremistas que assaltam a religião ameaçam governos e pessoas em toda parte. A tecnologia está acelerando uma mudança no equilíbrio de poder entre governos e governados, oferecendo oportunidades de melhora democrática, mas também obstáculos às políticas inclusivas.

Nós viemos de um mundo onde o poder residia em hierarquias e passamos para outro habitado por redes. A política tem de se adaptar a isso. As instituições internacionais e parcerias que emergiram no pós-guerra demandam não só manutenção, mas também modernização.

Em face de toda essa turbulência, alguns sugerem que os Estados Unidos deveriam se voltar para seu próprio umbigo. Isso não é novidade. Alguns defendem esse mesmo ponto desde a Segunda Guerra. Eles reforçaram isso de novo há 25 anos, depois da queda do Muro de Berlim. Eles estavam errados à época – e continuam agora.

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A necessidade de liderança nunca foi tão grande e os Estados Unidos nunca estiveram mais engajados com o mundo. Nosso papel na primeira transição democrática pacífica no Afeganistão nos lembra de que depois de investirmos tanto sangue e dinheiro em ajudar a dar aos afegãos uma chance de vencer a batalha, o mundo tem a responsabilidade de ajudar seus líderes em sua capacidade de governar.

Sabemos que a destruição de 100% das armas nucleares declaradas da Síria não teria acontecido sem a perseverança da diplomacia, assim como a guerra civil imoral e horripilante desse país não teria terminado sem um compromisso semelhante. Então, também na Ásia, onde o presidente americano Barack Obama e o presidente chinês Xi Jinping acabaram de anunciar ambiciosos compromissos para combater as mudanças climáticas, nós somos lembrados do que os países podem conseguir juntos quando há uma liderança real. Também percebemos quão necessária é uma liderança adicional para que possamos concluir com sucesso um acordo climático em Paris no próximo ano.

O mundo mudou e nós estamos mudando com ele. As linhas no mapa não contêm mais graves ameaças e os exércitos não estão mais divididos claramente em dois campos. No século XXI, tudo é desafiador. É por isso que o mundo precisa de uma diplomacia de coalizão. Nenhum país pode derrotar o terrorismo sozinho. Nenhum país pode resolver uma ameaça climática sozinho. Nenhum país pode erradicar a extrema pobreza, combater epidemias ou melhorar sua segurança nuclear sem ajuda.

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Nenhum de nós pode viver a salvo e mais próspero virando as costas para o mundo. Precisamos construir em nossa história de parceria com aliados a formação de novas coalizões – com governos, com a sociedade civil e, sim, com todas as pessoas comuns.

Um bom exemplo é o esforço internacional para confrontar a brutalidade do Estado Islâmico no Iraque e na Síria. Ferramentas de inteligência, política e ajuda humanitária de mais de 60 países estão sendo usadas para apoiar uma ação militar unificada. O sucesso dessa empreitada depende não do que um país sozinho pode fazer, mas do que todos nós podemos alcançar ao mantermos nossos esforços contra essa ameaça.

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Num aspecto igualmente importante, os Estados Unidos estão trabalhando com a Organização das Nações Unidas para estimular uma resposta global ao perigo imposto pelo vírus Ebola. Eu pessoalmente falei com mais de 50 líderes estrangeiros e nós concordamos que apenas se coordenarmos nossas ações poderemos parar a devastação na África ocidental e eliminar o avanço do Ebola.

Estamos progredindo em ambas as questões, mas resta muito trabalho pela frente. Juntar países que têm interesses comerciais conflitantes em diversos setores é um trabalho árduo. Demanda engajamento diplomático intenso e coloca em teste várias relações construídas e mantidas por décadas, assim como as alianças com novos parceiros. Mas, ao superar as diferenças e coordenar esforços para derrotar o Estado Islâmico e vencer o Ebola, estamos reforçando o apoio a uma ordem mundial baseada em soluções coletivas a problemas em comum.

A cooperação é igualmente vital para reforçar os princípios econômicos sobre os quais os Estados Unidos e outros países construíram sua prosperidade no pós-guerra. A frustração não pode crescer mais rápido que as oportunidades para nenhum país. Por exemplo, as negociações sobre o Acordo Transpacífico refletem a determinação do presidente Obama em promover uma parceria com os países que representam um terço do comércio mundial e 40% do PIB global.

Os benefícios – para os Estados Unidos e seus parceiros – são enormes. Estimativas apontam que o acordo pode prover 77 bilhões de dólares por ano em arrecadação real e apoiar a criação de 650 mil empregos apenas em território americano. O fato de o acordo ser negociado também com a União Europeia oferece um passo ainda maior para o avanço do comércio.

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Seja por segurança mútua ou prosperidade compartilhada, as parcerias verdadeiras não são construídas do dia para a noite. Diplomacia paciente e vontade coletiva são necessárias para avançar em objetivos comuns. Os objetivos dos Estados Unidos permanecem os mesmos que têm sido por décadas: paz, prosperidade e estabilidade para o país e para nossos parceiros ao redor do mundo.

John Kerry é o atual Secretário de Estado dos Estados Unidos. É ex-senador do estado de Massachusetts e ex-presidente do Comitê de Relações Internacionais do Senado americano

© Project Syndicate 2014

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