Como o ‘padrão Fifa’ de qualidade pode salvar a Copa-2014
O sorteio no Rio seguiu à risca as exigências da entidade - que conta com uma bem azeitada máquina administrativa capaz de prevenir fiascos de organização
A nuvem de suspeitas de corrupção que acompanha a Fifa há décadas costuma encobrir um dos segredos do sucesso da entidade que controla a modalidade esportiva mais popular do planeta. Enquanto sua cúpula trata de política e diplomacia – alguns de seus dirigentes costumam afirmar que ela é mais poderosa e influente que a ONU -, há um segundo escalão que faz funcionar uma potente (e rentável) máquina administrativa. É nesse nível de hierarquia que rodam as engrenagens mais eficientes da Fifa, que garantem o sucesso de todas as competições organizadas pela entidade. E é justamente essa rígida estrutura que pode impedir que a Copa do Mundo de 2014 fracasse, apesar do planejamento falho e da execução pífia do projeto brasileiro até agora. No sábado, os resultados de uma pesquisa de opinião feita pelo site de VEJA mostraram que há uma enorme desconfiança e forte pessimismo em relação ao Mundial no Brasil. No mesmo dia, porém, o primeiro evento oficial da Copa – o sorteio dos grupos das Eliminatórias, no Rio de Janeiro – transcorreu de maneira absolutamente correta, sem grandes sobressaltos. Graças ao “padrão Fifa” de qualidade, seguido à risca por qualquer um que aceite fazer negócio com a entidade, a chance de fiasco acaba sendo pequena. Para que uma Copa do Mundo naufrague, um país precisa de uma dose cavalar de incompetência.
Edição especial VEJA-Placar
Organização: A Copa do Mundo é agora
Artigo: Só vale mesmo pela felicidade
História: Maracanã, um colosso improvisado
Infraestrutura: Corrida contra o tempo
Seleção brasileira: Vai faltar pressão
Negócios: Na Fifa, os senhores da bola
Encarregados de estabelecer e fiscalizar todas as exigências que acompanham a realização de um evento Fifa, os grupos técnicos da entidade costumam ser o pesadelo dos comitês organizadores. Implacáveis nas suas intermináveis cobranças, revisões e correções de projetos, eles costumam testar a paciência dos envolvidos nas obras em estádios e outras instalações ligadas à Copa. Para receber uma partida do Mundial, um estádio precisa cumprir uma avalanche de requisitos técnicos, que vão desde a configuração das arquibancadas até o número de sanitários e lanchonetes disponíveis em cada setor. Esses padrões existem também para cerimônias como a de sábado. Nos bastidores da festa realizada na Marina da Glória, a estrutura armada pelos brasileiros era bastante similar à que acompanhava todas as partidas e eventos da Copa do Mundo da África do Sul. Isso era evidente, por exemplo, na montagem das tendas destinadas a funcionários da Fifa, voluntários locais, imprensa e equipes de apoio. Alguns desses locais eram absolutamente idênticos aos que serviram a Fifa no Mundial de 2010, tanto em suas dimensões como no funcionamento dos serviços prestados. Nada disso é coincidência, evidentemente. Cada detalhe dos lugares erguidos ao redor do palco da Marina da Glória faz parte de um conjunto de exigências que a Fifa entrega – sem chance de negociação – ao comitê organizador local.
Assim como era comum na África do Sul, as poucas e pequenas falhas da cerimônia que deu o pontapé inicial ao Mundial no Brasil foram sempre ligadas ao preparo – ou falta dele – das pessoas escaladas para fazer o evento funcionar. As informações desencontradas fornecidas por alguns funcionários eram suficientemente frequentes para justificar a montagem de uma inusitada sala dedicada à “resolução de problemas” em geral. Ficou bastante evidente também o risco de problemas decorrentes de velhas tradições brasileiras, como o mal do “você sabe com quem está falando?” e as pragas do “jeitinho” e do “favorzinho”. Como o grau de treinamento e preparação de funcionários é mais difícil de medir, é nesse ponto que a Fifa se arrisca a ter mais problemas em seus eventos. Para o Brasil, porém, 2014 pode ser uma excelente chance de amenizar uma deficiência incômoda para um país que emerge com vigor no cenário internacional: a formação de mais profissionais qualificados para atender aos visitantes estrangeiros, que chegam em número crescente às grandes cidades brasileiras. No sábado, o pano de fundo espetacular da festa – um Rio de Janeiro com céu aberto e calor de 30 graus em pleno inverno – foi mais que o bastante para encantar os convidados. No Mundial, quando muito mais coisa estará em jogo, apenas as belezas naturais e a simpatia do povo não resolverão.
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