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‘O politicamente correto não me interessa’, diz Tarantino

Sem dar importância para críticas ou conservadorismos, diretor fala sobre seu oitavo filme, o faroeste 'Os Oito Odiados', e seu legado para o cinema

Por Raquel Carneiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 12 jul 2017, 10h33 - Publicado em 9 jan 2016, 08h43

“Eu revolucionei o cinema”. A frase, dita pelo imodesto Quentin Tarantino ao site de VEJA é um bom exemplo de como funciona a cabeça do diretor americano. A autoconfiança do cineasta, de 52 anos, parece ser inabalável, e não depender de fatores externos. Mas prêmios, é claro, não atrapalham – entre eles, duas estatuetas do Oscar, ambas de melhor roteiro original, para Pulp Fiction (1994) e Django Livre (2012). Assim, fica difícil chamar o cineasta de presunçoso. Ele sabe o cacife que tem.

E é com essa autoestima elevada que Tarantino chega ao cinema Os Oito Odiados, um faroeste atípico, que reúne oito personagens de índole duvidosa em um espaço fechado que repete muitos dos temas e recursos favoritos do diretor, com muito sangue jorrando da tela e diálogos cortantes – alguns usam a palavra “nigger”, termo tabu entre os americanos por sua carga racista. Mas Tarantino não se importa. “Não sou um estudante universitário. O politicamente correto não me interessa e nem interfere no meu trabalho”, diz.

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Trata-se do oitavo filme do cineasta, como proclama orgulhosamente um letreiro no início da projeção. Se você está confuso com as contas para chegar ao número oito, então não está sozinho (ver lista abaixo). O cineasta exclui do cálculo obras em grupo, como nos longas Grand Hotel (1995) e Sin City: A Cidade do Pecado (2005), e considera os dois volumes de Kill Bill como um só filme. Tarantino avisou que, a partir de sua décima produção, abandonará a direção. “Há um nível de qualidade que quero manter. Não tenho esposa e filhos, meus filmes são minha vida. Não quero ouvir das pessoas: ‘Ele era bom tantos anos atrás, mas agora filma qualquer coisa’. Tenho que ficar feliz com o resultado”, disse durante sua passagem por São Paulo para divulgação do novo longa.

Tarantino surgiu nos anos 1990 e, verdade seja dita, causou mesmo uma revolução. A montagem estonteante e não-linear, os roteiros supreendentes e a violência como mote fizeram dele um “autor”, especialmente após Pulp Fiction. O longa foi uma ruptura no estilo de fazer cinema da época, fugiu das fórmulas de sucesso de Hollywood e deu aos atores do elenco uma nova aura.

Alguns atores têm sua carreira estreitamente ligada aos seus papeis em filmes de Tarantino. É o caso de Tim Roth. O ator inglês começou a trabalhar com Tarantino em Cães de Aluguel (1992), como o personagem Orange. A parceria se estende até agora, com Os Oito Odiados, em que Roth vive o carrasco Oswaldo Mobray. “Ele se tornou um diretor melhor”, diz Roth. “Ele tem o tempo e financiamento adequado, assim como o ator que quiser, pois todos querem trabalhar com ele.”

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Confira abaixo a conversa com o ator e o cineasta, durante a passagem de ambos pelo Brasil:

Ao longo da sua carreira, o senhor recebeu diversos elogios por inovar no cinema. Ao mesmo tempo, foi criticado pelo uso excessivo de violência e de palavras consideradas racistas. Acredita que a cultura e o cinema têm sofrido com o conservadorismo?

Tarantino – Se eu parasse para pensar sobre o politicamente correto eu poderia responder a isso. Talvez nossa sociedade esteja, sim, mais conservadora hoje em dia, mas eu não dou à mínima. Não sou um estudante universitário. O politicamente correto não me interessa e nem interfere no meu trabalho.

Pulp Fiction é considerado um dos melhores filmes do seu currículo e ele é mesmo o oposto do politicamente correto. Como acha que ele seria recebido se fosse lançado hoje?

Tarantino – Acredito que as pessoas gostariam de Pulp Fiction hoje também. É complicado trazê-lo para os tempos atuais, pois o cinema mudou depois dele. O mercado cinematográfico respondeu ao filme e sua estética. Seria como se Sergio Leone não tivesse lançado Por um Punhado de Dólares nos anos 1970. O cinema seria inimaginável, pois todo faroeste é associado a ele. E Pulp Fiction também é assim. Com ele, eu revolucionei o cinema.

Seus três últimos filmes enveredaram por um caminho mais político que o restante de sua filmografia. Foi essa sua intenção?

Tarantino – Meus últimos filmes são de fato mais políticos. Acredito que o que faz de Os Oito Odiados o mais político de todos sou eu, Quentin, que pertenço ao lado azul, democrata, dos Estados Unidos. Vivo em um país dividido, assim como na época da Guerra Civil. E a linha que nos divide é tênue. Neste filme, não luto pelo lado de ninguém. Cada um tem seu argumento.

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Como é trabalhar com Tarantino durante tanto tempo?

Roth – Com mais filmes, ele se tornou um diretor melhor. Mais experiente. E, agora, ele tem o tempo e o financiamento adequados, assim como o ator que quiser, pois todos querem trabalhar com ele.

Desde Bastardos Inglórios, o senhor tem se aprimorado em prolongar os momentos de tensão em cenas de muitos minutos. Em Os Oito Odiados, essa dilatação dura quase três horas. Como chegou a esse resultado?

Tarantino – A ação tem que funcionar primeiro no papel. Quando termino de escrever, pergunto se aquilo está bom só pra mim ou se a plateia vai ficar satisfeita também. O respiro vem com os capítulos, que nada mais são que a maneira de um autor dividir a história. Você sabe o que vai acontecer, o filme dá pistas, e você espera pelo inevitável.

O filme tem em longos diálogos. Como foi transpô-los para a tela?

Roth – Para mim, foi um texto fácil de assimilar. É um tipo de escrita completa, que não precisa de improvisação. O Tarantino sempre nos diz para, antes de tudo, aprender as falas. Não estamos em busca da cena que ficou boa, mas da que pode ficar melhor. Tenho bastante liberdade como ator, mas nunca quero mudar os diálogos.

Tarantino – Ensaiamos por três semanas antes de começar e também fizemos uma leitura em público. Quando chegou a hora de filmar as cenas foi fácil, pois os atores sabiam de cor cada diálogo. Desde Kill Bill eu me concentro mais nos diálogos. Creio que eu serei lembrado no futuro por causa disso. Antes de serem filmes, meus roteiros são como prosas. Sinto que escrevi mais livros do que filmes.

É melhor sair de um filme de Tarantino vivo ou morto?

Roth – É definitivamente melhor morrer em um filme do Tarantino (risos). Pois temos a certeza de que será divertido. Você quer sair do cenário cheio de sangue espirrado. Algumas mortes neste filme são espetaculares, algumas engraçadas, outras brutais. Mas, para mim, é mais divertido terminar o filme morto.

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Os filmes de Tarantino

‘Cães de Aluguel’ (1992)

Quentin Tarantino estreou como diretor em 1992, com o filme Cães de Aluguel. A história é sobre um grupo de bandidos contratados por um grande criminoso da região, Joe Cabot (Lawrence Tierney), que tenta assaltar uma joalheria. Nenhum dos integrantes da quadrilha se conhece e um não sabe nem mesmo o nome do outro. Com o fracasso do crime, os sobreviventes se encontram em um armazém próximo ao local, previamente combinado. O que se sucede é uma troca de acusações e um clima de tensão, que aumenta quando Mr. Pink (Steve Buscemi) revela sua desconfiança de que teria um policial disfarçado entre eles.

 

‘Pulp Fiction: Tempo de Violência’ (1994)

O segundo filme do diretor se transformou em um dos maiores clássicos do cinema contemporâneo. A trama é contada em ordem não-linear, de modo que o espectador muda sua ótica em relação aos acontecimentos a medida que o filme avança. O enredo é, inicialmente, sobre dois matadores de aluguel, Vicent Vega (John Travolta) e Jules Winnfield (Samuel L. Jackson), que trabalham para o criminoso Marsellus Wallace (Ving Rhames). A dupla se envolve com outros personagens ao longo da trama, como o boxeador Butch (Bruce Willis) e Mia Wallace (Uma Thruman) – esposa do gângster. O longa conta com algumas das cenas mais famosas do cinema, como a dança de Mia e Vega em uma lanchonete. O filme levou o Oscar de melhor roteiro original em 1995.

 

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‘Jackie Brown’ (1997)

A aeromoça que dá nome ao filme, e é vivida por Pam Grier, é uma traficante de dinheiro ilegal para os Estados Unidos e possui uma relação estranha com o vendedor de armas Ordell (Samuel L. Jackson). Ele usa a companheira para realizar suas transações criminosas. Após ser pega, a Polícia Federal oferece um acordo para que ela entregue todos os criminosos envolvidos no esquema, o que a faz pensar em um plano para sair por cima de todos. O longa marca a segunda parceria entre Jackson e Tarantino

 

‘Kill Bill’ (2003 e 2004)

O filme, lançado em dois volumes, é considerado pelo seu diretor como um só. A história é sobre uma noiva grávida – que não tem seu nome revelado -, vivida por Uma Thruman, que é traída por seu parceiro, Bill (David Carradine), e seus amigos no dia do casamento: todos tentam matá-la. Ela fica em coma por anos. Quando finalmente acorda, parte em busca de vingança. Fã declarado de filmes de artes marciais, Tarantino explorou exaustivamente o gênero na história, que, como as outras do cineasta, conta com bons litros de sangue derramados ao longo das mais de 4 horas das duas partes.

 

‘À Prova de Morte’ (2007)

Três amigas – vividas por Rosario Dawson, Zoe Bell e Sydney Tamiia – saem para beber em uma cidade no Texas. No bar escolhido por elas há um estranho homem: Stuntman Mike (Kurt Russel). O maluco decide perseguir as garotas em seu carro à prova de morte – que mais parece um tanque de guerra. A perseguição incessante resulta em um filme de ação em alta velocidade. Apesar de interessante e intenso, o longa é considerado um dos mais fracos da filmografia do cineasta.

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‘Bastardos Inglórios’ (2009)

Durante a Segunda Guerra Mundial, um grupo de judeus americanos, liderados por Aldo Raine (Brad Pitt), sai pela Europa matando nazistas. Ao descobrir que haverá uma exibição de um filme em Paris que contará com a presença de Hitler (Martin Wuttke), o pelotão monta uma missão para matar todos os que estarão dentro do teatro. O local é propriedade da judia Shosanna Dreyfus (Mélanie Laurent), que vive disfarçada na capital francesa e também vê na oportunidade uma chance de se vingar do coronel Hans Landa (Christoph Waltz), que matou toda a sua família anos atrás, e estará presente no evento. O longa levou o Oscar de melhor ator coadjuvante, concedido para Waltz.

 

‘Django Livre’ (2012)

Tarantino se aventurou em um novo gênero em seu sétimo filme: o faroeste. A trama, que se passa alguns anos antes da Guerra Civil americana conta a história do escravo Django (Jamie Foxx), que é comprado pelo alemão Dr. King Schultz (Christoph Waltz), um assassino de aluguel que finge ser um dentista. A compra, entretanto, não passa de um plano, já que o caçador de recompensas quer o escravo apenas para ajudar na sua missão e promete libertá-lo quando essa for cumprida. Os dois se tornam amigos e vão juntos à fazenda de algodão do rico Calvin Candie (Leonardo DiCaprio), a fim de libertar Broomhilda (Kerry Washington), esposa de Django, que trabalha como escrava no local. O filme venceu dois prêmios no Oscar: melhor roteiro original e de ator coadjuvante, novamente pela atuação do austríaco Christoph Waltz.

 

‘Os Oito Odiados’ (2015)

O diretor volta ao faroeste em seu oitavo longa que começa com a história dos caçadores de recompensa Marquis Warren (Samuel L. Jackson) e John Ruth (Kurt Russel). O último está levando a procurada Daisy Domergue (Jennifer Jason Leigh) à uma cidadezinha, onde ela será enforcada e ele receberá o prêmio de 10.000 dólares. No caminho, eles encontram Chris Mannix (Walton Goggins), que afirma ser o futuro xerife da cidade para onde a diligência caminha. O grupo segue viagem, mas tem que parar em um armazém no meio das montanhas devido a uma forte nevasca. Lá eles encontram outros hóspedes e um mexicano (Demián Bichir), que afirma ser o responsável pelo local enquanto a proprietária visita a família. O clima entre os desconhecidos se torna tenso e aumenta até explodir em um banho de sangue.

 

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