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Quanto vale um professor universitário?

Para especialistas, o teto salarial imposto às universidades públicas brasileiras pode limitar o papel das instituições na sociedade, de berço de pesquisas a meras fábricas de bacharéis

Por Bianca Bibiano
7 dez 2014, 16h31

Na última sexta-feira, dia 05, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) rejeitou, mais uma vez, as contas apresentadas por uma universidade pública paulista. Já se tornou rotina o órgão responsável pela fiscalização do orçamento estadual apontar irregularidades na folha de pagamento da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Pela lei, o salário de professores, pesquisadores e demais funcionários vinculados a uma das universidades públicas estaduais não deve ultrapassar o teto constitucional, determinado pelo salário do governador Geraldo Alckmin, atualmente em 20.622 reais. Em meio à crise financeira enfrentada pelas instituições (só a USP, por exemplo, compromete 106% de seu orçamento com folha de pagamento), os pagamentos acima do teto se tornaram alvo de críticas. A discussão, porém, deveria diferenciar os gastos com administração daqueles relacionados às atividades de pesquisa e ensino: a universidade deveria ser impedida de trazer, por exemplo, um prêmio Nobel para seus quadros por causa do teto de remuneração?

Para Phil Baty, editor do ranking mundial de universidades divulgado pela publicação britânica Times Higher Education (THE), a determinação de um teto salarial para docentes e pesquisadores é contraproducente, pois afasta talentos. “Tetos salariais ou remunerações não competitivas em nível global podem levar professores e pesquisadores a buscar uma carreira em outro país”, diz Baty. Para ele, a regra salarial é incompatível com os anseios do Brasil de ter uma universidade entre as melhores do mundo. “O fator mais importante para ajudar uma universidade a alcançar altos padrões de qualidade é atrair os melhores talentos do mundo. Se a USP, que é principal universidade do Brasil, não consegue competir com outras instituições, dificilmente conseguirá se destacar como deseja.”

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Nos Estados Unidos, onde estão as mais renomadas instituições do mundo, o salário do professor é determinado por seu currículo e produtividade, e não fica restrito a uma faixa salarial estipulada por órgãos legislativos e judiciários. “Ao negociar a contratação, o professor pode pleitear condições de trabalho. Se a instituição pretende incluir um determinado professor em seu quadro, ela tem a possibilidade de fazer uma proposta salarial para cobrir outras ofertas”, explica o brasileiro Paulo Blikstein, cientista da computação e professor na Universidade Stanford desde 2008. Apesar de ter se graduado no Brasil, Blikstein decidiu fazer carreira nos EUA. “As condições de trabalho, principalmente para pesquisadores, são melhores lá fora. O governo americano investe nessa área porque sabe que as pesquisas darão retorno para a economia a longo prazo”, diz.

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Meritocracia – Ao contrário do que acontece no Brasil, onde as remunerações sobem conforme aumenta o período de vínculo do professor ou funcionário administrativo com a instituição, nas universidades de ponta a definição salarial é baseada na produtividade. Na Inglaterra e nos EUA, por exemplo, os salários são determinados pelo impacto das pesquisas desenvolvidas pelo docente quando ele não está em sala de aula. Ou seja, professores que ocupam cargos equivalentes e com cargas horárias de aula semelhantes podem receber salários diferentes, conforme o rendimento acadêmico de cada um.

“Esse é o máximo de reconhecimento que um docente pode ter, pois ele está sendo remunerado de acordo com o impacto que seu trabalho produz para a sociedade. Não é coincidência que os docentes que atuam nas universidades da região do Vale do Silício tenham salários muito mais altos, inclusive para os padrões americanos; eles atuam para produzir novas tecnologias que impactam diretamente na vida das pessoas e na economia do país. Seus contratos e, portanto, seus rendimentos levam esse fator em conta”, explica José Scheinkman, cientista político brasileiro que dá aulas na Universidade Princeton, nos EUA.

Além da remuneração, outras questões impactam na decisão de professores de não atuar no Brasil. O economista brasileiro José Antônio Cheibub trabalha nos Estados Unidos há mais de vinte anos. Atualmente, ele integra o corpo docente da Universidade de Illinois e afirma que não tem perspectiva de voltar ao país. “As condições de trabalho nas universidades americanas são mais favoráveis do que às oferecidas nas universidades públicas brasileiras. Aqui, elas têm mais autonomia para, por exemplo, reduzir o número de aulas para que um professor dedique mais tempo à pesquisa, sem que haja perdas salariais. No Brasil, isso não acontece”.

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Fábrica de bacharéis – Segundo o especialista em avaliação do ensino superior José Carlos Rothen, dificilmente o Brasil conseguirá atingir padrões internacionais preso às regras vigentes. “O papel da universidade é formar profissionais para o mercado, mas também abrigar pesquisadores aptos a desenvolver tecnologia e ciência de ponta para o país. No Brasil, onde essa área é negligenciada, as universidades correm o risco de se tornar meras fábrica de diplomas”, afirma. Mas Rothen ressalta que aumentar os salários não é a única solução. “Antes de pensar em elevar vencimentos, as instituições devem fazer um diagnóstico dos gastos e rever prioridades”. Entre as questões primordiais, o especialista cita o maior investimento em pesquisas e na infraestrutura das universidades.

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