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Sem escolha, beneficiários da Unimed Paulistana ficam ‘presos’ ao sistema

Após quebra da operadora de saúde complementar, clientes se submetem a planos mais caros e piores para garantir o benefício e evitar carências em outras operadoras

Por Luís Lima e Eduardo Gonçalves
8 nov 2015, 16h14

A quebra da Unimed Paulistana, decretada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar no dia 2 de setembro, afetou 740.000 clientes, 2.400 médicos e expôs dívidas de 210 milhões reais com hospitais e de mais de 1 bilhão de reais com o Fisco. Esses são os grandes números do maior fracasso financeiro de uma operadora de saúde complementar na história do país. Por trás deles estão clientes que, nos casos de doenças pré-existentes, viram-se “presos” à operadora – e o prazo para decidir o que fazer, que vai até 15 de novembro, está perto do fim. Se migrarem para outra operadora, poderão ter de cumprir prazos de carência que, em alguns casos, chegam a dois anos. Se optarem por outras operadoras do sistema Unimed, o dilema persiste: ou escolhem um plano mais caro, para manter no mesmo nível o tratamento que já estava em andamento, ou um plano mais barato, mas com cobertura limitada.

O caso da assistente financeira paulista Caroline Ribeiro Cezário, de 31 anos, põe em cores vivas o quadro que os números da derrocada da Unimed Paulistana não deixam entrever. Na mesma semana em que a quebra da operadora foi anunciada, Caroline, grávida de sete meses e meio, deu à luz Maria Luiza, que nasceu prematura. Com a bolsa rompida, ela foi ao Hospital Santa Helena, da rede Unimed, em São Paulo, que estava lotado. A segunda opção foi o Santa Joana, também na capital paulista, onde foi atendida sob a condição de intercâmbio de plano. “Só me atenderam devido à urgência do caso”, afirma. Com a filha ainda na UTI, Caroline viu-se compelida a fazer um novo plano com a Unimed, pois, se quisesse migrar, teria que cumprir carência em outra operadora. “Tive de fazer um plano mensal de 638 reais para uma recém-nascida, em um contrato de um ano”, lamenta. “Pretendo entrar na Justiça para cancelar, mas, agora, sou obrigada a fazer o que eles querem.”

A assistente financeira Caroline Ribeiro Cezário, de 31 anos, ficou “presa” à Unimed devido à sua filha, Maria Luiza, que nasceu prematura e está na UTI
A assistente financeira Caroline Ribeiro Cezário, de 31 anos, ficou “presa” à Unimed devido à sua filha, Maria Luiza, que nasceu prematura e está na UTI (VEJA)

A situação de Caroline lembra a de Mônica Luiz, de 29 anos, também gestante. Como não tinha plano de saúde, a personal trainer paulista decidiu, em junho, contratar a Unimed Paulistana para “deixar tudo em ordem”. Após três meses de plano veio a falência e a frustração do seu objetivo de dar à luz na maternidade Pro Matre, de sua preferência. “Agora estou ‘presa’, pois nenhuma outra operadora fora do grupo Unimed cobre o tempo que eu tenho de carência”, explica. Para manter a mesma rede de assistência por um preço razoável, Mônica pretende entrar na Justiça contra a empresa. Se nada der certo, recorrerá à saúde pública. “Não aceito as condições para migração, nem tenho 10.000 reais paga pagar um parto particular. Então, a saída é o SUS”, afirma, fazendo referência ao Sistema Único de Saúde.

O caso da consultora de cosméticos R. R. C, de 49 anos, é mais dramático. Ela faz tratamento para combater um câncer de mama descoberto há dois anos. O hospital em que estava sendo atendida, o AC Camargo, especializado em casos oncológicos, parou de prestar serviços a clientes Unimed Paulistana no fim do ano passado. A consultora, no entanto, continuou a ser atendida na instituição porque ganhou uma liminar na Justiça. Em agosto deste ano, fez uma cirurgia de reconstrução do seio. Em setembro, a ANS decretou a falência da Unimed Paulistana. Desde então, ela não conseguiu mais ser atendida, mesmo com a determinação judiciária.

Ela conta que tinha três consultas para avaliação do quadro pós-operatório agendadas para setembro (dia 29) e outubro (8 e 20). Foi barrada em todas. “Alegavam que a minha senha era inválida. Cheguei até a esperar três horas para depois não ser atendida”, afirmou. Como estava em litígio com o convênio e o hospital, ela precisava retirar uma senha com a Unimed Paulistana antes de ir ao AC Camargo. A consultora também reclama que desde agosto não está recebendo o remédio que ganhava de graça do plano. o tamoxifeno. Cada cartela do medicamento, que dura um mês, custa 120 reais.

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Na semana passada, ela se viu “obrigada” a migrar para outro plano da Unimed, já que por ter doença pré-existente, precisaria cumprir um período de carência para mudar de convênio. “A minha vontade era sair da Unimed depois de todos os problemas. Isso é um absurdo da ANS, que nos obriga a ir para um dos braços da Unimed. Porque – Deus me livre! – vai que aparece uma metástase e eu não estou coberta”, afirmou. O plano com praticamente a mesma rede de conveniados, que antes custava 600 reais, agora sai a 1.100 reais, segundo ela. “É quase o dobro. Mas não tem o que fazer no meu caso. Faz dez anos que eu estou na Unimed. Você paga convênio durante muitos anos e, de repente, quando você mais precisa, é deixado na mão.”

Na Federação das Unimeds do estado de São Paulo, os cancelamentos são feitos “a toque de caixa”, segundo expressão usada pela ex-beneficiária e professora de inglês Camila Barbosa. “Eles me entregaram uma folha sulfite xerocada, pediram pare preencher com meus dados, além da minha carteirinha. Em seguida, protocolaram o pedido, carimbaram e pronto”, diz. Segundo ela, há diversas pessoas na fila com problemas, e os desligamentos estão sendo feitos o mais rapidamente possível. A opção de Camila, que já teve um câncer na tireoide, foi fugir da Unimed, para evitar dores de cabeça. A saída encontrada foi ser coparticipante de um plano corporativo do marido em uma outra cooperativa.

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Migração – A portabilidade extraordinária foi estabelecida em um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado por ANS, Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual de São Paulo e o Instituto de Defesa do Consumidor (Procon/SP) com a Unimed do Brasil, a Central Nacional Unimed (CNU), a Unimed Fesp e a Unimed Seguros. Conforme dados disponibilizados pelas operadoras em 29 de outubro, 10.866 beneficiários já realizaram a transferência para planos da CNU e da Unimed Seguros. Ainda não há dados disponíveis sobre a Fesp, que tem recebido a maior parte dos clientes.

O objetivo foi o de garantir a proteção e a existência de planos de saúde individuais para receber os consumidores da Unimed Paulistana, garantindo que eles não cumprissem novas carências e tivessem cobertura imediata de urgência e emergência. O problema é que, em todos os casos, as opções para migração eram para planos com rede de assistência menor e mais caros.

A aposentada Milica Passos, de 59 anos, por exemplo, teria que desembolsar 1.200 reais por mês para manter uma rede de assistência parecida com a que tinha antes da falência, que custava 600 reais. “Meu plano era nacional e dava direito a apartamento. Pelo dobro do valor, teria que ficar na enfermaria”, diz. “É um desrespeito. Por 15 anos, sempre paguei a Unimed Paulistana em dia.” Se optasse por deixar o sistema Unimed, Milica seria enquadrada como “idosa” em outra cooperativa, o que a faria pagar ainda mais pelo benefício.

Mesmo com a migração, os clientes devem continuar enfrentando problemas, afirma a advogada Renata Vilhena, especialista em saúde complementar. “A Unimed não tem condições de absorver todos os clientes da Paulistana. Já há um déficit de médicos e leitos hospitalares no Brasil. E como são poucos hospitais previstos nos planos do TAC, a tendência é que o consumidor continue enfrentando problemas no atendimento”, diz.

A ANS informou que ainda não tem uma estimativa sobre quantos clientes da Unimed Paulistana aderiram ao TAC. E a indefinição sobre o futuro dos usuários não é o único imbróglio relacionado à operadora. A crise financeira da empresa também atingiu os cerca 2.400 mil médicos cooperados – e muitos deles simplesmente tiveram que fechar seus consultórios.

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Para se beneficiar da portabilidade, o usuário deverá ir a uma central de atendimento da operadora com comprovante de pagamento de quatro boletos da Unimed Paulistana referentes aos últimos seis meses, cartão da Unimed Paulistana, RG, CPF e comprovante de residência.O portal da ANS traz informações adicionais sobre a portabilidade extraordinária.

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