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Planalto cria entraves para novo aeroporto em São Paulo

Endurecimento do governo federal dificulta a autorização para construção de um aeroporto privado na região metropolitana

Por Ana Clara Costa e Luciana Marques
27 jun 2011, 07h24

O governo do estado de São Paulo tenta, já há algumas semanas, emplacar uma reunião com o presidente da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Carlos Pelegrino, para tratar de um tema “tabu” em Brasília: o Novo Aeroporto de São Paulo (Nasp), em Caieiras, a 35 quilômetros da capital paulista. O projeto, elaborado pelas construtoras Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez em 2008, prevê a construção de um aeroporto privado na região metropolitana para responder ao forte crescimento da demanda aérea. A conversa continua sem data para ocorrer, mas a expectativa do governo estadual é obter o apoio da agência para tentar convencer o Palácio do Planalto da necessidade de tirar o projeto do papel.

A tarefa não será fácil. O governo federal opõe-se ao projeto do Nasp porque prefere fortalecer Viracopos, em Campinas (SP). Ao anunciar os planos de privatização de três grandes aeroportos, em maio, a presidente Dilma Rousseff explicitou sua preferência. “Viracopos é o futuro. É um dos grandes centros aeroportuários do país”, disse, na ocasião. Não à toa, o Plano Diretor do Aeroporto de Viracopos prevê investimentos de 850 milhões de reais até 2015 em sua ampliação.

Contra o Nasp e a favor de Viracopos também estão a companhia aérea Azul, do empresário David Neeleman, e a construtora Odebrecht. Em 2008, a Azul mostrou-se interessada em apoiar a construção do Nasp. No entanto, quando as construtoras Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez firmaram parcerias com a TAM e a Gol na elaboração do projeto do novo aeroporto, a companhia de Neeleman distanciou-se e, segundo apurou o site de VEJA, passou a apostar que o Nasp poderá “matar Viracopos”. Já a Odebrecht está na briga pela concessão de Viracopos – já apresentou ao governo um estudo mostrando que o aeroporto poderá comportar um fluxo anual de mais de 60 milhões de passageiros quando a etapa final de sua ampliação for completada.

A Infraero se une ao grupo dos que são contrários ao novo aeroporto de São Paulo. A estatal – que administra os principais aeroportos do país e que amarga frustração por não ser capaz de gerir as necessidades dos três aeroportos que serão privatizados – não aprecia a ideia de ver sua atuação reduzida com a autorização da construção de um terminal totalmente privado. “Eles não querem admitir que a iniciativa privada pode ser muito mais eficaz, pois é o mesmo que afirmar que a Infraero é incompetente”, afirmou um técnico ligado ao projeto.

Mudança de opinião – A opinião da presidente Dilma sobre o novo aeroporto passou por mudanças ao longo dos anos. Em 2007, dias após o acidente do voo 3054 da TAM, no Aeroporto de Congonhas (SP), a então ministra-chefe da Casa Civil chegou a anunciar a construção de um novo aeroporto em São Paulo. Na época, pediu à Anac que levantasse a melhor localização para o projeto como parte de um plano emergencial de revisão da gestão do transporte aéreo na capital. Nada chegou a sair do papel. No ano passado, em campanha eleitoral, Dilma voltou a reafirmar compromisso com o novo aeroporto – que foi ‘esquecido’ tão logo assumiu a Presidência da República.

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Hoje, ainda que o projeto lhe agradasse, Dilma teria de pagar um preço alto demais para emplacá-lo. Numa relação tensa com a base aliada, sobretudo com o PMDB e a ala mais sanguinária do PT, a presidente enfrenta pressões internas até mesmo para satisfazer as demandas daqueles que, supostamente, lhe dão sustentação política. Desta forma, seria muito complicado conseguir alinhavar a outorga de um aeroporto a um governo de oposição – sobretudo quando se trata do Estado de São Paulo, o maior objeto de cobiça do PT depois da Presidência da República e que, há décadas, é governado pelo PSDB, seu arquirrival de urna.

Capacidade limitada – A tese defendida pelo governo paulista, e atestada no projeto do aeroporto de Caieiras, ao qual o site de VEJA teve acesso, é que a ampliação dos aeroportos de Guarulhos, na Grande São Paulo, e de Viracopos, no interior, não será suficiente para suprir nem mesmo o aumento orgânico da demanda por voos – quanto mais o avanço do fluxo decorrente da Copa do Mundo de 2014.

Segundo o estudo, o aumento da capacidade do aeroporto de Guarulhos – com a construção de uma nova pista e do terminal nº 3 – e as melhorias para Congonhas, na capital, deverão oferecer uma capacidade de atender 44 milhões de pessoas por ano. Acrescida a ampliação de Viracopos (que abrirá espaço, inicialmente, para receber nove milhões de pessoas por ano), esse número salta para 53 milhões de passageiros anualmente. No entanto, projeções de demanda da consultoria SH&E apontam que, em 2014, somente os dois aeroportos metropolitanos contarão com um fluxo superior a 60 milhões de passageiros por ano. “Vamos continuar com um déficit aeroportuário porque as pessoas no governo não conseguem olhar para além de quatro ou cinco anos”, afirma o especialista Respício Antônio Espírito Santo Júnior, presidente do Instituto Brasileiro de Estudos Estratégicos e de Políticas Públicas em Transporte Aéreo.

Falta a autorização – A criação do Nasp exigiria cerca de 5,3 bilhões de reais, que seriam obtidos pela iniciativa privada junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e outras instituições. Ao governo do Estado caberia a tarefa de conceder as licenças ambientais e urbanísticas, além de prover vias de acesso ao aeroporto (rodoviárias ou ferroviárias). Já a Anac tem o papel de outorgar a autorização para que o aeroporto seja construído pela iniciativa privada – um formato diferente do modelo de concessão ao qual os três aeroportos que serão privatizados foram submetidos. Ao Planalto, mais especificamente à presidente Dilma Rousseff e sua recém-criada SAC, caberia autorizar a agência reguladora a conceder a outorga. “A questão é que, pela legislação, nem a Anac e nem a SAC são obrigadas a autorizar esse projeto, se ambas não quiserem”, explica o consultor legislativo do Senado Federal, Victor Carvalho Pinto.

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A política se sobrepõe – A situação é tão desfavorável para o Nasp que o aeroporto não é nem mesmo citado pelo Senado como opção para desafogar Guarulhos, Congonhas e Viracopos. “O que os senadores estão reivindicando é a outorga de concessões para outros aeroportos, além dos três que estão sendo privatizados”, afirma Pinto.

Segundo o governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, a busca do apoio federal é prioritária e está sendo comandada, sobretudo, pelo secretário de Logística e Transporte do Estado, Saulo de Castro Abreu Filho. “Quem tem o poder de conceder o aeroporto é o governo federal. E essas escolhas são técnicas, não políticas”, afirmou o governador durante uma visita à cidade de Mogi Mirim (SP), na última semana. De acordo com o estudo das construtoras e pareceres jurídicos que validam o regime de autorização, a obra é tecnicamente viável. “Inúmeros trabalhos foram apresentados mostrando que não há problema algum com a construção desse aeroporto. Há, é claro, modificações que devem ser feitas, mas o projeto é tecnicamente possível e há exemplos de aeroportos privados no mundo que funcionam muito bem”, afirma Respício Antônio Espírito Santo Júnior. Diante desse cenário, o aval político será determinante.

A desculpa do Planalto – A presidente deverá utilizar a Secretaria de Aviação Civil (SAC) – órgão vinculado ao Planalto que tem a função de coordenar as ações de todos os órgãos do setor em prol da modernização da infraestrutura aeroportuária nacional – para validar seu posicionamento contrário ao projeto. Para isso, deve lançar mão de embasamentos técnicos questionáveis. Ocorre que a Secretaria pediu ao Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea), órgão ligado à Aeronáutica, um parecer sobre a viabilidade de construção de um aeroporto em Caieiras. Como tal obra demandaria uma reformulação dos fluxos aéreos de São Paulo, o Decea emitiu à SAC um parecer contrário ao projeto. “O projeto ainda está em análise pela SAC, mas deverá ser negado justamente com essa desculpa de problemas no espaço aéreo”, afirmou ao site de VEJA um técnico da secretaria que pediu para não ser identificado. O grande questionamento é que, segundo técnicos ouvidos pelo site de VEJA, as mudanças de fluxo representariam um trabalho sem nada de extraordinário ao Decea.

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