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‘Boom’ africano atrai Brasil, mas oportunidades são poucas

Estabilidade e crescimento do PIB abrem oportunidades a empresas. Mas falta de complementaridade econômica e concorrência chinesa são obstáculos

Por Benedito Sverberi
11 jul 2010, 16h03

Crescimento das exportações, melhoria das políticas macroeconômicas e recebimento de investimentos diretos têm pavimentado o progresso africano

O presidente Lula encerra neste final de semana sua 10ª viagem a África. A aproximação com países do continente, pretendida pelo governo brasileiro, faz sentido econômico, segundo analistas ouvidos por VEJA.com. A despeito de o imaginário nacional sobre o continente continuar repleto de imagens que remetem à instabilidade política, doenças, violência étnica e pobreza extrema, diversos países africanos vivem um bom momento. Dados da consultoria African Economic Outlook (AEO) revelam, por exemplo, que os países africanos cresceram, em média, 6% ao ano de 2005 a 2008 – com destaque para a porção oriental, com taxa de 8,2% ao ano. Em 2009, enquanto o mundo afundava na recessão, a economia do continente conseguiu se expandir 1,4%. Apesar do cenário positivo, as oportunidades para as empresas brasileiras na região não são variadas.

Estudo da consultoria McKinsey, intitulado “Leões em Ação”, exorta o setor privado “a não se dar o luxo de ignorar o potencial africano”. Sua população de 1 bilhão de habitantes consumiu no ano passado 860 bilhões de dólares em bens e serviços – pouco acima do que a Índia, inegável potência emergente, conseguiu com seu 1,2 bilhão de cidadãos.

Por trás desta pujança econômica, está uma combinação de fatores favoráveis. A principal é a explosão das exportações, aponta a AEO. Em 2007, o continente vendeu ao exterior 130% mais em receita do que em 2003. Diversas nações suplantaram essa taxa. Angola, por exemplo, mostrou alta de 360%, seguida por Zâmbia (289%), Sudão (259%) e Líbia (253%). Salvo Zâmbia, cuja performance foi propiciada pela comercialização de minério (cobre e cobalto), os outros três países foram impulsionados pelos embarques de petróleo. Angola e Líbia já figuram entre as quatro maiores exportadoras da região, atrás apenas da África do Sul e da Nigéria.

A valorização das commodities é fundamental para entender esse fenômeno. De 2002 a 2009, de acordo com o Banco Mundial, as maiores altas foram observadas nos preços do chumbo, de 279%; minério de ferro, 244%; e cobre, 230%. Com acréscimo de 147%, a cotação do petróleo é importantíssima para entender esse fenômeno de geração de riqueza – 22 nações têm este produto com um dos três principais de sua pauta de exportação.

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A AEO também aponta uma melhoria da condução das políticas macroeconômicas e a redução do endividamento externo. Para fechar esta equação está a forte atração de investimentos estrangeiros diretos (àqueles voltados à criação de uma estrutura produtiva). A elevação de 2003 a 2008 foi de surpreendentes 319%, para 87,6 bilhões de dólares, revelam dados da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). Seis países tiveram taxas superior a 1.500%: Guiné, com 1.529%; Djibouti, com 1.545%; Gana, 1.911%; Líbia, 2.774%; Ruanda, 3.875%; e Egito, com 3.899%.

Essas variações elevadíssimas são influenciadas por uma base de comparação reduzida, mas também porque muitos países têm muito trabalho pela frente. “É preciso fazer tudo por lá no que se refere à infra-estrutura. Empresas do mundo todo, inclusive as brasileiras, vêm na África um importante mercado potencial”, aponta o diretor de relações internacionais da FIESP, Thomaz Zannotto.

A paz é outro fator a permitir essa elevação do recebimento de recursos, ao melhorar o ambiente para investimentos e abrir caminho aos esforços de reconstrução. “Este quadro se transformou em grande parte porque politicamente a África mudou muito. Não se vê mais aquela quantidade de guerras e genocídios. Boa parte delas foi superada e hoje prevalece uma estabilidade política bem maior”, comemora o professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (IRI-USP), Pio Penna. De fato, o número de conflitos em que morriam mais de mil pessoas anualmente declinou de uma média de 4,8 nos anos 90 para 2,6 nesta década.

Apesar desses bons indicadores, a África oferece oportunidades para um número não muito grande de empresas brasileiras. Seu setor exportador é muito semelhante ao nacional, com predomínio de commodities metálicas e agrícolas, além do petróleo (setor no qual o Brasil ainda almeja ganhar musculatura com a exploração da camada pré-sal). Neste sentido, é emblemático o fato de o único grande negócio fechado durante a viagem de Lula, no valor de 400 milhões de dólares, ter envolvido justamente uma mineradora. A Vale anunciou que irá explorar uma mina de cobre na província Copperbelt, na Zâmbia.

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O desafio dos investidores nacionais é justamente encontrar complementaridade com a África. O segmento de infra-estrutura é uma evidente mina de ouro para as construtoras brasileiras, as quais já possuem ligação histórica com alguns países da região. As vendas de produtos industrializados – tanto de bens de consumo quanto de capital – seriam uma saída lógica. Contudo, há de se combinar com os … chineses.

Emergentes entre os emergentes – Na onda de marcar presença no continente africano, além dos países ricos, os emergentes intensificaram os esforços de aproximação com a região. A China lidera esse processo, com 750 mil de seus cidadãos vivendo no continente, a maior parte deles trazida pelas 800 empresas chinesas que têm negócios por lá. Além desse país, Índia, Estados Unidos e Europa têm explorado o mercado consumidor africano com seus produtos competitivos e de alto valor agregado – mercado que o Brasil tem dificuldade em conquistar.

Não é de estranhar, portanto, que, apesar do avanço de 267% das exportações para a África nos últimos sete anos, o continente seja responsável por uma fatia ainda muito pequena dos negócios brasileiros, de 5,7%, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento. Para se ter idéia, a União Européia fica com 22,2% de nossas vendas externas; a América Latina, 23,3%; e a Ásia, 25,8%. Os Estados Unidos, sozinhos, respondem por 10,3%. No ano passado, o grupo dos países africanos comprou 8,9 bilhões de dólares em mercadorias do Brasil, enquanto chineses lhes forneceram 50,5 bilhões de dólares, e a Índia, cerca de 15 bilhões de dólares.

“A China tem uma clara política de inserção na África. A Índia, embora não seja tão arrojada, também está presente, principalmente na porção voltada ao Oceano Índico. Mesmo Europa e Estados Unidos estão retomando os negócios com os africanos. O Brasil age corretamente em também querer marcar presença”, afirmou Penna.

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Repletos de vontade de fazer bons negócios os empresários brasileiros estão. A necessidade de ‘marcar presença’ é evidente. Entretanto, a concorrência será grande e vai requerer muito mais que afagos e apertos de mão. Serão necessários insistência, planejamento e pragmatismo.

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