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Falta transparência na divulgação de números sobre desigualdade no Brasil

Palácio do Planalto prometeu, mas não enviou os dados ao economista francês Thomas Piketty, um dos maiores especialistas no tema e autor do livro 'O Capital no Século XXI', que será lançado no Brasil em novembro

Por Ana Clara Costa
16 set 2014, 17h25

Os dados históricos e atuais das declarações de Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) da população brasileira são necessários para que se apure com precisão a distribuição de renda no país. Contudo, o governo se nega a divulgá-los. O economista francês Thomas Piketty, célebre autor do livro O Capital no Século XXI, que será lançado em português pela editora Intrínseca em novembro, tentou conseguir tais números para computá-los em seu livro, mas não obteve sucesso. Em maio deste ano, quando a obra se tornou um best-seller, Piketty disse, em entrevista a VEJA, que o governo brasileiro havia retomado o contato e decidira enviar os dados. Quatro meses se passaram e o economista nada recebeu. “O governo prometeu dar acesso aos dados de imposto, mas, infelizmente, nada foi entregue até agora. Como consequência, não pude incluir o Brasil em nossa base de dados. Espero que essa situação mude. Afinal, é importante dar mais transparência aos dados de desigualdade, especialmente num país onde ela é tão presente, como o Brasil”, afirmou Piketty.

Procurada pela reportagem de VEJA para esclarecer as razões do sigilo, a Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República não retornou o pedido de entrevista. Mas isso não significa que a SAE não disponha de tais números. Ao tomar conhecimento do método de Piketty, que avalia a concentração de renda e a desigualdade com base em informações tributárias enviadas pelos contribuintes à Receita, a SAE encomendou ao Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em meados de junho, uma pesquisa semelhante. Ela está pronta. Porém, engavetada. Ocorre que os dados apurados não são lá os mais animadores para o governo, pois apontam que os 5% mais endinheirados do Brasil aumentaram sua participação no bolo da distribuição de renda: ela passou de 40% em 2006 para 44% em 2012, segundo dados aos quais o site de VEJA teve acesso.

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O estudo está pronto desde agosto, mas sem previsão de divulgação. A base para a tese de Piketty sobre a desigualdade é a relação r>g , segundo a qual a renda sobre o capital (r) é sempre maior que o crescimento econômico (g). Partindo dessa fórmula simples, o francês constata que não há como escapar do aumento da desigualdade, já que a renda sobre o capital sempre crescerá num ritmo mais rápido que o crescimento econômico. Na prática, Piketty quer mostrar que aqueles que já possuem um patrimônio, seja por herança, investimentos ou bônus, tendem a enriquecer de forma mais rápida do que os que ganham sua renda por meio do trabalho.

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Um projeto de lei de autoria do deputado petista Cláudio Puty, que tramita na Câmara desde junho, tem por objetivo tornar públicos os dados consolidadeos dos contribuintes. A ideia foi dada a Puty pelo economista e ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa. Contudo, ainda não há previsão de votação, sobretudo porque sequer foi distribuído nas comissões de Finanças e Cidadania e Justiça. “A melhor maneira de avaliar o rendimento do capital é pelo Imposto de Renda. E é possível organizar isso num relatório sem indentificar ninguém”, afirma Barbosa. O economista detalha como se pode ter acesso aos dados e, mesmo assim, manter o sigilo fiscal. “Cada 1% no levantamento deve corresponder ao consolidado de 260 mil pessoas. Nós não sabemos a distribuição da renda do capital e da riqueza no Brasil. E é uma pena porque essa informação existe e está no IR”, diz.

Transparência zero – O estudo do Ipea não é o único engavetado pelo governo recentemente. O Ministério da Educação também havia concluído o levantamento do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) no início do mês, e só o divulgou depois que o jornal O Globo questionou a demora. O Ideb mostrou que, nos resultados gerais, o Brasil não havia atingido suas metas de avanço na Educação Fundamental.

Outro problema institucional se deu no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no levantamento da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. Destinada a substituir a Pesquisa Mensal de Emprego (PME), a Pnad Contínua foi suspensa quando apurou uma taxa de desemprego superior à que era mostrada pela PME. Mais precisa, a Pnad coleta dados em mais de mil municípios. Já a PME avalia apenas seis regiões metropolitanas. À época, a suspensão da pesquisa criou uma crise institucional no Instituto, que culminou na ameaça de debandada de seus técnicos, que acusavam o governo de ingerência. À crise se seguiu a uma greve terminada apenas em agosto. Resultado: desde abril o país não conhece sua taxa de desemprego.

(Com reportagem de Luís Lima)

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