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Com menos assentos disponíveis, passagem barata está mais difícil

Enquanto a Fipe detecta alta acelerada das tarifas neste ano, Anac diz que os preços estão em queda; consumidor nota, na prática, que é árdua a tarefa de achar um bilhete promocional

Por Talita Fernandes
9 dez 2012, 16h36

Custos dispararam nos últimos dois anos graças a uma combinação de aumento nos preços dos combustíveis, do dólar e das tarifas aeroportuárias. Redução da oferta e negociação com governo são as saídas que as aéreas encontraram para conter a elevação dos custos.

TAM e Gol – as duas gigantes da aviação brasileira, com, respectivamente, 41,1% e 33,9% de participação no mercado doméstico – já deram o recado: o consumidor que não comprar passagens com antecedência pagará mais caro. Com cada vez menos assentos disponíveis e redução das promoções, as companhias do setor estão com as margens apertadas e buscam saídas para recuperar a rentabilidade. Ao longo de 2012, os balanços dessas empresas e as declarações de seus executivos mostram que a tarefa não tem sido fácil.

De acordo com o diretor-presidente da Gol Linha Aéreas, Paulo Kakinoff, 2009 foi o último ano em que a empresa viu boas margens de lucro. “O ano de 2012 traz o cenário mais adverso enfrentado pelo setor até agora”, lamenta. O executivo explica que o forte aumento do preço do querosene de aviação – que corresponde a 43% dos custos de operação de uma aeronave – foi um dos principais fatores que provocaram essa reversão de cenário. De fato, relatório elaborado pela Tendências Consultoria aponta que o querosene de aviação, conhecido como QAV, deve encerrar o ano com um reajuste de 18,1%. Para 2013, no entanto, este preço deve apresentar alta bem menor, de 1,8%.

Dólar mais caro – Além da pressão exercida pelo combustível, o setor foi bastante impactado nos últimos meses pela valorização do dólar, que começou o ano cotado próximo a 1,90 real e deve fechar 2012 em torno de 2,10 reais. As companhias aéreas têm vários de seus custos fixados na moeda americana, principalmente aqueles relacionados à manutenção e aluguel de aeronaves (tecnicamente conhecido como leasing). De acordo com Cláudia Sender, vice-presidente da unidade de negócios domésticos da TAM, cerca de 60% dos custos da empresa são dolarizados. A Gol revela patamar semelhante: perto de 55% de seus custos entre janeiro e setembro foram em dólar.

A proximidade da alta temporada e o recente anúncio feito pela Gol do encerramento das atividades da WebJet deixaram o consumidor ainda mais atento com o peso desses elementos nos valores que terão de desembolsar para viajarem de avião. O Índice de Preços ao Consumidor (IPC) mostrou que as passagens aéreas foram o item que mais pesou no índice em novembro – com alta de 10,87% ante um queda de 2,19% em outubro. As empresas do ramo, entretanto, negam que estejam reajustando. Segundo elas, o aumento dos preços é reflexo da sazonalidade do período – termo técnico que se refere à alta temporada e à tendência de as tarifas ficarem naturalmente mais caras nesta época.

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Para o coordenador do IPC, Rafael Costa Lima, o aumento ocorrido em novembro não está muito longe do verificado em 2011. “Aparentemente não teve uma grande diferença, até o momento, em relação ao ano passado. A aceleração dos preços é que está sendo mais rápida. Normalmente ela é mais gradual e neste ano ficou mais concentrada no finalzinho de novembro”, explica.

Visões diferentes – Danielle Crema, superintendente de regulação econômica e acompanhamento de mercado da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), comenta que os resultados do IPC podem implicar um problema de compreensão por não considerar a sazonalidade. Ela diz que a agência reguladora se vale de outra metodologia e de uma base de dados mais ampla. Com base nessas estatísticas, o órgão vê o contrário do IPC: uma queda no preço médio das passagens. “Esses indicadores não consideram a sazonalidade e o perfil do cliente. Às vezes, as informações não são captadas adequadamente. Não quer dizer que é um erro, mas nossa base de dados é maior”, justifica.

Para a especialista, as companhias aéreas não têm conseguido repassar seus aumentos de custos para as passagens. “Se você eleva o preço da passagem, as pessoas deixam de voar. Com isso, as empresas não conseguem impor um aumento”, explica.

O ‘x’ da questão – Representantes das empresas afirmam que o consumidor nota, na prática, que as passagens estão mais caras devido à estratégia que TAM e Gol adotaram neste ano para baixar custos: a diminuição de oferta de voos, principalmente nos locais onde o custo de operação é mais alto.

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As empresas explicam que, de acordo com o modelo de liberdade tarifária adotado em 2002, os preços das passagens são formados levando em consideração dois fatores principais: antecedência da compra em relação à data da viagem e a lotação do voo. Nessa lógica, quanto antes a passagem for comprada, mais barata ela fica. O fator ocupação tem o mesmo sentido, isto é, quanto mais vazio está o avião, mais baratos os bilhetes para aquele voo. Seguindo essa fórmula, menos oferta significa, consequentemente, aviões que enchem mais rapidamente – e maior dificuldade para encontrar os valores promocionais. O consumidor, por sua vez, tem de se planejar com antecedência ainda maior para não pagar valores absurdos.

De acordo com Cláudia Sender, da TAM, a compra antecipada das passagens representa um amadurecimento do mercado brasileiro. “Hoje está mais caro porque a oferta disponível é muito menor. A média de preços pagos não é muito maior do que no ano passado. Esse é um comportamento de indústrias mais maduras. O brasileiro vem amadurecendo em consumo de passagens aéreas”, argumenta. “Eles estão aprendendo a comprar passagens para pagar menos”. A Gol segue a mesma linha da TAM e recomenda que o usuário se planeje com maior antecedência para evitar custos mais altos.

Outras tarifas – Outro fator apontado pelas duas empresas é o aumento das tarifas aeroportuárias – tributos cobrados das aéreas por usar as instalações dos aeroportos, entre outros – e a criação de uma nova tarifa, a de conexão. Elas alertam que esse último fator deverá anular o efeito positivo da desoneração da folha de pagamento para o segmento – anunciada neste ano pelo governo federal, em meio às medidas de estímulo à economia, e que passará a vigorar em 2013.

“O aumento das tarifas terá um impacto de mais de 100 milhões de reais só para TAM. A desoneração da folha será totalmente compensada por esse reajuste”, explica Cláudia. Para a Gol, a desoneração da folha teria impacto positivo de 100 milhões de reais no ano que vem, mas este benefício será todo ‘comido’ e ainda haverá prejuízo porque a alta tarifária trará um impacto negativo de 150 milhões de reais.

Além desses custos, as empresas explicam que a operação no país é encarecida pelo Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que varia de estado para estado. Graças a ele, por exemplo, os custos com combustível ficam até 20% mais caros no Brasil.

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Nordeste x Buenos Aires – Executivos das aéreas explicam que a cobrança do ICMS explica por que um voo entre São Paulo e Recife é muito mais caro que o que interliga São Paulo e Buenos Aires, a despeito das distâncias serem semelhantes. Nos voos para fora do país, a empresa não é taxada com o ICMS, pois a tributação dá-se no destino. Nos vôos domésticos, por sua vez, os custos variam pelo fato de o preço do combustível ser diferente em cada localidade onde se aterrisa – tendo em vista que os estados brasileiros possuem alíquotas muito distintas para o tributo.

Kakinoff explica que, enquanto o querosene de aviação tem custo unitário de 0,90 centavos de dólar (aproximadamente 2 reais) na Argentina, esse valor em Guarulhos (SP), por exemplo, salta para 2,66 reais. O maior aeroporto do país é também o que tem o maior custo de abastecimento. Somando-se os valores dos impostos, a Gol estima que um voo no Brasil é 38% mais caro do que no país vizinho.

De acordo com o presidente da Asssociação Brasileira de Empresas Aéreas (Abear), Eduardo Sanovicz, apesar de margens cada vez mais apertadas, as empresas não conseguem fazer grandes aumentos nas passagens. A explicação está na reação do mercado consumidor. “Se a gente subir o preço em 1%, a demanda cai na ordem de 1,4%”, explica.

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Otimização – “Vivemos uma situação em que é preciso otimizar a receita. Aumentar a utilização do capital, colocar mais passageiros dentro das aeronaves e assim mexer na estratégia de preço”, comenta a executiva da TAM. A empresa explica que quer se aproximar das taxas de ocupação de outros países, que giram em torno de 80%, enquanto no Brasil a média é de 70%. “O nosso planejamento é de redução de capacidade de 7% em 2013, trabalhando para ganhos de produtividade. Queremos aumentar a taxa de ocupação e melhorar a utilização de ativos. Este ano a gente deve ter redução entre 1% e 2% da capacidade”, explica.

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A Gol anunciou que reduziu sua capacidade de oferta em abril em 8%. O valor anualizado dessa redução será de 6% a 6,5%, contabilizando o fechamento da WebJet. Contudo, a empresa garante que não deixou de atender nenhum destino nacional, apenas reduziu a frequência de alguns voos, especialmente daqueles com custos mais altos. As regiões mais afetadas por essa redução foram Centro-Oeste, Norte e Nordeste.

Na contramão – Enquanto as líderes de mercado anunciam redução de oferta, a Avianca (que tem 5,95% de participação no mercado doméstico), a Azul (9,35%) e a Trip (4,53%) falam em ampliação.

As companhias Azul e Trip, que anunciaram fusão em maio, divulgaram por meio de assessoria de imprensa que “não vão diminuir as ofertas e planejam ainda incluir novos destinos e voos à malha aérea – sempre de forma sustentável”.

De acordo com o presidente da Avianca no Brasil, José Efromovich, a empresa encerrará 2012 com um aumento de 90% da oferta na comparação com o ano anterior. Segundo o executivo, este crescimento se deve à substituição por novas aeronaves que oferecem mais poltronas. Ele reconhece, porém, o impacto do aumento do combustível para o negócio. “Impactou a Avianca e impactaria qualquer empresa que esteja voando no Brasil. O combustível representa um pouco mais de 40% dos nossos custos”, explica.

Efromovich acrescenta que não fosse o aumento, a Avianca passaria do prejuízo dos últimos anos para lucro já neste ano. A empresa vem sofrendo prejuízos desde 2008, ano em que deu início à reestruturação que consiste na substituição das aeronaves. “Nós estamos tendo prejuízo, mas ele vem diminuindo a cada ano e esperamos acabar neste ano de forma estável”, disse. Ele explica que um dos fatores que contribuem para a perspectiva positiva é que a empresa opera com uma taxa de ocupação mais alta que a do mercado doméstico como um todo, em torno de 80%.

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O fator governo – Além da tentativa de melhora de receita através de otimização de recursos e redução da oferta, as aéreas estão aumentando o diálogo com o governo para tentar ajustar os fatores que mais pesam em seu orçamento: impostos, tarifas aeroportuárias e combustíveis.

A valorização do dólar, por exemplo, tem sido defendida pela equipe econômica do governo. Embora continue a afirmar que o regime cambial no país é flutuante, todos sabem que o Planalto tem tomado medidas para manter o real desvalorizado – na esperança de que isso possa ajudar a indústria a exportar mais e a contar as importações. Ao permitir que a moeda americana deixe o patamar de 1,90 real e atinja 2,10 reais, a variação afeta diretamente os negócios das aéreas.

O encarecimento do combustível também tem a influência direta do governo, via Petrobras. É que para tentar compensar perdas com os preços de combustíveis comuns (gasolina e diesel), a estatal reajusta pesadamente outros de seus produtos, como é o caso do querosene de aviação.

A estatal amargou prejuízo de mais de 1 bilhão de reais neste ano devido à estabilização forçada do preço de gasolina. É que a empresa é proibida pelo governo federal de efetuar os reajustes que bem entender porque isso teria efeito direto sobre a inflação. Por outro lado, a estatal – que nunca foi inteiramente autosuficiente – tem de trazer do exterior petróleo e gasolina mais caros. Com a paralisação da expansão da capacidade de refino no país e a explosão das vendas de veículos, a Petrobras passou a importar cada vez mais combustível importado e caro para abastecer o mercado interno – e os prejuízos com o subsídio que lhe é imposto saltaram a ponto de levá-la ao prejuízo. O debate sobre o reajuste da gasolina transformou-se, nos bastidores de Brasília, numa queda de braço entre o Ministério da Fazenda, que reluta em autorizá-lo, e a presidente da estatal, Graça Foster, que, apesar de negar o conflito com o governo, defende abertamente a necessidade de novos aumentos.

Para reforçar essa negociação, em julho deste ano, as empresas aéreas criaram uma associação, a Abear, que se tornou responsável pelo diálogo com o governo. “Não há um só dia que a Abear não tenha agenda com alguma esfera do poder concedente”, explica Kakinoff. O executivo explica que as empresas estão pleiteando a diminuição do custo do combustível, discutindo as tarifas aeroporturárias – se elas serão convertidas em melhoria em infraestrutura – e na mudança do ICMS, o que, inclusive, já está na pauta atual do governo.

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