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Com crise à espreita, bancos pequenos e médios requerem atenção

Captação de instituições pode ser afetada pelo arrefecimento do crédito no mercado interno e externo

Por Ana Clara Costa
14 ago 2011, 16h19

Sempre que há sinais de crise, a banda mais fraca da indústria financeira fica em alerta. No caso do setor bancário, as instituições de pequeno e médio porte representam esse lado. São elas que estão mais vulneráveis a movimentos típicos de tempos turbulentos, como acréscimos nos custos de captação internacional, a redução das linhas de crédito e a uma eventual elevação da inadimplência. Nos últimos dias, com a sucessão de sinais de proximidade de uma nova crise, as bolsas de valores assistiram à queda expressiva das ações dos maiores bancos mundiais. Tal desvalorização evidencia a preocupação dos investidores em relação à robustez de instituições com carteiras carregadas de títulos de dívida de países europeus. Essa dinâmica, à primeira vista, parece distante do Brasil, cujos bancos nada têm a ver com os malfadados papéis gregos, italianos ou espanhóis. Indiretamente, contudo, essa relação existe e pode afetar, sobretudo, os pequenos e médios bancos.

Em 2008 e 2009, apesar de o Brasil não ter qualquer relação com os títulos subprime – derivados de empréstimos imobiliários de alto risco nos Estados Unidos – que levaram o mundo quase ao colapso, instituições financeiras menores sofreram com a falta de liquidez. Bancos americanos e europeus – temerosos de ficar sem recursos para cobrir perdas e sem conseguir distinguir quais clientes não se converteriam em caloteiros – praticamente pararam de conceder crédito. Pequenos bancos em apuros tiveram então de buscar recursos junto ao Fundo Garantidor de Créditos (FGC) para não terem de ser comprados na “bacia das almas” por concorrentes.

Atualmente, com todo este stress nos mercados, as atenções voltam-se novamente aos pequenos e médios. Apesar de os custos de captação dos bancos ainda não terem aumentado, há sinais de dificuldades à frente. Títulos internacionais de bancos como Cruzeiro do Sul e BicBanco têm registrado as maiores quedas entre os papéis de instituições financeiras brasileiras. O movimento de venda se justifica pelo temor de que haja aperto nos mercados de crédito daqui para frente. Já os juros dos títulos em dólar do BicBanco com vencimento para 2013 avançaram 0,99 ponto porcentual em apenas um dia, enquanto as taxas para papéis semelhantes do Cruzeiro do Sul subiram 0,96 ponto porcentual, de acordo com dados da Bloomberg. Isso significa que tais instituições terão de pagar juros maiores para que os investidores mantenham seus títulos.

A dinâmica dos bancos menores – A percepção de maior risco dos pequenos e médios guarda relação direta com sua forma de atuar e captar recursos. Esses agentes estão presentes, sobretudo, no mercado de atacado, oferecendo crédito a empresas, empréstimos consignados e financiamento de veículos, por exemplo. Não possuem carteira de clientes pessoa física ou atuam no chama varejo financeiro, como o Bradesco e o Branco do Brasil, que contam com milhões de correntistas. Essas instituiçõesmenores geralmente não recebem depósitos ou poupança, que são formas consagradas e baratas de captar recursos. Para conseguirem o dinheiro que lhes permite oferecer crédito, tais bancos devem lançar mão de ferramentas diversas, como a emissão de títulos no exterior, a venda de carteiras e os depósitos com garantias especiais (DPGEs).

Para buscar recursos no mercado internacional, os bancos lançam papéis de sua dívida com vencimento no longo prazo, remunerando o investidor com o pagamento de juros. Já a venda de carteiras – operação bastante popular antes do escândalo do Banco Panamericano, que pertencia ao empresário Sílvio Santos – é uma forma de conseguir recursos por meio da venda de suas operações de crédito a grandes bancos, que desejam expandir seus ativos. Funciona assim. Um banco que deseja ter antecipadamente o valor de vencimento de um conjunto de empréstimos vende a outro o direito de recebimento. Contudo, a instituição não embolsa o valor integral. O banco comprador só adquire a carteira mediante a aplicação de um desconto – vem daí o lucro da instituição que ficou com o ativo. Já os DPGEs são certificados de depósito a prazo que têm garantia do Fundo Garantidor de Créditos (FGC) e que foram criados para viabilizar a captação dos bancos de menor porte após a crise de 2008 – período em que as instituições amargaram com a falta de liquidez nos mercados nacional e internacional.

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Perspectivas ruins – O temor hoje é que, à semelhança de 2008, as fontes de financiamento das instituições voltem a secar. Com os investidores em busca de liquidez, há o risco de que os bancos novamente enfrentem dificuldades para captar. No caso dos grandes, apenas 10% da captação é feita no exterior, o que significa que o impacto de um arrefecimento no crédito internacional não seria tão forte a ponto de abalar as estruturas. Já com os pequenos é diferente. “Os bancos grandes se financiam com base nos depósitos de seus próprios clientes. Os pequenos quase não têm agências e dependem mais do mercado externo”, diz o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Armando Castelar. Além do Cruzeiro do Sul e do Bic, o banco ABC também tem utilizado constantemente a captação internacional para suas operações.

A cessão de carteiras de crédito também tem perdido vigor – ainda mais após o rombo do Panamericano, que surgiu justamente de fraudes na contabilização dessas operações.

O cenário macroeconômico também interfere. Com as medidas macroprudenciais tomadas pelo governo para tentar frear o avanço da inflação, o consumo é lentamente afetado – e, em consequência, a tomada de empréstimos e financiamentos. A espiral de desaceleração do crédito que já começa a ser notada na economia brasileira afeta não só os pequenos, mas também os grandes bancos. Por último, a captação por meio de DPGEs – tão popular entre os bancos menores – terá de ser reduzida em 20% ao ano, podendo afetar aqueles que não estiverem preparados para a redução dessa fonte de captação.

Regulação mais rígida – Apesar dos desafios enfrentados pelo setor, especialistas acreditam que as instituições pequenas e médias estão mais preparadas hoje para uma possível crise do que estavam em 2008. Na avaliação de Alexandre Albuquerque, analista da Moody’s, determinadas medidas macroprudenciais anunciadas pelo governo no início do ano fizeram com que elas tivessem de diminuir a alavancagem. O destaque cabe à determinação, anunciada em fevereiro, de reduzir os prazos das operações com crédito consignado e financiamento de veículos. “Com isso, a geração de crédito caiu e os bancos tiveram de adotar posturas mais conservadoras. Se estivessem operando de maneira mais arrojada, poderia ser pior”, afirma Albuquerque.

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Para atribuir mais transparência a esse mercado e evitar problemas como o do Panamericano, o Conselho Monetário Nacional (CMN) determinou, em julho, que todas as operações de cessão de crédito entre bancos passassem a ser registradas em uma central autorizada pelo Banco Central. A medida, que entrará em vigor em 22 de agosto, valerá inicialmente para a compra e venda de carteiras referentes a crédito com desconto em folha e para compra de veículos.

O BC, por sua vez, tem atuado de maneira mais intensa junto às instituições menores. Segundo apurou o site de VEJA, a autoridade não reconhece internamente que tenha havido qualquer falha na fiscalização dos bancos menores, como o Panamericano, mas, por via das dúvidas, grupos de especialistas têm passado um pente fino no setor.

Exemplo disso é a intervenção feita pelo BC no banco carioca Morada, em abril. A instituição, que possuía apenas uma agência, estava aquém do limite mínimo de liquidez exigido pela autoridade, que é de 11% de capital próprio sobre a quantidade total de empréstimos concedidos. Após a intervenção, o BC está redigindo um relatório para apurar se houve fraude nas operações. “O banco tinha de se capitalizar e, como não conseguiu se enquadrar, sofreu intervenção. Mas esse é um ponto fora da curva”, afirma o economista Jayme Alves, da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).

Já o banco Schahin, que foi comprado pelo BMG na mesma época, também sofria com dificuldades de captação. A operação foi monitorada pelo BC e fechada em 230 milhões de reais. Neste caso, a intervenção da autoridade não se mostrou necessária, pois os problemas foram atribuídos à má administração, segundo dizem fontes do mercado. Outras negociações recentes entre bancos pequenos foram as aquisições do banco Matone pela JBS e a da Sul Financeira pelo BicBanco.

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