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Por dentro do instituto americano que está criando as cidades inteligentes do futuro

De carros públicos a apartamentos mutantes, o Instituto de Tecnologia de Massachusetts está criando projetos inovadores para transformar cidades tradicionais em cidades inteligentes. O site de VEJA visitou seus laboratórios e mostra as ideias que vão melhorar a vida nos centros urbanos

Por Marco Túlio Pires, de Boston
Atualizado em 6 Maio 2016, 16h52 - Publicado em 2 dez 2011, 23h01

O desafio de acomodar a maior parte da população em espaços urbanos está colocando arquitetos, urbanistas e engenheiros de volta às mesas de projeto. Eles estão reinventando a distribuição urbana, os sistemas de transporte e o que, no futuro, chamaremos de lar

Um dos fatos definidores do século XX foi a urbanização. O impacto transformador da aglomeração de pessoas em cidades, nos últimos 100 anos, pode ser comparado à revolução no modo de vida dos seres humanos causada pela invenção da agricultura, 10.000 anos atrás. No século passado, o número de habitantes em cidades cresceu 10 vezes, de 250 milhões pessoas para 2,8 bilhões. Um relatório divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU) mostrou que, em 2008, pela primeira vez na história, a maior parte da humanidade passou a viver no meio urbano. A mudança deve se aprofundar nos próximos anos. A ONU espera que em 2050 a população mundial alcance nove bilhões de pessoas, das quais seis bilhões estarão nas cidades.

Tamanha transformação traz desafios igualmente grandiosos: como acomodar bilhões de pessoas em cidades? Arquitetos, urbanistas e engenheiros estão reinventando desde a malha urbana e os sistemas de transporte até o que hoje chamamos de lar. Um dos pilares dessa reinvenção é o uso da nuvem computacional. A computação em nuvem é como se convencionou chamar o armazenamento de dados e aplicativos que podem ser acessados a partir de qualquer lugar ou aparelho com conexão à internet. As implicações são várias. Aparelhos como eletrodomésticos ou automóveis estarão conectados à internet, recebendo e enviando informações em tempo real. São recursos para converter cidades comuns em cidades mais inteligentes, ou smart cities.

Esses modelos de cidade estão deixando a prancheta dos estudiosos e virando realidade. A reportagem do site de VEJA visitou laboratórios do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), um dos mais importantes centros de pesquisa e inovação do mundo, para descobrir o que os maiores especialistas da área estão desenvolvendo para o futuro das cidades. São soluções voltadas para promover melhorias no trânsito, nas moradias, e na coleta de informações úteis para a tomada de decisões pelas autoridades ou pelos próprios moradores.

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O fim dos congestionamentos – Cidades inteligentes não param. Por essa razão, o planejamento de trânsito é uma das principais preocupações do Media Lab, um dos maiores laboratórios do MIT. Congestionamentos causam prejuízos gigantescos em cidades como São Paulo, que desperdiça bilhões de reais em tempo e produtividade perdidos, além de reduzir a qualidade de vida das pessoas que podem passar mais de 10% de seu dia parados no trânsito. “Um dos nossos objetivos é criar cidades transitáveis”, afirma Kent Larson, diretor do grupo Changing Places, o braço de arquitetura e planejamento do Media Lab.

O grupo quer retomar o mesmo espírito de cidades como Paris. “Ela começou com uma estrutura de vila, que era o centro da cidade, e, à medida que evoluiu, outras vilas foram criadas em volta em uma estrutura de bairros”, explica Larson. Cada vizinhança possui uma prefeitura, parques, shoppings e serviços. “A maioria das pessoas anda e existe um sistema de bicicletas compartilhadas que conecta tudo”, disse. “É uma noção que surgiu antes dos veículos motorizados e precisamos retomá-la para as novas cidades”. As alterações no modo como as vizinhanças se organizam visam a criar pequenos centros urbanos nos quais é possível realizar qualquer tarefa sem a necessidade de utilizar o carro ou o transporte público.

Larson afirma que as alterações podem ser feitas em ruas de pequeno e médio porte, cada uma com sua função. Em Melbourne, Austrália, por exemplo, as pessoas estão transformando becos, antes inutilizados, em espaços sociais maduros com lojas e passeios. Para as ruas médias, Larson acredita em parques que acompanham as avenidas, como na cidade de Boulder, no estado de Nevada, nos EUA, e em alguns lugares da Coreia do Sul. “É possível fazer a revitalização de uma estrada que foi construída ao longo de um rio e transformar o espaço interno, às margens do leito, para que os pedestres andem por toda a avenida sem interagir com os veículos, que passam por cima”, disse o arquiteto. “Dependendo da rua, você sai do centro da cidade e vai até a periferia sem ter contato com o trânsito”.

Carro público – Nas cidades inteligentes, os carros deixam de ser um problema e se tornam parte da solução para o trânsito. Uma das maiores apostas do MIT para a próxima geração de transporte pessoal é o CityCar. Trata-se de uma versão hi-tech que lembra o Dock Dock, um pequeno carro elétrico para uma pessoa, invenção do arquiteto brasileiro Jaime Lerner, lançado em 2010. Concebido em 2003 no Media Lab, o CityCar pesa menos de 450 quilos, é elétrico e dobrável: três CityCars têm o comprimento de um carro convencional. Um consórcio espanhol chamado Hiriko vai comercializar frotas do pequeno carro a partir de 2012.

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O objetivo do CityCar não é oferecer mais uma opção de carro popular para o consumidor. A ideia é que as pessoas mudem a visão que têm dos automóveis e eles deixem de ser objetos de desejo e passem a ser encarados como um bem público. “Vamos aproveitar o modelo já existente de compartilhamento de bicicletas em várias cidades do mundo, como Washington e Paris, e aplicar isso aos carros”, diz Larson. “Se as pessoas precisarem se locomover em distâncias maiores do que teriam a pé ou de bicicleta, a solução seria alugar um CityCar, assim como se alugam bicicletas”.

“É mais barato do que manter um carro convencional e, além disso, com automóveis compartilhados é possível servir cinco vezes a população com apenas um veículo”, afirma Larson. “Os carros passam a maior parte do tempo parados na garagem. Compartilhados, seria possível usá-los até 10 horas por dia, aumentando em cinco vezes sua utilidade”. Segundo os cálculos do especialista, seria preciso apenas um quinto de veículos nas ruas para servir a mesma população. Isso significaria menos engarrafamentos e menos poluição. É como se a frota de veículos de São Paulo fosse substituída pela de Belo Horizonte.

Veja o vídeo de apresentação do CityCar:

O modelo do veículo compartilhado já vem sendo experimentado em algumas partes do mundo com carros convencionais. Nos Estados Unidos, Canadá e Europa, a empresa Chrysler possui um sistema de carros elétricos compartilhados chamado Car2Go. Em Paris existe o AutoLib’, uma versão automotiva do sistema de compartilhamento de bicicletas. Com o ZipCar, em Boston, também nos Estados Unidos, o usuário paga uma anuidade de 50 dólares e depois 7,50 para cada hora que utilizar o carro. O CityCar seria um passo adiante, ocupando menos espaço e reduzindo ainda mais o preço para o usuário final.

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Cidade na nuvem – Uma cidade inteligente necessariamente estará conectada à internet, na opinião do arquiteto italiano Carlo Ratti, diretor do grupo SENSEable City, do MIT, que estuda formas de medir em tempo real vários eventos da cidade, da poluição ao trânsito. Para Ratti, o que está acontecendo com as cidades é semelhante ao que aconteceu aos carros de Fórmula 1 há 20 anos. Até àquela época, o sucesso no circuito era devido à mecânica do carro e ao piloto. Nesse período surgiu a tecnologia de telemetria. “O carro se transformou em um computado. Podia ser monitorado em tempo real por milhares de sensores e tornou-se inteligente, mais capaz de responder às condições da corrida”, afirma.

O mesmo estaria acontecendo com as cidades. As tecnologias digitais começaram a tomar conta do espaço urbano, formando a espinha dorsal de uma infraestrutura maior e mais inteligente.

Um programa criado pelo engenheiro cingapuriano Emmanouil Koukoumidis mostra o potencial dessa estrutura digital. Originário da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, o engenheiro visitou o MIT durante o doutorado e lançou, em agosto deste ano, o SignalGuru: um software de celular que tira fotos dos sinais de trânsito e consegue dizer ao motorista em que velocidade ele deve manter o carro para não ter que esperar parado na luz vermelha. (Continue a leitura da matéria)

“Quando reduzimos a necessidade de parar o carro e depois acelerá-lo quando o sinal se abre, permitimos que sistema economize gasolina”, diz Koukoumidis. “Em testes conduzidos nos arredores do MIT, o programa ajudou a reduzir o consumo de combustível em 20%.”

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O sistema poderá ser ampliado para captar todo tipo de informação útil aos motoristas: preços de combustível em postos de gasolina, disponibilidade de vagas nas principais avenidas da cidade e informações sobre engarrafamentos. “Como o aplicativo acessa a internet, as informações captadas anonimamente por um único motorista servem para formar um banco de dados capaz de ajudar todos os outros usuários”, diz o engenheiro.

Outro exemplo de como dispositivos conectados podem tornar as cidades mais inteligentes pode ser visto em Estocolmo, na Suécia. Câmeras de trânsito automaticamente identificam as placas de carros que entram na área central da cidade e cobram 60 kronor (16 reais) por dia, dependendo de onde os carros vão. O sistema, que utiliza a estrutura digital de comunicação entre o órgão de trânsito e os bancos, reduziu o tempo de espera para veículos atravessando o centro da cidade em 50% e reduziu as emissões de poluentes em 15%. “Isso é apenas a ponta do iceberg”, acredita Ratti..

Um lar diferente – Os apartamentos e casas das cidades do futuro também serão inteligentes. Um dos projetos apresentados no Media Lab é o de um apartamento de apenas um cômodo. Nele, o quarto é automaticamente transformado em cozinha, revelando uma bancada, pia e mesa. Ao toque de botões a cozinha se transforma em academia, para o exercício matinal. O apartamento reconhece quando o morador sai e desliga tudo que não é utilizado.

Veja o vídeo de apresentação da CityHome:

De acordo com o grupo Changing Places, o braço de arquitetura do Media Lab, o novo lar também irá além do carro de Fórmula-1 citado por Ratti. Os arquitetos e engenheiros do MIT construíram um sistema que é instalado nos alicerces do apartamento com centenas de sensores. Todos os movimentos são monitorados. “O sistema sabe quando abrimos uma porta, ligamos a televisão, usamos a água ou abrimos a geladeira”, explica Larson. As atividades são monitoradas a cada oito segundos.

Tudo que não está sendo utilizado ativamente, o sistema desliga da fonte de energia. Em um experimento, um casal viveu por dois meses no apartamento inteligente. O sistema de sensores conseguiu reduzir em 42% o consumo de energia. E o casal não notou a diferença. “A experiência mostra que a redução significativa no consumo de energia e uma vida mais sustentável se apoiam em sistemas que respondem ao comportamento humano e em seguida provocam mudanças nesse comportamento”, diz Larson.

O Changing Places também construiu uma solução de moradia à maneira do CityCar, chamada CityHome. São pequenos apartamentos de apenas um cômodo montados a partir de paredes móveis e inteligentes. Ao toque de alguns botões, uma sala de jantar pode se transformar em dois quartos. O escritório é modificado para um estúdio de dança. “É uma forma de aproveitar um espaço como se ele fosse duas vezes maior, pela metade do preço”, explica Larson. O especialista disse que um modelo em escala real estará pronto até o fim do ano.

Confira as principais ideias do MIT para o futuro das cidades:

Arte VEJA

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