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Novo cometa pode ser o mais brilhante já registrado

Em setembro, astrônomos russos descobriram o ISON, que deve ser avistado a olho nu da Terra no final do ano que vem e poderá brilhar mais do que a Lua. Entenda o que pode acontecer até a sua visita

Por Ricardo Carvalho
Atualizado em 6 Maio 2016, 16h26 - Publicado em 8 out 2012, 09h27

Neste exato momento, a um bilhão de quilômetros, mais ou menos entre as órbitas de Saturno e de Júpiter, um cometa segue a toda velocidade em direção ao Sol. Quando passar próximo à Terra, no final do ano que vem, seu brilho será o mais intenso já registrado no céu em toda a história, superando o da Lua Cheia. A oportunidade é única: quando seguir seu caminho, o ISON, como foi batizado, não voltará tão cedo.

O cometa foi descoberto no último dia 21 de setembro, quando uma dupla de astrônomos amadores do International Scientific Optical Network (ISON), observatório da Rússia, avistou algo novo na constelação de Câncer. Mal identificaram o pontinho luminoso, Artyom Novichonok e Vitaly Nevski publicaram as coordenadas aproximadas no site da União Astronômica Internacional (IAU, na sigla em inglês). Nas horas seguintes, outras praças ao redor do mundo começaram a acompanhar imediatamente a aproximação do objeto, reconhecido oficialmente pela IAU como um cometa – e nomeado de C/2012 S1 (ISON), em homenagem ao centro russo – três dias depois.

Mas por que o ISON é razão para tamanho entusiasmo entre os amantes da astronomia? A resposta é simples, segundo o astrofísico Gustavo Rojas, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar): o ISON pode brilhar, e brilhar muito. “Os astrônomos utilizam uma escala de magnitudes para indicar o brilho dos objetos celestes. Nessa escala, quanto menor o número, maior o brilho. E se o ISON sobreviver, algumas projeções indicam que a magnitude será de -13. Na escala, números negativos indicam corpos muito brilhantes”, afirma.

Não é pouca coisa, visto que a Lua Cheia tem magnitude -12,7 e Vênus, o planeta mais brilhante do sistema Solar, -4,8. Ou seja, pode ser que esse cometa passe pela Terra e produza um efeito comparável – se não superior – ao do Ikeya-Seki, que teve magnitude -10 (veja lista com os mais brilhantes cometas dos últimos 50 anos).

Como um gato – Os parágrafos acima se referem às mais otimistas expectativas que circulam pelos sites de aficionados por astronomia. Por outro lado, sob a máxima cunhada por David Levy, um famoso observador espacial canadense, segundo o qual essas imensas rochas que cruzam o sistema solar são iguais a gatos (“cometas têm cauda, e fazem qualquer coisa que quiserem”), há astrofísicos que preferem adotar um discurso mais cauteloso. Pode ser que o ISON de fato proporcione um espetáculo superior aos grandes cometas avistados no século 20. Mas também pode ser que, tal qual inúmeros outros exemplos, ele se desintegre muito antes de chegar ao Sol e nem sequer dê o ar da graça. “Qualquer estimativa agora é como tentar adivinhar quem vai ganhar a Copa de 2014. Não dá pra dizer”, diz o professor Amaury Augusto de Almeida, astrofísico do departamento de Astronomia do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP (IAG-USP).

A órbita calculada do ISON indica que ele provém da nuvem de Oort, uma espécie de redoma com trilhões de rochas a quase um ano-luz do Sol. É de lá que costumam vir os cometas de longo período, denominação dada àqueles que demoram mais de 200 anos para percorrer seu trajeto de ida e volta ao Sol.

Normalmente alguma perturbação, como um choque entre duas rochas gigantes em Oort, joga um corpo para o interior do sistema solar. Atraído pelo maior campo gravitacional existente, o Sol, ele viaja a centenas de milhares de quilômetros por hora, contorna a estrela e retoma o caminho de “casa”, podendo repetir a órbita no futuro ou simplesmente se perder pelo universo.

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Os primeiros cálculos apontam que o ISON tem um período orbital de impressionantes 1,2 milhão de anos. “Só um ancestral muito antigo do homem pode tê-lo avistado algum dia”, diz o astrofísico do IAG-USP. Os cometas de curto período, por sua vez, costumam ser originários do Cinturão de Kuiper, bem mais próximo. É o caso do popular cometa Halley, que demora “só” 76 anos para dar sua volta pelo sistema solar.

Coma e cauda – Um cometa é uma espécie de bola de neve suja. O seu interior é formado por gases congelados (gelo) e poeira cósmica e, na medida em que vai se aproximando do Sol, a radiação faz com que esses gases se vaporizem, originando duas coisas: a coma, que envolve o núcleo do cometa, e uma ou mais caudas. Quando atinge o periélio, ou aproximação máxima com a estrela, o calor faz com que o cometa alcance seu pico de atividade, podendo formar uma cauda com milhões de quilômetros de extensão. Vale lembrar que tudo isso depende de uma série de fatores, como o tamanho do núcleo, sua composição e a velocidade com que faz a volta no Sol.

Além do mais, a órbita calculada para o ISON estima que ele passará, no periélio, a “apenas” 1,4 milhão de quilômetros do astro, o que o classifica como um cometa sungrazer, ou que faz um voo rasante. Quanto mais próximo da fonte de calor, mais radiação, mais vaporização e, consequentemente, maior e mais brilhante sua cauda. Embora ainda seja muito cedo para determinar o tamanho do ISON, o fato de ele ter um período orbital extremamente longo indica que não se trata de um objeto pequeno. A cada vez que contorna o Sol, a radiação faz com que um cometa perca matéria – uma das explicações para o Halley, cuja passagem é registrada desde a Antiguidade, ser relativamente pequeno. Dessa forma, quanto menos vezes um cometa realiza sua passagem pela estrela incandescente, mais preservado é. E quanto mais matéria ele tiver para queimar, mais brilhante tende a ficar. Um dos mais importantes cometas observados no último século, o Hale-Bopp (também originário de Oort), tinha 40 quilômetros de diâmetro, o maior visto até hoje.

arte ciencia cometa ison ()

Boom Mas o que pode dar errado e nos privar do brilho do ISON? Em resumo, conforme explicam os astrofísicos ouvidos pelo site de VEJA, qualquer coisa. “Não existe nenhuma lei da matemática que indique como um cometa vai se comportar”, explica Enos Picazzio, também astrofísico do IAG-USP. Quando estiver no periélio, por exemplo, a radiação intensa pode simplesmente destruir o cometa. Como tampouco sabemos de que forma está agregada a estrutura interna da rocha – se tem bolsões de gás com monóxido de carbono, por exemplo -, o gradual aumento de temperatura durante a aproximação com o Sol pode desencadear explosões e fragmentá-la. Ainda, como já aconteceu antes, a interferência de outra força gravitacional pode fazer com que o cometa se desfaça em vários pedaços muito antes de chegar perto da Terra ou do Sol. Foi o que aconteceu em 1994, quando o Shoemaker-Levy 9 foi puxado pela gravidade de Júpiter e se rompeu em 21 pedaços, que depois colidiram com o maior planeta do nosso sistema.

Reserve a data – Caso o ISON sobreviva à aproximação com o Sol e siga sem ser incomodado o seu caminho, os astrônomos esperam que ele seja observável a olho nu por dois meses, entre novembro de 2013 e janeiro do ano seguinte. Pela trajetória calculada, o hemisfério norte terá uma vista mais privilegiada, mas o cometa também será observável do hemisfério sul. Quem tiver acesso a um telescópio amador conseguirá acompanhar a jornada do cometa já a partir de agosto de 2013.

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O ponto alto da visita do ISON tem data marcada, de acordo com Amaury Augusto de Almeida, do IAG-USP. No dia 28 de dezembro de 2013, um mês depois do periélio, ele realizará a aproximação máxima do nosso planeta: uma distância de mais ou menos 64,3 milhões de quilômetros.

Também a partir de agosto do ano que vem, quando o ISON estiver a uns 450 milhões de quilômetros do Sol, será possível ter uma melhor dimensão do quão brilhante o cometa poderá ser. A essa distância, a radiação deve começar a produzir alguma atividade de vaporização no interior do núcleo.

De volta para o passado – Além do brilho que pode exibir, um cometa como o ISON representa a oportunidade de os cientistas estudarem um material proveniente literalmente dos primórdios do sistema solar. Acredita-se que a nuvem de Oort contenha as propriedades que deram origem ao nosso sistema, há 4,6 bilhões de anos. “Um cometa é uma espécie de fóssil do sistema solar, que carrega uma matéria primitiva”, afirma o professor Enos Picazzio.

Estudar a composição desse material, seja por fotografias clicadas por sondas espaciais que orbitam a Terra ou Marte, seja nas observações por telescópio, pode permitir um contato com compostos que, de outra forma, estariam totalmente fora do nosso alcance. Para se ter uma ideia, a NASA lançou, nos anos 70, uma sonda espacial com o objetivo de ir o mais longe possível. Após mais de 30 anos de caminhada rumo ao sistema solar exterior, a Voyager é hoje o objeto enviado da Terra mais distante no espaço. Mesmo assim, o ISON vem de uma distância pelo menos 500 vezes maior. “A chegada do ISON é como se o tempo estivesse vindo em nossa direção”, concluiu o professor Picazzio.

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