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Polanski trata da hipocrisia em “O Deus da Carnificina”

Por Da Redação
8 jun 2012, 15h07

Por Luiz Zanin Oricchio

São Paulo – O plot da peça de Yasmina Reza é desenvolvido de forma brilhante. Há uma briga entre garotos, um deles é ferido pelo outro. Os pais do menino machucado vão à casa dos pais do agressor para tirar satisfação. O que se segue desse sinuoso encontro entre as quatro pessoas, na verdade, fornece uma radiografia detalhada do estado moral da nossa sociedade. A peça foi encenada em vários países, inclusive no Brasil, sob direção de Emilio de Mello, com Paulo Betti, Julia Lemmertz, Orã Figueiredo e Deborah Evelyn.

Filmado por Roman Polanski, “Carnage”, ou “O Deus da Carnificina”, refere-se ao mesmo texto de Yasmina. Os atores são da pesada: Christopher Waltz, Kate Winslet, John C. Reilly e Jodie Foster. Grande time, que produz ótimo resultado. Apesar de não disfarçar a origem teatral, Polanski evita a armadilha do teatro filmado. Usa a câmera para imprimir a sua escrita cinematográfica e nunca a deixa parada, como um olho mágico a assistir algo que se dá num palco.

Fora disso, inclui uma ou outra cena que não se observa na montagem teatral. Por exemplo, assistimos, no início, com uma tomada bastante distante, à agressão do garoto. Há depois um desfecho surpreendente, que não existe na peça. Com isso, ele não a distorce, mas acrescenta algo. Além disso, Polanski usa os movimentos de câmera para colocar pontos de vista múltiplos, coisa impossível de fazer no teatro, pelo menos usando esse recurso visual.

O que tem seduzido plateias mundo afora, e agora o filme deve fazer o mesmo, é a progressão paradoxal do encontro de casais. Existe algo de muito refinado na maneira como se encontram para discutir uma reparação à briga dos garotos, mas o que acontece é um desgaste da polidez e a queda progressiva na barbárie dos relacionamentos humanos.

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As conversas entre os quatro são constantemente interrompidas pelo celular de Alan (Christopher Waltz), advogado de uma multinacional farmacêutica acusada de vender remédio para cardíacos que produz efeitos colaterais. Sua mulher, Nancy (Kate Winslet) é uma dondoca de nariz em pé, que se acha melhor do que os outros. Penelope (Jodie Foster) é uma dona de casa vagamente interessada em arte e seu marido, Michael (John C. Reilly), parece um simplório vendedor de produtos domésticos.

Nada é tão claro ou tão linear. Visto de perto, ninguém é normal, afirma um filósofo do cotidiano brasileiro, e essas primeiras impressões vão se contradizendo, negando-se, alterando-se em contato com as outras. Pouco a pouco, vamos sendo levados para perto do coração selvagem, esse núcleo de instintos pouco civilizados, núcleo da nossa natureza.

Nem é preciso dizer que o tema de entrelinhas de “Deus da Carnificina” é a hipocrisia. Todos são capazes de pensamentos politicamente corretos, mas também se mostram dispostos a usar as armas mais baixas e letais quando se trata de defender o interesse próprio. Pode-se dizer isso das pessoas comuns, que tentam resolver um conflito entre os filhos ou entre países que começam uma guerra. Pode também ser visto como um comentário sobre a dupla moral e de como perspectivas éticas se mostram flexíveis para defender interesses. Ocupa-se para libertá-lo de uma tirania. Mandar uma pessoa para uma instituição “para o seu próprio bem”. Enfim, tanto como as emoções, o sentimento moral do homem parece ambíguo o suficiente para acomodar interesses diferentes.

Polanski trabalhou na versão de “Deus da Carnificina” para cinema durante a sua prisão domiciliar na Suíça, acusado de abuso de menor nos EUA. O curioso é que toda essa discussão ética e política pode ser colocada em termos cômicos. “Deus da Carnificina” pode ser muito engraçado, mesmo que o riso tenha como fronteira a dor de constatarmos nossa humana fragilidade. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.

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