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Os geeks vão à caça

Por Renata Megale
18 mar 2011, 23h43

Ele chega tímido, com a cara fechada, o olhar fixo no chão. Vítor* está atrasado e, a respiração acelerada, não esconde a ansiedade por aprender as fórmulas mágicas que prometem tornar a sua noite – e a sua vida – mais cheia de amor. Ele é um dos dez alunos da nova turma de Daniel Madeira, conselheiro afetivo que há quatro anos vive de encorajar geeks – eles são a maioria entre os que procuram os seus serviços – e outros verdes na paquera a partir para a caça. “Coloque um sorriso na cara, assim você não conseguirá nada”, diz Madeira para Vítor, enquanto os outros dão gargalhadas da situação, na aula teórica que o auto-intitulado personal paquera promove no salão de festas de um edifício residencial na Vila Mascote, zona sul de São Paulo. Vítor quase não consegue mudar a posição dos lábios, mas se esforça. Ele sabe que, saindo dali, a noite paulistana o espera.

Como todo curso, este tem uma prova. E é das mais difíceis. Depois de cinco horas de aula, com direito a lousa branca e apostila feita em casa, as folhas presas com grampos comuns quase enferrujados, cada aluno terá de derrubar um “avião”. O “mestre” Madeira quer seus pupilos na cola das divas. Só valem mulheres merecedoras de notas de 7 a 10 – mas não há nenhum critério objetivo para a medição.

Madeira abre o workshop explicando como funcionam as fêmeas. Diz, por exemplo, que elas têm o hábito de falar demais e que o predador deve ter, como munição, histórias para contar e dominar a conversa. “A mente da mulher age da seguinte maneira: 80% mira a personalidade do parceiro e 20%, a aparência”, diz Madeira, lembrando a importância de se vestir bem e nunca revelar, ao menos num primeiro encontro, que se chegou à balada de ônibus. “É o oposto do homem.”

No intervalo da aula, Vítor, de 32 anos, aproveita para repassar as instruções que havia absorvido anteriormente do personal paquera e agora estão disponíveis na tela de seu celular. Ele, que trabalha como segurança e tomou a decisão de fazer o curso após um desentendimento amoroso, checa as lições enquanto come a pizza pedida por Madeira. O professor garante que se especializou em cantadas durante um curso nos Estados Unidos e que usa recursos da neurolinguística, mas a impressão que dá, das paredes brancas do salão de festas aos erros de português das apostilas, é que, assim como o coffee break deste workshop, tudo é de um amadorismo bem brazuca.

Lucas, 27, é estudante e veio do Rio Grande do Sul para aprender as técnicas do personal paquera. Ele se senta na primeira fila, opina e faz perguntas entre uma explicação e outra, como quem não quer deixar escapar nenhuma parte do curso, que dura um fim de semana, nem perder o dinheiro gasto na empreitada. Além da passagem de ônibus que o fez rodar cerca de mil quilômetros, ele investiu 550 reais no workshop. “Por que as dicas não valem para todo tipo de mulher?”, quer saber.

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O 'personal paquera' Daniel Madeira (550)
O ‘personal paquera’ Daniel Madeira (550) (VEJA)

Resposta na ponta da língua, Madeira explica que suas técnicas, importadas dos EUA, são calculadas para atingir mulheres especiais. “As mais feinhas certamente vão se apavorar com tanta agressividade”, diz, entusiasmado, um outro aluno.

Por ser participativo, Lucas é escolhido para protagonizar a maior parte das encenações feitas após a apresentação da presa e das técnicas para caçá-la. É uma espécie de ensaio, em que os alunos arriscam, pela primeira vez, as cantadas que usarão mais tarde, numa balada em Pinheiros. Madeira escala um de seus assistentes para se fazer de mulher – e também de difícil. Enquanto a cena fictícia se desenrola, o “mestre” orienta seu assistente. “Seja mais duro.”

Ao todo, são quatro os assistentes. “Alberto era um caso quase perdido”, fala Madeira de um deles. “Não saía de casa, só ficava na internet, mas, após três workshops, é um modelo a ser seguido.” Mais adiante, Alberto, 31, será chamado à frente da turma para narrar sua experiência. “Foi impressionante”, garante, num espírito de “esse curso mudou minha vida”.

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É quase meia-noite quando terminam as aulas teóricas. Antes de seguir para a balada, eles se dividem entre os carros dos alunos motorizados. Um instrutor acompanha cada grupo. O nervosismo cresce. Já na fila para entrar, alguns começam a beber. Madeira dá os últimos retoques em seus pupilos: desabotoa o último botão da camisa de um, manda todos sorrirem e, num deslize que é um tiro na auto-estima, comenta as espinhas de um terceiro.

Dentro da balada, a ação é imediata. Os grupos selecionam suas presas e partem para a caçada. “Oi, você poderia me dar uma opinião feminina”, tenta Lucas. “Eu não sou daqui, você pode me explicar como funciona a balada?” Já Vítor, retraído, pouco se arrisca. Faz bem. A reação da mulherada não é a desejada. Os “tocos” são muitos. “Demora mesmo para pegar o jeito, muitos pensam em desistir e eu tenho que atuar como um reanimador”, justifica o personal paquera, que no dia seguinte, num shopping da cidade, reuniu novamente a turma. Ninguém pegou ninguém.

*Os nomes usados neste texto são fictícios, a pedido dos entrevistados.

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