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A audiência digital agora é oficial. E isso é só o começo

Antes desprezada, audiência on-line ganha aferição séria – e pode ser lucrativa

Por Carol Nogueira
18 mar 2013, 07h28

Queixa constante entre músicos, os serviços de streaming (aqueles que permitem ouvir ou ver conteúdo, sem baixar, como o YouTube) rendem pouquíssimo aos artistas, que fazem dinheiro mesmo com as vendas de discos e arquivos digitais, além dos shows, é claro. E ainda põem em risco uma parcela imensurável do público-alvo, que pode desistir de comprar uma faixa depois de ouvi-la de graça na internet. Mas esse cenário está em transformação. Desde o final de fevereiro, a revista americana Billboard, responsável pela lista de músicas mais tocadas nos Estados Unidos, incorporou cliques e visualizações feitas na tela do computador à formula que a cada semana, nas últimas décadas, anuncia quem são os artistas mais tocados — e mais influentes — do mercado americano. A mudança não apenas dá à internet o status que há tempos ela merece, o de mídia tão ou mais relevante que o rádio e a TV. Ela também dá início a uma alteração profunda na indústria fonográfica, que acaba de dar os primeiros sinais de se adaptar à era digital, e agora deve abraçá-la de vez, levando a relação entre músicos e internet a um novo patamar.

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Para vislumbrar a transformação que se anuncia, é preciso primeiro entender como as coisas funcionam hoje. Para começar, o YouTube não paga o artista, mesmo que a música dele renda um baita volume de acessos. O que um músico ganha pela exibição de um arquivo com uma de suas canções vem dos anúncios publicados pelo site dentro do vídeo. Os valores variam de acordo com a popularidade do canal em que o conteúdo está publicado, mas, em geral, o artista recebe uns 10 centavos de dólar a cada 1000 visualizações de um vídeo com anúncio ou, no melhor caso, 10 centavos a cada vez que alguém clica no anúncio. Em dezembro, o clipe da música Gangnam Style, do sul-coreano Psy, uma sátira do bairro dos novos ricos de Seul, atingiu 1 bilhão de visualizações – o maior número já registrado pelo YouTube. Embora o vídeo tenha tornado o rapper e sua dança do cavalinho famosos no mundo todo, e estimativas de mercado sugiram que ele lucrou mais de 8 milhões de dólares por causa dele, apenas 870 000 desse montante saíram do YouTube. Se Psy, que conseguiu um número enorme de visualizações, faturou apenas isso, imagine um artista comum?

Em média, um artista recebe 0,00029 centavos de dólar a cada vez que uma música sua é escutada em um serviço de streaming — contra cerca de 0,07 centavos de dólar com a venda da mesma música no iTunes. “O Spotify (serviço de streaming mais popular nos EUA) pode ser ótimo para dar exposição a alguém, mas por 10.000 plays nós ganhamos apenas 10 dólares”, escreveu a banda Grizzly Bear no Twitter no ano passado. O Spotify, por sua vez, se defende dizendo que cerca de 70% da renda da empresa, feita de assinaturas e venda de anúncios, se destina a pagar direitos autorais. Ou seja, caso o serviço consiga um número maior de anunciantes e assinantes, o valor pago a artistas pode também pode aumentar.

Seja como for, como uma moeda desvalorizada artificialmente, a internet hoje não paga o que deve. Estava na cara que as coisas tinham de mudar, o câmbio não podia se manter assim por muito tempo. “Chegamos a um ponto em que era óbvio que as pessoas consumiam música on-line e que os artistas precisavam receber por isso, mas não se sabia como quantificar o sucesso deles, era uma questão complicada”, diz Gary Trust, diretor das listas da Billboard. Segundo ele, a revista estudou por dois anos a mudança, que agora permitir à tradicional lista refletir com maior fidelidade, e também com maior rapidez, o que é hit em um determinado momento. “Fizemos uma pesquisa e descobrimos que, nos Estados Unidos, 94% das pessoas ainda ouvem rádio. No entanto, o rádio já não é mais tão influente quanto a internet. As estações de rádio geralmente são mais conservadoras.” Em outras palavras, uma canção pode estourar na rede e demorar dias ou semanas para chegar às rádios, atraso que agora não vai mais se transferir para o ranking da Billboard.

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Revolução — A mudança, considerada revolucionária no mercado musical, fez com que Harlem Shake, música do DJ americano Baauer que se tornou viral no YouTube depois que várias pessoas publicaram vídeos com danças bizarras, entrasse para o topo das paradas no dia 21 de fevereiro – e ela está lá até hoje, quatro semanas depois. “Harlem Shake não estaria sequer na lista se não fosse um sucesso on-line, pois as execuções no rádio representam cerca de 0,1% de todas as reproduções da canção. Se já estivéssemos medindo isso na época do Psy, ele seria tão popular na lista quanto Adele”, afirma Trust.

A novidade nas listas da Billboard veio algumas semanas antes de a Nielsen, empresa que compila os dados das músicas mais tocadas para a revista americana, anunciar que também vai passar a incluir serviços de streaming, como o Netflix, nos cálculos de audiência da televisão, algo que também deve impor alterações a esse mercado. A série Girls, por exemplo, sucesso de crítica que venceu o Globo de Ouro de melhor comédia em janeiro, só atrai 700.000 espectadores ao vivo na HBO, mas a sua audiência na internet, por semana, é de 4 milhões.

Um dos maiores impactos que as novas formas de medir audiência devem causar vai se dar no mercado publicitário. Um anunciante, hoje, destina a sua verba para aquilo que grandes empresas de medição como a Nielsen dizem que tem público. Agora, essas empresas vão confirmar com todas as letras a enorme plateia que tem a internet. A web vai ganhar força na briga com o rádio e a TV pelo gordo quinhão da publicidade.

O último relatório anual da IFPI (Federação Internacional da Indústria Fonográfica), que traça um panorama do mercado, mostrou que os serviços digitais estão em expansão – somente em 2012, o número de assinantes de serviços de streaming pagos cresceu 44% no mundo todo e hoje é de 20 milhões de pessoas. E o levantamento estima que o alcance do streaming vai crescer ainda mais em 2013, com vários serviços passando a ser oferecidos em países como Brasil, Índia e Coreia do Sul. Não à toa, no começo do mês o YouTube anunciou que planeja o lançamento de um serviço exclusivo para isso. Não deu maiores detalhes, mas deve ser algo para competir com o Spotify, que no ano passado teve lucro de 889 milhões de dólares – e para este ano projeta mais de 1 bilhão.

Brasil – O Spotify deve desembarcar no país até o fim do ano. Segundo a IFPI, tudo indica que o Brasil tem grande potencial econômico para ajudar a indústria da música a voltar a crescer, aposta que já fez o Deezer, no país desde janeiro. “A maior inserção econômica e o acesso maior à banda larga hoje no país deram um ‘boom’ nesse setor no ano passado”, afirma Claudio Vargas, vice-presidente de marketing digital e novos negócios da Sony Music Brasil. A gravadora, aliás, prepara o lançamento do que pode vir a ser a primeira banda brasileira fenômeno de internet, a exemplo do grupo britânico One Direction. O grupo, chamado P9, é composto por quatro garotos do Rio de Janeiro. O primeiro single, My Favorite Girl, foi lançado no último dia 11. O marketing da banda é focado no meio digital – na página deles no Facebook há, por exemplo, um post apresentando cada um dos garotos. Que, aliás, são bonitinhos e devem fazer sucesso com as garotas. Com apenas dois dias no ar, a primeira faixa do grupo já havia sido ouvida por 8.800 pessoas no YouTube.

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Vargas explica que a gravadora tenta tirar o máximo de proveito do YouTube. Isso inclui, por exemplo, cadastrar uma música do artista no site, ainda que ela não tenha videoclipe oficial, usando para isso a imagem da capa do disco ou uma compilação de imagens. “Assim, as pessoas podem ouvir a música de um canal oficial, com qualidade”, diz. E, claro, assim artistas e gravadora podem lucrar com as execuções. A Sony também anuncia a venda das músicas no iTunes sempre que pode. E os resultados foram mais do que satisfatórios: só no ano passado, a empresa registrou crescimento de 90% nas vendas digitais.

Muitas gravadoras também já coadministram os perfis dos artistas no Twitter e Facebook. “Às vezes, uma foto tirada antes de um show já é suficiente para criar burburinho nas redes”, diz Victor Kelly, gerente de A&R (artists and repertoire, divisão responsável pelo desenvolvimento dos artistas) da EMI no Brasil.

Sim, os vídeos de música estão com tudo no Brasil. O Vevo, joint venture da Sony com a Universal Music e o maior site de streaming de vídeos musicais do mundo, que hoje tem cerca de 4 bilhões de visualizações por mês, abriu escritório no país em agosto passado e já colhe bons resultados – o canal da cantora Paula Fernandes, por exemplo, contabilizou cerca de 11 milhões de visualizações de lá para cá. Segundo Fatima Pissara, diretora-geral da Vevo no Brasil, uma vantagem dos serviços de streaming para o mercado fonográfico é que o lançamento de videoclipes, geralmente realizado meses após a música sair, faz com que ela tenha uma vida útil maior no mercado.

E a medição de audiência on-line também ganha espaço no país. A Crowley, empresa que faz a medição para a Billboard brasileira, já usa os dados de rádios da internet desde o ano passado. E o Ibope, que tem função semelhante à da Nielsen nos Estados Unidos, estuda uma ferramenta que faça a mesma coisa em relação à TV. Segundo Dora Câmara, diretora regional do instituto, o Ibope deve implementar o novo sistema até o fim do ano, em três etapas: primeiro, medindo a audiência de conteúdos ao vivo, depois, dos gravados e, por fim, dos conteúdos acessados em dispositivos móveis (como celulares e tablets). Agora, ninguém vai ficar de fora.

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