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Um ‘retrato falado’ do traficante Fabiano Atanásio, o FB

Gravações obtidas por ‘VEJA’ revelam os métodos sanguinários do bandido que aterrorizou o Rio de Janeiro

Por Leslie Leitão 4 fev 2012, 07h58

Não há nenhum vestígio de remorso, mas uma mescla de orgulho e prazer na voz do traficante Fabiano Atanásio da Silva, o FB, quando se refere às barbáries que liderou com mãos de tirano desde que ascendeu ao posto máximo na hierarquia do crime carioca. Nos últimos cinco anos, foi ele o cabeça dos atos de selvageria que fizeram do Rio de Janeiro o palco de um show de horrores, chocando o país. FB instaurava um regime de medo nas favelas que dominava, ostentando seus fuzis e vigiando a todos por meio de câmeras, e contava com um exército de 500 bandidos que o reverenciava como a um monarca. Com um arsenal de mais de 300 fuzis, granadas, mísseis e até metralhadoras antiaéreas, sua quadrilha tornou-se um dos braços mais armados da cidade e certamente o mais afeito ao terror – razão pela qual FB, 35 anos, queimou etapas até chegar ao topo. Na semana passada, depois de anos zombando da inépcia da polícia, cuja banda podre era paga por ele para lhe garantir liberdade e poderio bélico, o mais sanguinário marginal do Rio ainda à solta foi enfim capturado. “A prisão desarticula uma artéria vital da bandidagem nacional”, avalia Fábio Galvão, subsecretário de inteligência do estado, que por anos caçou FB.

VEJA teve acesso ao conteúdo de mais de 1 000 horas de conversas telefônicas travadas entre o traficante, seus comparsas e os bandidos de farda que ele aliciava (Leia os trechos da gravação e ouça o áudio).O conjunto expõe as vísceras da célula criminosa liderada por FB e não deixa dúvidas quanto à autoria de crimes que, ao ser preso, ele seguiu negando. Em 17 de outubro de 2009, enquanto orquestrava uma guerra contra uma facção inimiga via celular, ele não escondia sua satisfação diante da carnificina que ceifava a vida de inocentes e culminaria com a derrubada por sua gangue de um helicóptero da Polícia Militar, matando três homens. “Joga dois míssil aí. Joga que eu quero escutar o barulho”, ordenava a um capanga (veja o quadro abaixo). As fitas também trazem à tona os meandros das promíscuas relações entre FB e um grupo de PMs. Em um dos diálogos, FB negocia a compra de dois fuzis, acenando aos oficiais com “pagamento à vista sem estresse”. Os grampos deixam claro que ele não encontrou grandes obstáculos ao erguer seu império criminoso. Armas e munições chegavam à Vila Cruzeiro, favela da Zona Norte do Rio onde montou seu QG, em grandes lotes. Em uma das transações, FB arremata vinte fuzis russos. Em outra, acerta a compra de 300 caixas de munição.

Sua prisão revela ainda quão articulado ele estava com figurões do crime nacional. Ao ser capturado em uma casa cercada de confortos que havia alugado em Campos do Jordão, cidade paulista da qual se despediu dizendo gostar da “boa gastronomia”, FB estava acompanhado de Luiz Cláudio Correa, o CL, seu escudeiro de selvageria, além de uma segunda figura sobre a qual pouco se falou – Elton Leonel Rumich, homem do alto escalão do Primeiro Comando da Capital (PCC), organização criminosa de São Paulo. É o mesmo bandido suspeito de participar de um atentado contra o prefeito da cidade paraguaia de Pedro Juan Caballero, em 2010.

Nos últimos tempos, FB havia fincado uma base em São Paulo, onde nasceu. É dono de uma casa em Peruíbe, no litoral, onde, à beira de uma generosa piscina, cultivava o hábito de tomar uísque Red Label com energético. Fazia a mulher, Flávia, com quem tem três filhos, passar-se por juíza. Em julho do ano passado, ele chegou a ser flagrado pela polícia. Pagou 500 000 reais pela liberdade, segundo quatro pessoas que tomaram ciência do episódio relatam a VEJA. “FB ficou rodando horas dentro da viatura até o dinheiro chegar”, conta uma dessas fontes.

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Ele foi galgando posições no Comando Vermelho, a maior facção criminosa do Rio, ao tornar-se homem-chave na conquista de territórios. Com os dois cabeças da organização presos, Marcinho VP e Fernandinho Beira-Mar, de quem recebia ordens da cadeia, FB passou a ser o quadro mais valioso da quadrilha à solta. Afrontava o estado sem ser incomodado. Na Vila Cruzeiro, seus comparsas bloqueavam as ruelas com trilhos e carros queimados, para controlar o acesso ao morro que vigiava da sala de TV de sua casa. Recebia em tempo real as imagens capturadas pelas câmeras espalhadas na favela. Conseguia assim saber quando a polícia estava na área e flagrar traidores, que eliminava fazendo-os suplicar pela vida antes de fuzilá-los.

Com a instalação de Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) em favelas, a Vila Cruzeiro passou a acolher a bandidagem que ficara sem teto, fortalecendo-se como um quartel do crime. Em 2010, ela foi também retomada pelo estado, como reação a uma onda de terror capitaneada por FB. Nesse episódio, ele liderou a fuga do bando pelo matagal, até o vizinho Complexo do Alemão. Dali, escapou guiando uma moto até outra favela, Costa Barros, seu novo QG. Continuava a receber armas e drogas vindas da rota Paraguai-São Paulo, que fornecia a centenas de morros. Também faturava com os “agrados” dados pela ala de sua gangue dedicada a grandes assaltos, conhecida como “Os Quarenta Ladrões”. Papéis encontrados em Campos do Jordão mostram que os negócios eram lucrativos – FB embolsou 2,5 milhões de reais em uma única transação. Ele sustentava uma vida de luxos e diversão, desfilando na favela com camisas Armani e promovendo festas que atraíam de rainhas de bateria a jogadores de futebol, como Adriano, hoje no Corinthians. Na semana passada, trocou la dolce vita dos tempos de impunidade por um cubículo de 7 metros quadrados no presídio de segurança máxima de Mossoró, no Rio Grande do Norte.

LA DOLCE VITA - Em uma festa que promoveu na Vila Cruzeiro, em 2010, FB posa ao lado de dois comparsas, coberto de joias de ouro branco maciço — suas preferidas: com faturamento na ordem de milhões, o marginal comprou uma casa em Peruíbe, no litoral paulista (à dir.)
LA DOLCE VITA – Em uma festa que promoveu na Vila Cruzeiro, em 2010, FB posa ao lado de dois comparsas, coberto de joias de ouro branco maciço — suas preferidas: com faturamento na ordem de milhões, o marginal comprou uma casa em Peruíbe, no litoral paulista (à dir.) (VEJA)
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