Carandiru: testemunhas de defesa falam no 2º dia de júri
O testemunho mais esperado é de Antonio Fleury Filho, governador de SP na época do massacre, que falará pela primeira vez em juízo sobre o caso
Nesta manhã será retomado do júri de 26 policiais militares acusados de matar detentos no caso que ficou conhecido como massacre do Carandiru. No segundo dia de julgamento, deverão ser ouvidas as testemunhas de defesa, entre elas o ex-governador de São Paulo Luiz Antonio Fleury Filho – que comandava o Executivo estadual na época da invasão policial à Casa de Detenção, que resultou na morte de 111 detentos do pavilhão nove, em 2 de outubro de 1992. Em outubro do ano passado, durante uma entrevista, Fleury afirmou “quem não reagiu está vivo” e que tem “informações de como as coisas se passaram lá dentro”.
O secretário de Segurança Pública à época, Pedro Franco de Campos, e o ex-governador já estão no Fórum da Barra Funda, segundo informações do Tribunal de Justiça. A previsão é de que o julgamento dure cerca de dez dias.
Esse é o primeiro julgamento do massacre no Carandiru. Outros 53 PMs serão julgados pela participação na invasão à Casa de Detenção em mais três etapas.
Após dois adiamentos só neste ano, o júri dos 26 policiais da Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) começou nesta segunda-feira com o depoimento das testemunhas de acusação. Ex-detentos do pavilhão nove contaram o que viram durante a invasão policial para conter uma rebelião. Eles contestaram a quantidade de mortos informada oficialmente e também a informação dada pela polícia na época de que os detentos tinham armas dentro das celas.
Leia também:
Leia também: ‘PMs já entraram atirando’, afirma ex-detento do Carandiru
Quinta testemunha de acusação a ser ouvida, o perito Osvaldo Negrini Neto afirmou que “havia poças de sangue no pavimento que alcançavam as canelas”. Ele disse ainda que os policiais presentes no Carandiru não queriam que ele examinasse o local. A testemunha também afirmou que a retirada dos corpos das celas, feita por presos sobreviventes que receberam a ordem de policiais, prejudicou o trabalho da perícia.
Pela quantidade de réus – atualmente 79 PMs – o processo precisou ser desmembrado. Nessa primeira fase, os 26 policiais são acusados da morte de quinze presos. Inicialmente, 130 PMs foram denunciados à Justiça pelo massacre. O número, contudo, foi caindo ao longo dos anos porque prescreveram muitas das acusações, como o crime de lesão corporal.
Relembre o caso – Em 2 de outubro de 1992, chamados para conter uma rebelião na Casa de Detenção de São Paulo, parte do complexo presidiário do Carandiru, cerca de 340 policiais invadiram o pavilhão nove sob a liderança do coronel Ubiratan. Tudo caminhava para que os mais de 2.000 detentos fossem dominados e tranquilizados, até que os batalhões de choque chegaram ao primeiro andar do pavilhão, o foco da revolta. Armados com revólveres, escopetas e metralhadoras, os policiais executaram 111 presos. Do lado da polícia, nenhuma baixa. A reação imediata do governador foi atrasar a contagem dos corpos e tentar ludibriar a imprensa por algumas horas para não atrapalhar o resultado das eleições que se realizariam no dia seguinte.
Em setembro de 2002, a Casa de Detenção, a maior da América Latina, foi finalmente desativada, dando lugar a um parque público com áreas de lazer e cultura. Cerca de 170.000 pessoas passaram pelo presídio em 46 anos de funcionamento. Em abril de 2000, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) considerou oficialmente o episódio como um massacre, o que significa que o Brasil ainda poderia ser levado a julgamento em cortes internacionais em função do caso. O governador e o secretário de Segurança do Estado na época não foram responsabilizados pelo caso.