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Padrinhos fortes carimbam chegada de Fux ao topo do Judiciário

Novo ministro tem apoio de Antonio Palocci, José Sarney e Sérgio Cabral

Por Mirella D'Elia, Adriana Caitano e Luciana Marques
2 fev 2011, 18h44

Fux ganhou pontos também por ser juiz de carreira. Os magistrados vinham pressionando para que mais um ministro do STF tivesse essa característica, além do atual presidente, Cezar Peluso

Notável saber jurídico e reputação ilibada são dois dos principais requisitos exigidos pela Constituição Federal aos candidatos a uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF). O carioca Luiz Fux, de 57 anos, indicado pela presidente Dilma Rousseff para a cadeira de Eros Grau, preenche ambos. Os critérios políticos, no entanto, pesaram mais que a vasta experiência na magistratura para que ele chegasse ao topo do Judiciário. Juiz de carreira, professor, autor de diversos livros de direito, foi com a benção de poderosos padrinhos políticos que Fux tirou do páreo candidatos fortes como Cesar Asfor Rocha, seu colega no Superior Tribunal de Justiça (STJ), e o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, o preferido do presidente anterior.

O magistrado conquistou notoriedade fora do ambiente jurídico ao assumir a presidência da comissão que, no Congresso, propôs alterações no Código de Processo Civil. Ganhou o posto graças à indicação do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Ao sugerir mudanças que prometem agilizar o sistema jurídico do país – como reduzir as possibilidades de recurso durante um processo e fazer uma decisão valer para todos os casos semelhantes -, ganhou a simpatia de parlamentares de vários partidos. “Vai ser um dos maiores ministros da história do STF”, diz o senador Demóstenes Torres (DEM-GO). O anteprojeto passou pelo Senado praticamente sem mudanças e deve ser votado na Câmara ainda neste semestre.

A candidatura ao STF teve como um dos principais incentivadores o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), um dos aliados mais próximos de Dilma. Também caiu nas graças do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, figura influente no Palácio do Planalto. “Não houve negociação, houve um convite”, disse o ministro ao site de VEJA, tentando afastar suspeitas de que, com a chegada ao Supremo, Fux vá pagar qualquer espécie de fatura ao governo em votações de interesse para o Planalto.

Sinal de autonomia – Foi com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que o próximo ministro do STF e a presidente Dilma jantaram, na noite de terça-feira, na Granja do Torto, para bater o martelo. Fux chorou ao receber o convite. Adams, que chegou a ser o mais cotado para o posto, sofreu um baque, relatam pessoas próximas, e terá de esperar por outra vaga. Horas antes, na manhã de terça, Dilma participara, ao lado do presidente do Supremo, Cezar Peluso, da abertura do ano judiciário, solenidade que marca a retomada dos trabalhos da corte. Esperava-se dele um discurso de cobrança, já que a cadeira de Eros Grau ficou vazia por mais de seis meses, atrapalhando decisões emblemáticas como a da Ficha Limpa, que terminou em vergonhoso empate. Mas a fala de Peluso foi mansa. Não por acaso. Antes da cerimônia, chefes do Executivo e do Judiciário reuniram-se. A portas fechadas, ela comunicou a ele a decisão.

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A postura de Dilma, que se negou a escolher o candidato de Lula, foi bem vista entre os ministros do STF. Enxergaram nisso um sinal de autonomia. Os integrantes da mais alta corte do país estavam irritados com a demora. “Ficou a lição: não se deve deixar o Supremo tanto tempo desfalcado. O número par não é desejado pela Constituição e causou impasses no tribunal”, resume Carlos Ayres Britto, em seu estilo peculiar. Agora, resolvido o problema, a expectativa é que o plenário completo, com onze cadeiras ocupadas, volte a discutir temas controversos, como a própria questão da Ficha Limpa e o futuro do terrorista italiano Cesare Battisti. Um peso muito grande para quem está chegando agora? “A responsabilidade é maior porque não há órgão acima do Supremo e isso atrai a atenção do jurisdicionado. Depois que o Supremo decide não adianta mandar carta ao Santo Padre”, brinca o sempre bem-humorado Marco Aurélio Mello.

Fórmula de sucesso – Apesar de o fator político ter sido preponderante na escolha de Fux, a biografia também pesou na decisão e arranca elogios de todos os lados. A ascendência judaica, com avós refugiados do nazismo, a origem relativamente simples, o estudo em escola pública do Rio de Janeiro, o início como boy no escritório do pai, a faixa preta em jiu-jitsu e até a participação em uma banda de rock como guitarrista ajudaram a montar a imagem do juiz moderno e ligado aos direitos humanos. O presidente da Associação de Magistrados do Rio de Janeiro (Amaerj), desembargador Antonio Siqueira, foi colega e depois aluno de Fux na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). “Ele era um típico jovem da zona sul do Rio, tinha cabelos longos, ia para festas”, comenta. “Como juiz, sempre foi antenado com o seu tempo, moderno, muito estudioso.”

O desembargador do Rio de Janeiro Antonio Saldanha, que foi advogado da Shell ao lado de Fux, confirma as características que, em sua opinião, transformaram-se em fórmula de sucesso. “É um homem adorável de se conviver, de humor refinado, espirituoso, alegre, jovial. Mesmo como ministro do STJ, continuou aproveitando seu tempo livre como um legítimo carioca – caminha na praia, luta jiu-jitsu, toca guitarra e violão até hoje”, cita.

Estudioso, Fux passou em primeiro lugar em vários concursos de que participou. Tornou-se professor da UERJ aos 26 anos, escreveu quase 20 livros e é membro da Academia de Letras Jurídicas. “Ele sempre teve uma cultura acadêmica invejável”, comenta Saldanha.

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O ministro ganhou pontos também por ser juiz de carreira. Os magistrados vinham pressionando para que mais um ministro do STF tivesse essa característica, além do atual presidente, Cezar Peluso. A Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) chegou a enviar um ofício com o pedido ao ex-presidente Lula no ano passado. “Os magistrados em atividade no país são portadores de notável saber jurídico e conhecimento sobre o que acontece no Brasil”, argumenta o presidente da entidade, Nelson Calandra. “Não basta ser magistrado, tem que ser o magistrado, sem nenhum arranhão em sua história”, acrescenta o desembargador Antonio Siqueira.

A trajetória já havia sido reconhecida pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que o indicou ao STJ, em 2001, e chegou a ser cotado para o STF quando o ex-ministro Menezes Direito morreu, em 2009. Mas, ainda que brilhante, amigável e juiz de carreira, ele naturalmente precisaria de robusto apoio político para chegar ao poder em uma corte com características eminentemente políticas. Conseguiu. “A indicação para ministro do STF é política, não só por currículo”, lembra o presidente da AMB, Nelson Calandra.

(Colaborou Gabriel Castro)

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