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Ficha Limpa: STF suspende julgamento e adia decisão

Após empate de 5 a 5, ministros não definiram critério para superar impasse

Por Mirella D'Elia e Gabriel Castro, de Brasília
24 set 2010, 01h33

O impasse continua. Depois de dois dias de julgamento e diante de um nó que não conseguiu desatar, o Supremo Tribunal Federal (STF) não decidiu se a Lei da Ficha Limpa vale nestas eleições.

Já na madrugada desta sexta-feira, após um empate de 5 a 5, o presidente do STF, Cezar Peluso, anunciou a suspensão do julgamento por tempo indeterminado. A atitude foi tomada por Peluso diante do inusitado equilíbrio – que não se esperava ser tão agudo. De fato, os ministros não estavam divididos somente em relação à aplicação imediata da norma legal, mas, também, em relação à postura correta a adotar para chegar a uma conclusão. “Vamos nos reunir para decidir o que fazer”, resumiu Peluso, ao deixar o plenário.

Os ministros analisaram recurso do ex-governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PSC), barrado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com base nos critérios da Ficha Limpa. Com a manutenção do impasse, ele pode continuar fazendo campanha. Confusão – Poucas vezes tamanha confusão foi vista, em plena madrugada, no plenário da mais alta corte de Justiça do país. Os magistrados fizeram de tudo. Recorreram ao regimento interno, à gramática, bateram boca e chegaram a falar todos ao mesmo tempo, em uma verdadeira Babel. Não houve conclusão alguma – a não ser a da suspensão. Não há data para retomar a discussão. Durante o debate sobre os critérios de desempate, o ministro Ricardo Lewandowski lançou a tese de que, sem maioria de votos para derrubar a lei, a medida se manteria em vigor – já que foi aprovada, na íntegra, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Peluso discordava. Ao mesmo tempo, recusou-se a dar o voto de minerva – uma das hipóteses em pauta. “Não tenho vocação para déspota”. Chegou-se a discutir se o Supremo precisaria aguardar a nomeação de um novo ministro para o lugar de Eros Grau, que se aposentou e não teve o substituto nomeado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas a hipótese foi rejeitada.

A única conclusão a que os ministros conseguiram chegar: suspender o julgamento. A temperatura subiu. “Não há maioria aqui para nada”, disse Joaquim Barbosa, ao defender esta hipótese. O problema é que a discussão pode ficar para depois das eleições. Resultado: incerteza sobre os candidatos sujeitos à Ficha Limpa. Vão disputar o pleito sem saber se poderão assumir o cargo em caso de vitória.

Muitos ministros ficaram insatisfeitos com a conduta de Peluso diante da situação. Cobravam uma atitude mais enérgica. Marco Aurélio Mello chegou a ironizar: seria preciso convocar Lula para acabar com o impasse? Até mesmo as ministras Ellen Gracie e Cármen Lúcia, normalmente comedidas, ironizaram a postura do presidente. Carlos Ayres Britto e Joaquim Barbosa estavam nitidamente irritados.

O julgamento – A discussão começou na quarta-feira. O primeiro a votar foi o relator, Carlos Ayres Britto, que defendeu a validade imediata da norma. “O cumprimento da moralidade e da probidade pode esperar? Um dia que seja pode ser de prejuizo irreparável”, declarou.

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O presidente do STF, Cezar Peluso, surpreendeu a todos ao introduzir um tema que sequer estava em pauta. Disse que a lei seria inconstitucional devido a um aspecto formal: sua tramitação no Congresso teria sido incorreta. “A mim me parece que nós tremos um caso de arremedo de lei”, disse Peluso. A atitude colocou o plenário em polvorosa e fez com que o novato José Antonio Dias Toffoli pedisse vista, interrompendo o julgamento.

Toffoli foi o primeiro a votar nesta quinta. Ao contrário de Peluso, sustentou que a lei é correta, mas não pode ter aplicação imediata. Ele baseou sua argumentação no princípio da anualidade – expresso no artigo 16 da Constituição Federal – segundo o qual lei que afeta o processo eleitoral, aprovada em ano eleitoral, só entra em vigor no ano seguinte. Foi o caso da Lei da Ficha Limpa, que passou a vigorar em junho. “Essa corte julga teses e não pessoas, julga o presente, mas suas decisões têm impacto para além do tempo de nossa permanência em suas cadeiras. Temos compromisso com o julgamento da história e esse não é o mesmo das manchetes dos jornais”, disse.

A ministra Cármen Lúcia foi a segunda a falar. Como esperado,rejeitou o argumento da defesa de que a lei não tem validade imediata. O fato de a medida ter sido aprovada antes do prazo para as convenções partidárias, sustentou, já é suficiente para manter o equilíbrio da disputa. Embora a Constituição defina que as alterações ao processo eleitoral só são aplicadas se implementadas até um ano antes do pleito, a ministra considera que esse prazo deve ser considerado “não pelo calendário civil, mas pelo institucional”.

Joaquim Barbosa votou na sequência. Juntou-se à corrente puxada por Ayres Britto.”Nao vejo como a criação de nova causa de inelegibilidade possa quebrar a igualdade entre os partidos ou favorecer esse ou aquele candidato”. O efeito da lei é o contrário, na visão do ministro. Ele ressaltou que todos os candidatos já tinham ciência de quais seriam as novas causas de inelegibilidade antes das convenções partidárias.

Ricardo Lewandowski também não surpreendeu. Já era esperado que, assim como Ayres Britto, Cármen Lúcia e Barbosa, defendesse a validade da norma. Foi o que fez. Para o ministro, a Ficha Limpa não altera o equilíbrio entre os participantes da eleição. A exemplo de julgamentos presididos por ele no TSE, desqualificou os argumentos de que a norma legal não pode retroagir para punir a quem quer que seja. Na visão de Lewandowski, a lei apenas altera os critérios para o registro dos candidatos, e não constitui uma punição.

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Corrente oposta – Ex-presidente do Supremo, Gilmar Mendes subiu a temperatura do debate ao posicionar-se ao lado da corrente oposta: a que é contrária à aplicação imediata da Lei da Ficha Limpa – puxada, na véspera pelo presidente Cezar Peluso. Mendes se exaltou logo no início de sua fala. Criticou o que chamou de “populismo” dos que criticam seu posicionamento.”Se fosse para mimetizar a decisão do Congresso, seria melhor fechar o Supremo Tribunal Federal”. Para ele, a possibilidade de que um candidato seja barrado por um ato que cometeu antes da nova lei é algo próximo à barbárie.

A explanação foi repleta de metáforas e de frases de efeito. “Juiz não precisa buscar aplauso fácil das ruas. Senão as pessoas ficariam com medo de dar um habeas corpus”. Ele completou: “Mas assim se constroi o fascismo”. Ele chegou a citar Jesus Cristo para afirmar que o clamor popular não deve ser soberano em decisões judiciais. O ministro ressaltou, no entanto, que defende a vigência da medida no futuro.

Ellen Gracie defendeu a aplicação imediata da lei. Era um dos votos mais esperados já que a posição dela era desconhecida. Marco Aurélio Mello e Celso de Mello seguiram o posicionamento de Toffoli e Mendes.

O decano Celso de Mello considerou que a validade da medida só se observará um ano depois da promulgação. “As instituiçãos legislativas não podem ficar ao sabor de dirigismos normativos das forças dominantes de cada período”, afirmou. Para ele, também não é possível tornar inelegível um candidato que apenas renunciou ao mandato, sem cometer crime.

O comandante do Supremo, Cezar Peluso, votou na mesma linha. Ele resumiu o tom de seu voto logo de saída: “Não me comovem pressões vindas da opinião pública, ou da opinião publicada, ou por segmentos do povo, ou por instituições”. Mas o dia terminou – ou melhor começou – sem nenhuma definição.

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