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O reencontro da igreja com os fiéis: os dois primeiros meses do papa Francisco

Arcebispo de Aparecida e presidente da CNBB, dom Raymundo Damasceno afirma que documento de Aparecida inspira a gestão do papa Francisco

Por Macedo Rodrigues, de Aparecida
Atualizado em 10 dez 2018, 10h02 - Publicado em 13 Maio 2013, 12h01

O arcebispo de Aparecida e presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Raymundo Damasceno, inegavelmente goza de prestígio e de uma boa dose de amizade junto ao papa Francisco. São muitas as demonstrações que o pontífice fez de seu apreço pelo brasileiro. Em 14 de março, um dia após ter sido eleito, Francisco surpreendeu a todos ao quebrar o protocolo, optando por não ir à Capela Cistina no automóvel papal e, sim, de ônibus, no qual sentou-se justamente ao lado de seu velho conhecido dom Damasceno. Foi ao arcebispo também que ele confirmou sua vinda à Jornada Mundial da Juventude – e, então, foi convidado pelo brasileiro a visitar Aparecida. Em 2007, quando ainda era o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio, o papa passou 20 dias em Aparecida trabalhando lado a lado com dom Damasceno, o que estreitou os laços de companheirismo. Portanto, agora, dois meses após o anúncio ao mundo do nome do novo papa, não há brasileiro mais qualificado para fazer um balanço sobre os dois primeiros meses de Francisco à frente do cargo do que o arcebispo de Aparecida. Em entrevista exclusiva ao site de VEJA, dom Raymundo Damasceno ressalta as principais características do papa: um homem extremamente simples e humilde, de vida austera, que evita os holofotes e sobretudo a ostentação.

Tema em foco – JMJ 2013

Conheça o roteiro do papa Francisco em Aparecida

O que ficou demonstrado nos dois meses de Jorge Mario Bergoglio como papa Francisco?

O que a gente constata é que seu estilo de governar a igreja é mais simples, menos formal e mais próximo do povo, dos fiéis, nas oportunidades em que isto lhe é permitido. Além disso, em suas palavras, nas suas catequeses, nos pronunciamentos, a gente pode perceber a importância que ele dá ao documento de Aparecida, texto conclusivo da 5ª Conferência Geral do Episcopado Latino Americano, da qual ele foi presidente, aqui em Aparecida, no ano de 2007.

Quais os preceitos deste documento? O que ele prega?

É o documento que está inspirando e orientando os diversos planos das dioceses da América Latina e com alguma repercussão também em outras partes do mundo. Um dos aspectos mais importante é nossa acolhida às comunidades, tornando a igreja cada vez mais acolhedora. Nossa comunidade torna-se cada vez mais missionária, sai um pouco de si para ir ao encontro das pessoas mais distantes, das mais esquecidas, daquelas que não participam da comunidade. Muitas das quais receberam o sacramento do batismo, da eucaristia e até do matrimônio, mas deixaram a prática da vida cristã no dia a dia, afastaram-se por diversas razões. O documento contempla muito isto, uma orientação para nossas paróquias irem ao encontro daqueles que estão afastados, aprofundando neles a evangelização, inspirando uma conversão profunda em suas vidas. E o documento sugere que façamos redes de comunidades, ou que nos transformemos cada vez mais numa comunidade de comunidades, no sentido mais amplo.

E como isto se manifesta nos atos do papa?

Ele tem constantemente feito referências ao documento. Nesta carta agora, que escreveu aos argentinos, ele faz muitas referências a isto, à igreja neste estado permanente de missão, de uma igreja animada pelo espírito santo, que leve o evangelho a todas as pessoas. Não uma igreja acomodada, estabilizada, com tendência à conservação apenas, mas esta Igreja que vai ao encontro das pessoas.

Os analistas aguardavam a montagem da Cúria do papa, a escolha de seus assessores, como um indicativo da nova gestão da igreja. Em que pé anda esta montagem?

Bem, na Cúria, até agora não houve nenhum impacto que eu saiba, porque ele se mantém vivendo na Casa Santa Marta, que é uma casa de hospedagem, dentro do Vaticano. E ali ele permaneceu, fiel ao estilo de ser dele, na maneira de se portar, que é muito simples e diferente.

Uma simplicidade que ficou evidente quando ele preferiu o ônibus ao automóvel papal, sentando-se ao seu lado um dia após ser eleito papa…

Sim, aquele foi o primeiro indicativo de sua maneira de ser e de sua diferença em relação aos pontífices anteriores. Em seu primeiro dia como papa, em vez de tomar o carro papal ele entrou direto no ônibus, para ir à Capela Cistina com os cardeais que participaram do conclave. Depois, houve o fato de permanecer vivendo em Santa Marta, rezando com os cardeais que ali residem e fazendo suas refeições com eles também. Enfim, ele inovou neste sentido, na maneira de relacionar-se. Um estilo que ele herdou de sua passagem como pastor de uma igreja importante, a Arquidiocese de Buenos Aires, portanto habituado a tratar com o povo, a usar transporte público, a visitar as pessoas, a dar uma atenção especial aos mais pobres, necessitados, doentes, presos e idosos. Esta é uma marca dele, um homem de profunda religiosidade. Por isso, sempre pede que orem por ele, porque quanto mais você busca a santidade, mais você se sente pecador, distante do ideal, do evangelho, e por isso você pede cada vez mais orações para que Deus nos dê a graça de conversão, de mudança de vida, de transformação. É um homem de vida sóbria, austera até, que está sempre buscando afastar-se da ostentação e da exposição gratuita, sendo discreto no seu modo de agir, como é característico dos jesuítas.

https://www.youtube.com/watch?v=YA8okSuueXc

Seria esta a razão que teria deixado o papa inclinado a celebrar uma missa mais reservada, em sua passagem por Aparecida em 24 de julho?

Justamente. É a marca dele. E também porque aqui ele quer dar um caráter de devoção pessoal a Nossa Senhora. Ele quer consagrar e entregar sua jornada e a viagem apostólica à proteção de Nossa Senhora. E a aparição dele mais pública certamente será no Rio de Janeiro. Claro que ele não vai ficar escondido aqui, mas penso que ele queira fazer um ato mais pessoal e devocional. Sou, no entanto, favorável a uma cerimônia campal porque penso que seria mais interessante ter este contato mais direto com o povo, do lado de fora.

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Em Aparecida, comida caseira para o papa da humildade

Quando o senhor diz que vem argumentando em favor da missa campal, a quem o senhor dirige os seus argumentos? Diretamente ao papa?

Não. Expus meus argumentos ao chefe da viagem que esteve aqui. Mas ele não pode decidir, é claro. Ele ouviu os argumentos, achou-os razoáveis e agora eles vão decidir em Roma. E esta decisão não tem prazo. Estamos esperando o cerimonial que deve chegar em breve ao Brasil, como o responsável pela liturgia da casa pontifícia, que virá aqui e ele certamente trará a resposta, porque ele vem exatamente tratar da celebração.

O papa já demonstrou que não é dos mais protocolares. Existe alguma preocupação nesse sentido durante a visita a Aparecida?

De nossa parte, não, porque a programação está muito definida aqui: chegada ao Santuário, celebração eucarística, trajeto ao Seminário Bom Jesus, almoço, repouso e viagem de volta ao Rio. Naturalmente, haverá muita segurança em todos os seus deslocamentos e o público poderá avistá-lo das calçadas e ser abençoado por este papa de extrema simplicidade.

Foi o senhor quem convidou o papa para visitar Aparecida. Ele aceitou prontamente?

Ele recebeu com muita satisfação e disse que provavelmente viria, se pudesse. Depois, para nossa alegria, ele confirmou à presidente Dilma que passaria por aqui, quando ela teve uma audiência privada com ele, no Vaticano. Foi por meio da presidente que fiquei sabendo que ele viria. O que nos deu imensa satisfação.

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