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Caso Bruno: o silêncio das testemunhas

Morte de Sérgio Rosa Sales, primo do goleiro que fez a reconstituição dos dias de Eliza Samudio no sítio, calou o jovem Jorge Luiz, que ajudou a levar a jovem para a morte. Julgamento que começa nesta segunda-feira terá depoimento de assistente social e vídeo gravado pela testemunha assassinada

Por Leslie Leitão 18 nov 2012, 20h03

O capítulo final da trama iniciada em junho de 2010, quando desapareceu a jovem Eliza Samudio, começa a ser escrito às 9h desta segunda-feira. O goleiro Bruno Fernandes, acusado de ser o mentor do sequestro e da morte da jovem, com quem teve um filho, vai a júri popular em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte. O julgamento tem todas as características e a carga dramática dos casos que param o país por algumas horas, como se viu nas semanas seguintes ao crime, à medida que eram revelados detalhes macabros do sofrimento imposto à ex-amante de um ídolo do futebol. O crime levou Bruno, um ídolo do esporte, capitão do Flamengo, time de maior torcida do Brasil, a ser chamado de “monstro”.

Todos os passos do julgamento serão acompanhados pela reportagem do site de VEJA. O embate entre defesa e acusação que se verá em Contagem tem alguns elementos a mais de dificuldade para a acusação, comandada pelo promotor Henry Wagner Vasconcelos de Castro. A primeira delas é o fato de o corpo de Eliza nunca ter sido encontrado. E entre as versões mais aterradoras para esse sumiço está a de que o ex-policial Marcos Aparecido dos Santos, o Bola, o teria dado para ser devorado por cães da raça rottweiler. A segunda, o medo que calou as testemunhas ou, no mínimo, levou envolvidos no caso a mudar suas versões em depoimento – sempre no sentido de amenizar a culpa dos acusados.

MORTE DE TESTEMUNHA: A ESTRANHA ONDA DE COINCIDÊNCIAS DO CASO BRUNO

O silêncio era uma estratégia da defesa desde o início. Era esta a orientação do advogado Ércio Quaresma, que assumiu o caso tão logo Bruno passou a figurar como suspeito. À medida que o cerco se fechou sobre a turma de Bruno, conhecidos pelas festas de arromba no sítio, a polícia conseguiu identificar funcionários, parentes e comparsas que certamente tinham informações importantes para esclarecer o destino de Eliza e as responsabilidades sobre o desaparecimento. Houve poucos e importantes avanços. O principal deles, de dois primos do goleiro: Sérgio Rosa Sales e Jorge Luiz Lisboa Rosa, que na época era menor de idade e não teve o nome revelado.

SÉRGIO ROSA SALES ERA UM ARQUIVO VIVO, DIZ JUÍZA DO CASO BRUNO

Jorge Luiz, que participou do transporte de Eliza até a casa do ex-policial, onde ela foi morta, segundo a polícia, levou os investigadores ao local, e fez uma rica descrição do espaço antes de chegar à casa. Foi a partir dele que a Polícia Civil de Minas Gerais passou a ter certeza de que Eliza fora assassinada. Também foi dele o relato que tornou impossível para o goleiro dizer que “não sabia” o que se passava com Eliza.

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Jorge não estará presente no julgamento. Como era menor, foi considerado culpado pelo Juizado de Menores de Minas Gerais e cumpriu dois anos de medida socioeducativa. Em setembro, ao ganhar a liberdade, foi incluído no Programa de Proteção a Jovens e Adolescentes Vítimas de Ameaças de Morte (PPCam), por dizer ter medo de morrer. O Ministério Público chegou a pedir à juíza Marixa Fabiane Rodrigues que Jorge fosse interrogado por videoconferência – ele está fora de Minas. Mas o pedido foi negado. Sem ele, o interrogatório mais contundente no sentido de impressionar os jurados, que precisam se convencer de que Eliza foi assassinada, está perdido.

Como complicou o primo e os demais acusados, Jorge Luiz sempre teve razões para não se sentir seguro. O medo aumentou este ano, como conta a mãe do rapaz, Simone Lisboa. Em agosto, ela recebeu um telefonema em casa, na cidade de São Gonçalo, no Rio, para ir a Minas Gerais, onde o filho, agora com 19 anos, terminava de cumprir a medida de internação determinada pela Justiça. Jorge Luiz estava apavorado. Já sabia da morte de seu primo Sérgio Rosa Sales, a outra testemunha importante do caso, baleado seis vezes em circunstâncias nebulosas, por um traficante da região metropolitana de Belo Horizonte – supostamente, por ciúmes.

A versão apresentada pela polícia para elucidar o caso não convenceu o rapaz – e, estranhamente, parece ter convencido experientes investigadores da Polícia Civil mineira. Sérgio também complicou o goleiro em seus depoimentos, e tinha medo. Mas foi morto por ter olhado para uma mulher que passou pela rua onde morava com os pais, no bairro Minaslândia.

“Pode ter sido um crime passional, mas também pode não ter sido. Ele me disse: mãe, não vou pagar pra ver. Estava assustado com aquilo e me disse que iria embora para tentar viver uma nova vida longe dali. Nunca mais tive notícias”, diz a mãe.

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O Programa de Proteção a Jovens e Adolescentes Vítimas de Ameaças de Morte (PPCam) é destinado a preservar a integridade de quem está em perigo, sem compromisso com o comparecimento à Justiça. “Para nós, o que importa é a proteção da vítima. Não é um programa no qual a testemunha tem o compromisso de colaborar com qualquer processo”, afirma o diretor do programa, Diego Valadares. O programa é ligado à Secretaria de Estado de Defesa dos Direitos Humanos.

O promotor Henry Wagner não concorda com a forma encontrada para tirar Jorge Luiz do caso. “Quem quer matá-lo? Quem pode estar atentando contra a vida dele? É o Ministério Público? Não. É a imprensa? Não. Então, quem?”, pergunta, apontando para o óbvio: só os acusados pela morte de Eliza têm “motivação” para colocar em risco a vida da testemunha. Apesar disso, os advogados de defesa também pediram à Justiça que Jorge Luiz fosse ouvido – e não há como dizer se a estratégia foi jogo de cena. O objetivo, alegaram, era o de obriga-lo a explicar as acusações “infundadas” contra Bruno e seus amigos.

Jorge prestou pelo menos outros três depoimentos até que, no último deles, na Vara da Infância, resolveu tentar ajudar Bruno, reduzindo a participação do primo no crime. O MP, no entanto, não tem dúvidas de que a primeira versão apresentada é a mais confiável. Todas estão no processo, e acusação e defesa tentarão jogar com elas diante dos jurados.

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Sequestro – O depoimento de Jorge Luiz vai desde quando ele próprio, no Rio de Janeiro, agrediu Eliza com uma coronhada na cabeça dentro da Range Rover do goleiro – que fez as manchas de sangue da jovem, identificado com exame de DNA – até os momentos finais, em que ela foi executada pelo ex-policial Marcos Aparecido dos Santos, o Bola. “Quando ele viu a casa (de Bola) começou a se urinar dentro da viatura”, conta um policial civil, descrevendo o pavor que o jovem desenvolveu das cenas que, em seguida, descreveria detalhadamente para a polícia.

A alternativa encontrada pela acusação é a de ouvir alguém que possa atestar todo o trauma que Jorge Luiz desenvolveu a partir de sua participação no caso e ao presenciar a morte de Eliza. Uma assistente social que acompanhou todo o depoimento de Jorge, desde que ele esteve na Divisão de Homicídios de BH pela primeira vez, foi ouvida na semana passada, no município de Tangará da Serra, no Mato Grosso. É ela quem confirma que em momento algum o então adolescente sofreu qualquer tipo de constrangimento ou ameaça por parte da polícia – como chegaram a alegar advogados de Bruno.

Vídeo – Morto em agosto, Sérgio Rosa Sales também teria valorosas informações para apresentar ao júri. Foi ele quem fez a reconstituição, dentro do sítio de Bruno, em Esmeraldas, dos minutos finais vividos por Eliza. Para o depoimento de Sérgio, no entanto, há uma alternativa: o relato que fez à polícia foi filmado, e será levado para os jurados pelo promotor Henry Vasconcelos Castro. Foi Sérgio, por exemplo, quem revelou que Bruno, Macarrão e seu primo Jorge atearam fogo aos pertences de Eliza depois do crime. O material colhido – inclusive fotos do filho de Eliza carbonizadas – são uma das principais evidências do crime. “Quem viajaria sem malas ou queimaria as fotos do filho recém-nascido?”, questiona o promotor.

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Outras duas testemunhas que pouco contaram foram os caseiros do sítio do goleiro. No próprio dia 26 de junho de 2010, quando a Delegacia de Homicídios de Contagem conseguiu recapturar o filho do goleiro, que havia sido entregue a um amigo de Dayanne, ex-mulher de Bruno, dando início à investigação da morte de Eliza, o casal foi ouvido mas limitou-se a dizer que pouco sabia. Duas semanas mais tarde, voltaram a depor. A esta altura, já tinham mudado de endereço, deixando toda a vida em Esmeraldas para trás.

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