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Xi Jinping não é oficialmente o ‘presidente’ da China; entenda por que

Líder chinês tem três títulos principais, nenhum com o termo 'presidente'; ele ainda estaria buscando reviver um cargo poderoso extinto após a morte de Mao

Por Caio Mattos 12 set 2020, 11h57

Não, Xi Jinping não detém o cargo de “presidente” da China. Isso não significa que ele deixe de ser o líder de facto da segunda maior economia do mundo. Pelo contrário, esse detalhe, burocraticamente entediante, explica um pouco o sistema político chinês e, por conseguinte, o jogo político por meio do qual Xi busca emular o poder do fundador da República Popular da China, Mao Tse-tung.

Xi não é “presidente”, pois esse cargo nem existe na China desde 1975. A confusão na mídia ocidental surge por um problema de tradução para o inglês da atual Constituição chinesa, datada de 1982. A Carta Magna prevê a atribuição de 中华人民共和国主席, que, em inglês, se traduz melhor para chairman of the People’s Republic of China. Mesmo assim, a imprensa anglófona opta em sua maioria pelo president.

Em português, a situação é ainda pior, já que não há correspondente a chairman. Tendo como base o Cambridge Dictionary, que define chairman como “uma pessoa responsável por uma reunião ou uma organização”, uma expressão próxima seria “diretor-executivo”. 

Apesar de presidente ser a escolha mais óbvia para facilitar o entendimento da maior parte da população ocidental, o termo chairmen, próprio do mundo dos negócios, presta a uma narrativa particular das autoridades chineses alheia ao Ocidente, acostumado a chamar Pequim de uma autocracia. O governo se apresenta como um regime meritocrático, no qual as autoridades são definidas pela estrutura hierárquica e o crivo do Partido Comunista da China (CPC).

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Mas, além disso, a confusão entre chairman e president “permite Pequim a contar duas histórias radicalmente diferentes”. O uso do termo presidente pela imprensa ocidental confere uma conotação democrática a Xi, o que reforça sua imagem de defensor da globalização.

Enquanto isso, no plano interno, onde quase ninguém chama Xi de presidente, a população é submetida a um sistema iliberal e totalitário. Em números pesquisar “chairman Xi Jinping” no Baidu (o Google chinês) resulta em cerca de 28 milhões de respostas, enquanto que “presidente Xi Jinping” apenas duas.

Xi Jinping aplaude o resultado da votação durante a terceira sessão plenária da primeira sessão do 13º Congresso Nacional do Povo, no Grande Salão do Povo em Pequim. A votação envolveu a extinção do limite de mandatos para chairman da República Popular da China – 11/03/2018 (Fred Dufour/AFP)

Os três títulos

Diretor da República Popular da China é apenas um dos três principais títulos de Xi, e, ainda por cima, o menos poderoso. Como líder, ele pode promulgar leis, apontar ministros e representar o país internacionalmente, mas apenas “de acordo com as decisões do Comitê Permanente do Congresso Nacional do Povo”.

É nesse ponto que entra em cena o principal título de Xi. O Comitê Permanente do Congresso Nacional do Povo a mais alta cúpula do Partido Comunista, atualmente composta por sete membros é presidido pelo secretário-geral do CPC, cargo ocupado atualmente por… Xi.

Ele, de fato, chegou ao poder como secretário-geral, em novembro de 2012. Por tabela, Xi foi formalizado em março do ano seguinte como chairman da República Popular da China e, seu terceiro título, diretor da Comissão Militar Central, responsável por liderar as Forças Armadas da China.

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Os três títulos são ocupados ao mesmo tempo por uma mesma pessoa desde o início dos anos 1990, embora não haja nenhuma regra explícita para isso. Os cargos de líder da China e diretor da Comissão Militar Central são eleitos pelos mais de 2.900 membros do Congresso Nacional do Povo, órgão legislativo do governo central, enquanto que o secretário-geral é eleito indiretamente pelo Congresso Nacional do CPC.

O cargo de Mao

A imprensa internacional e especialistas em política chinesa discutem desde meados de 2017 a possibilidade de Xi estar de olho em um quarto título, mais poderoso do que todos os outros e extinto desde o fim da era Mao: líder do Partido Comunista da China.

Como diretor do CPC, o ditador pôde se impor mais livremente sobre as decisões do partido, resultando em fenômenos como a Revolução Cultural. Mao também não precisou se preocupar com limite de mandatos.

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Esse cargo foi extinto por Deng Xiaoping em 1982, seis anos após a morte de Mao, na tentativa de conter qualquer personalidade de se sobrepor demasiadamente sobre o coletivo do partido. Xi busca restaurar o cargo de no próximo Congresso Nacional do Partido, em 2022 quando ele, aos 69 anos, terá ultrapassado a idade não-oficial de aposentadoria para secretário-geral do CPC.

Cartazes com imagens de Xi Jinping e de Mao Tse-Tung são exibidos em um mercado em Pequim – 12/03/2018 (Roman Pilipey/EFE)

Em sua campanha para emular Mao, Xi já aboliu em 2018 o limite de dois mandatos de cinco anos para líder da China, outra medida que havia sido imposta por Deng em 1982. O segundo mandato do atual líder chinês se encerra em 2023.

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Assim, o atual líder chinês poderá se reeleger para o seu terceiro mandato em 2022. Segundo o jornalista Katsuji Nakazawa em artigo para o portal de notícias Nikkei Asian Review, uma eventual reeleição “proporcionará a Xi um poderoso meio de dissuasão” para reviver o cargo de líder do CPC no mesmo ano.

‘Ato de Denominação do Inimigo’

Enquanto Xi consolida seu poder em Pequim; do outro lado do mundo, em Washington, nos Estados Unidos, um congressista americano apresentou neste agosto uma proposta de lei para proibir que o governo federal denomine Xi como presidente.

“Dirigir-se ao chefe de estado da República Popular da China como um ‘presidente’ garante a suposição incorreta de que o povo do estado, por meios democráticos, legitimou prontamente o líder que os governa”, afirma na proposta de lei o seu autor, o deputado republicano Scott Perry.

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Segundo o rascunho original da proposta, batizada de “Ato de Denominação do Inimigo”, o governo federal americano será proibido de emitir qualquer documento que se refiram ao líder chinês como “qualquer coisa” que não secretário-geral. A proposta ainda não passou pela avaliação do Comitê de Relações Exteriores da Câmara, etapa que antecede os votos em plenário em ambas as casas do Congresso.

O instituto de análise estatística Skopos Lab estima que ela tenha 1% de chance de se tornar lei.

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