Mar Marín.
Buenos Aires, 15 dez (EFE).- A arrasadora vitória eleitoral de Cristina Fernández de Kirchner, a primeira presidente latino-americana a se reeleger por votação popular, marcou o ano na Argentina, que conseguiu escapar dos efeitos da crise internacional e manter um crescimento sustentado.
Avalizada por 54,1% dos votos nas eleições de outubro, Cristina começou no último dia 10 de dezembro uma legislatura com maioria absoluta no Parlamento e tranquilidade para governar enquanto uma oposição dividida e enfraquecida se mostrou incapaz de pactuar uma estratégia comum contra o Governo.
A presidente, de luto desde outubro de 2010 pela morte de seu marido e antecessor, Néstor Kirchner, ignorou as regras do protocolo e foi à cerimônia de posse com um elegante vestido preto e jurou seu cargo por ‘ele’ (Kirchner).
Para enfrentar o novo mandato, até 2015, Cristina apostará na continuidade – com apenas três incorporações à primeira linha de Governo – e se apoiará nos quadros da Cámpora, a organização das juventudes peronistas criada por Kirchner e impulsionada por seu filho mais velho, Máximo.
Após um Governo marcado pelo chamado ‘modelo K’, criado pelo ex-presidente, a governante começou a aplicar em 2011 seu próprio projeto e abriu passagem para o ‘cristinismo’, como os analistas locais batizaram o estilo de Cristina.
Depois da morte de Kirchner, a presidente baixou o tom agressivo, buscou melhorar as relações com as patronais agrárias – protagonistas de um confronto que provocou uma severa crise política em 2008 -, se afastou de organizações peronistas de base e com os sindicatos verticais e se rodeou de um reduzido grupo de jovens com formação técnica.
Manteve a essência do modelo econômico de Kirchner, baseado em impulsionar o consumo para garantir o crescimento – acima de 8% entre janeiro e novembro -, mas não conseguiu que a riqueza do país se traduzisse em uma melhor distribuição dos recursos nem reduzir significativamente a pobreza.
Também não pôde controlar a inflação, que organismos independentes cifram em 25% contra a taxa oficial de 8%, nem gerar confiança suficiente para frear a fuga de capitais e a dolarização dos fundos bancários.
Legitimada por seu contundente triunfo eleitoral, nos últimos meses do ano antecipou ajustes de ‘sintonia fina’ para blindar a economia argentina do impacto da crise europeia.
Uma sintonia que se traduziu na suspensão dos milionários subsídios a serviços básicos – luz, água e gás -, que, provavelmente, se estenderá também à eliminação das subvenções ao transporte.
A medida já tinha sido reivindicada por economistas e analistas e permitirá a Cristina contar com um maior volume de fundos para realizar outras reformas pendentes, mas, se não aplicar os controles pertinentes, pode contribuir para disparar ainda mais a inflação.
Paralelamente, a presidente tenta impulsionar a produção nacional e reduzir o déficit comercial argentino, especialmente as diferenças com o Brasil, seu principal parceiro.
Além disso, aposta em consolidar a tímida aproximação com Washington e procura novos mercados – como a China – se distanciando de uma Europa com problemas que, segundo Cristina, está cometendo os mesmos erros que levaram à Argentina à crise econômica, política e social de uma década atrás e da qual, nas palavras da presidente, o país saiu graças ao ‘modelo K’.
Embora a Argentina de 2011 não seja nem sombra da de 2001, Cristina Kirchner tem ainda uma importante tarefa se quiser ser fiel a uma de suas promessas eleitorais: a redistribuição da riqueza.
No país que um dia foi conhecido como ‘celeiro do mundo’, milhares de pessoas vivem de revirar o lixo nas grandes cidades e 700 mil crianças sofrem problemas de desnutrição, segundo dados de universidades e organizações não-governamentais. EFE