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Seis pontos para entender a disputa por Jerusalém

Sagrada para três religiões, a cidade é palco de conflito milenar

Por Julia Braun Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 8 dez 2017, 22h09 - Publicado em 8 dez 2017, 22h09

Na quarta-feira, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou sua decisão de reconhecer Jerusalém como a capital de Israel e transferir a embaixada americana para a cidade. A medida imediatamente provocou críticas em todo o mundo.

O status de Jerusalém é central no conflito palestino-israelense e a decisão unilateral de Trump pode ter grande peso no futuro das negociações entre as duas partes. Israel a controla desde 1967, mas os palestinos reivindicam a parte oriental da cidade sagrada como capital de seu futuro Estado.

“A decisão americana é uma virada no jogo das relações entre israelenses e palestinos”, diz o norueguês Dag Henrik Tuastad, professor e especialista em Oriente Médio da Universidade de Oslo. “Isso significa que os palestinos podem reconsiderar sua estratégia de cooperação com Israel, pelo menos a curto prazo”, afirma.

O fim da colaboração da Autoridade Palestina poderia levar a um aumento significativo da violência na região, já que a polícia árabe é a grande responsável por conter ataques terroristas contra os israelenses.

Entenda alguns dos principais pontos sobre a história da cidade e a importância da decisão anunciada por Donald Trump.

1. Como começou o conflito?

A disputa por Jerusalém é milenar. Somente nos últimos 100 anos, a cidade já foi controlada pelo Império Otomano, Reino Unido, conjuntamente pela Jordânia e por Israel e, desde 1967, inteiramente por Israel, apesar do seu status internacional oficial.

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A aprovação do Plano de Partilha da Palestina em 1947 garantiu o regime internacional de Jerusalém administrada por um conselho tutelar da ONU. A medida, porém, nunca entrou em vigor.

Em 1948, foi proclamado o Estado de Israel e, pelas duas décadas seguintes, arame farpado, barreiras de concreto e minas terrestres dividiram a cidade, enquanto árabes e israelenses lutavam pelo seu controle.

Durante a Guerra dos Seis Dias, em 1967, Israel reuniu forças e ocupou toda a área de Jerusalém Oriental, incluindo a Cidade Velha, então controlada pela Jordânia. A Lei de Jerusalém, aprovada oficialmente em 1980, declarou como capital israelense a cidade “completa e unida”. A ONU condenou a decisão em várias de suas resoluções como uma violação ao direito internacional.

Desde então, o status da cidade, e especialmente os seus lugares sagrados, continuam a ser uma questão central no conflito palestino-israelense.

2. Quem controla a cidade atualmente?

Israel considera Jerusalém parte integral de seu território. A cidade é sua capital e sede do governo, embora não seja reconhecida como tal pela ONU e pela comunidade internacional. Apesar das reivindicações palestinas sob porção oriental da cidade, o governo israelense a cidade em sua totalidade.

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Jerusalém é governada por um Conselho Municipal e por um prefeito, eleito a cada cinco anos. Além disso, toda a segurança de Jerusalém é feita pelas forças de Israel.

Os israelenses também ocupam áreas consideradas palestinas pelos árabes e pela comunidade internacional. Os chamados assentamentos variam grandemente: alguns deles são bairros residenciais comuns que simplesmente se localizam total ou parcialmente para além da Linha Verde –a linha de controle que determinava as zonas de controle pré-1967, dividindo a cidade entre israelenses e jordanianos–, outros são comunidades fechadas, em meio a bairros majoritariamente árabes, com guardas armados nas entradas. Comunidade israelenses similares também estão presentes na Cisjordânia.

3. Por que a cidade é sagrada para tantas religiões?

Apesar de ser o foco de disputas e violência entre grupos políticos e religiosos diferentes, a cidade é igualmente sagrada para todos. A Cidade Velha, o coração de Jerusalém, é dividida em quatro bairros: cristão, muçulmano, judeu e armênio. Cercada por um muro de pedra e repleta de becos estreito e arquitetura histórica, é lar de alguns dos locais mais venerados do mundo.

(Arte/VEJA.com)

Dentro do bairro cristão está a Basílica do Santo Sepulcro. De acordo com a maioria das tradições cristãs, foi nesse local que Jesus teria sido crucificado, sepultado e ressuscitado. A igreja é administrada e repartida entre as igrejas Católica Romana, Católica Ortodoxa, Armênia, Ortodoxa Copta, Ortodoxa Siríaca e a Igreja Ortodoxa Etíope.

Apesar de também serem cristãos, os armênios possuem seu próprio bairro na cidade, o menor de todos. Ali está a igreja e monastério de São Tiago, onde a comunidade preserva sua cultura e civilização particular até hoje.

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Um dos locais mais sagrados para os judeus é o muro que suportava o Segundo Templo de Herodes, o Muro das Lamentações, assim chamado pela alusão à lamúria dos judeus em suas preces pela destruição de seus dois templos sagrados. O local é aberto 24 horas e recebe milhares de judeus para oração.

O quarteirão muçulmano é o maior dos quatro e onde está a mesquita de cúpula dourada conhecida como o Domo da Rocha. A  mesquita fica sobre uma rocha circular, que é o local mais sagrado do judaísmo: Abraão teria tentado sacrificar seu filho Isaque sobre a pedra e, segundo a tradição, aí ficava o ponto mais importante dos dois templos judaicos. Já para os muçulmanos, a rocha seria o local de onde Maomé ascendeu aos céus acompanhado do anjo Gabriel e mencionado na Sura 17 do Corão. Ao lado do Domo da Rocha está a mesquita de al-Aqsa, terceiro local mais sagrado no Islã. A área onde ambas mesquitas estão é conhecida como Haram al-Sharif (Nobre Santuário, em árabe), para muçulmanos, e como Monte do Templo para os judeus.

4. Por que a comunidade internacional não reconhece a cidade como capital oficial de Israel?

Jerusalém possui uma história de mais de 6.000 anos, com pelo menos metade desse tempo reconhecida como cidade. O corte histórico determina o domínio sobre Jerusalém: em 1.000 a.C. a cidade era a capital judaica do Rei David, cerca de 950 anos mais tarde a cidade era domínio romano, e no século 16 passaria para as mãos do Império Otomano (que em grande parte constituiu a Turquia atual). A posição da comunidade internacional sobre Jerusalém, no entanto, se baseia amplamente no status da cidade ao término do Mandato Britânico em 1948 e nas linhas do armistício entre Israel e os países árabes em 1949: o conflito deve ser negociado entre as israelenses e palestinos até que se chegue a uma solução unânime.

As declarações das Nações Unidas sugerem que, no futuro, a cidade poderia se tornar capital conjunta de Israel e de um futuro Estado palestino. A grande maioria dos países segue essa linha de entendimento e, portanto, não reconhece Jerusalém como capital israelense.

Todos os países mantêm atualmente suas embaixadas em Tel-Aviv, principal centro comercial de Israel. Nem sempre isso foi assim. Mesmo sem o reconhecimento explícito de Jerusalém como capital israelense, dezesseis países já mantiveram embaixadas na cidade desde 1950: Bolívia, Chile, Colômbia, Costa do Marfim, Costa Rica, Equador, El Salvador, Guatemala, Haiti, Holanda, Panamá, Quênia, República Dominicana, Uruguai, Venezuela e Zaire (atual República Democrática do Congo).

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Porém, uma resolução da ONU aprovada após a proclamação de Jerusalém como capital oficial de Israel em 1980, ordenou a transferência das embaixadas de todos os Estados-membros da cidade. Costa Rica e El Salvador foram os últimos a mudarem suas missões diplomáticas para a região de Tel -Aviv, entre 2005 e 2006.

Fiéis seguram velas na Basílica do Santo Sepulcro, na Cidade Velha de Jerusalém (Nir Elias/Reuters)

5. Por que os Estados Unidos decidiram reconhecer a cidade ?

A transferência da embaixada dos Estados Unidos para Jerusalém e o reconhecimento da cidade como capital de Israel já eram previstos por uma lei aprovada no Congresso americano em 1995. A legislação determinava que a mudança deveria ser concretizada até maio de 1999, porém estabelecia a possibilidade de adiamento do prazo a cada seis meses em nome de interesses de segurança nacional americana, caso necessário.

Todos os presidentes americanos se utilizaram da cláusula de adiamento desde então –mesmo Donald Trump, em junho de 2017, decidiu adiar a mudança por mais um período. A nova data para determinar se a mudança ocorreria ou não expirou na última sexta, 1º de dezembro.

Trump revelou ao mundo sua decisão na quarta-feira. O reconhecimento da cidade como capital israelense era uma promessa de campanha eleitoral. O republicano buscou honrar o compromisso com sua base eleitoral.

6. Qual a importância da mudança de endereço da embaixada?

A decisão de transferir a embaixada dos Estados Unidos de Tel-Aviv para Jerusalém só reforça o reconhecimento americano da cidade como capital israelense. “A transferência tem um peso muito grande, é quase como anunciar o fim do status internacional de Jerusalém”, diz Marcelo Suano, fundador do Centro de Estratégia, Inteligência e Relações Internacionais (CEIRI).

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Os Estados Unidos serão a única nação a manter sua embaixada na cidade atualmente, porém o apoio internacional de uma das maiores potências mundiais poderia desequilibrar as conversas de paz entre Israel e palestinos. A decisão de Trump vai na contramão daquilo que foi estabelecido pela comunidade internacional nos últimos anos e poderia significar, inclusive, o fim da era de negociações entre os dois lados.

Para o prefeito de Jerusalém, a mudança da embaixada será um processo simples, já que os Estados Unidos já possuem um Consulado-Geral na cidade e bastaria uma alteração do status da representação diplomática e a transferência do embaixador e de outros funcionários de Tel-Aviv.

Suano, contudo, alerta para os altos custos e a complexidade do procedimento. “A transferência deve demorar aproximadamente seis meses, pois envolve custos da mudança do corpo diplomático e custos de segurança, pois o ato de Trump pode desencadear uma nova intifada e atos terroristas de grupos como o Hamas”, afirma.

Informações na imprensa americana, contudo, dão conta de que os americanos planejam construir um novo edifício na cidade, adequado às suas necessidades políticas, de pessoal e de segurança. Se essa for a opção do país, a previsão é de que se leve pelo menos três anos até que a embaixada dos Estados Unidos deixe Tel -Aviv.

(Arte/VEJA.com)

(Colaboraram Gustavo Silva e Solly Boussidan)

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