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Quem é Fetullah Gülen, o muçulmano mais influente do mundo

Seria o líder religioso islâmico um lobo em pele de cordeiro? Na mesma medida em que Gülen aumenta sua influência no mundo, crescem as suspeitas em torno de suas instituições e reais intenções

Por Diego Braga Norte 13 jan 2014, 06h28
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  • Empreendedor bem-sucedido com influência global e milhões de admiradores, autor de livros de sucesso e inspiração para uma rede comunitária mundial que administra centenas de instituições e bilhões de dólares… os predicados do turco Fetullah Gülen poderiam lhe credenciar como um exemplo a ser seguido. Mas este não é bem o caso. Aos 72 anos, o líder religioso, filósofo, escritor, educador e espécie guru de autoajuda está longe de ser uma unanimidade como paradigma de self-made man de sucesso. Apontado como o muçulmano mais influente do mundo, ele voltou à baila dos acontecimentos globais ao ser apontado como o arquiteto por trás da recente reviravolta política na Turquia. Dono de um discurso tão magnético para alguns como escorregadio para outros, o clérigo turco tenta consolidar sua imagem de defensor de um islamismo light. As intenções de Gülen não são explícitas e atraem muitas suspeitas.

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    O homem que figura entre as cem pessoas mais influentes do mundo segundo a revista Time inspirou um movimento de grande apelo, que mistura filantropia e negócios. Também conhecido como ‘Hizmat’ (Serviço, em turco), o movimento que hoje é uma das maiores redes muçulmanas do mundo não tem estrutura formal, nenhuma organização visível e nenhuma forma oficial de associação. “O movimento é organizado como um culto”, disse um pesquisador francês à rede France 24.

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    Um dos maiores grupos de comunicação da Turquia é ligado a Gülen. Mas a faceta mais tentacular do movimento são as instituições de ensino de inspiração gulenista, espalhadas por mais de cem países. As escolas – infantis e de nível superior – funcionam em países que vão do Quênia ao Cazaquistão, passando por Estados Unidos e nações da Europa, além, é claro, da Turquia. Muito fechados e discretos, os colégios geralmente possuem instalações hi-tech e muitos alunos têm bolsas de estudos financiadas por empresários fieis ao movimento. As instituições são descritas como seculares, embora os professores tenham de se apresentar como ‘modelos morais’ – fumar, beber e ser divorciado são atitudes malvistas. Mulheres também têm pouca voz e não ocupam posições de chefia no Movimento Gülen.

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    Apelo emocional – Essa perspectiva internacional é um atrativo para empresários, mas o maior contingente de apoiadores do Movimento é formado por pessoas comuns, que doam entre 5% e 20% de sua renda mensal. Muito organizados, os gulenistas deram uma pequena – mas significativa – amostra de seu poder de mobilização em 2008, quando Fetullah Gülen venceu uma eleição on-line de mais “importante intelectual do mundo”, promovida pelas prestigiadas revistas ocidentais Prospect e Foreign Policy. “O apelo de Gülen sempre foi mais emocional do que intelectual. Ele não é um pensador sofisticado, mas, no momento em que a grande maioria dos muçulmanos na Turquia e no mundo está revoltada com a violência dos extremistas islâmicos como os da Al Qaeda, a insistência de Gülen em dizer que o Islã é uma religião de paz e amor tem forte apelo para muitas pessoas”, explica Gareth Jenkins, analista do Institute for Security and Development Policy, um centro sueco de pesquisas e analises geopolíticas.

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    Apesar da postura “paz & amor” do líder religioso, Ekrem Güzeldere, cientista político alemão de ascendência turca, que mora em Istambul e trabalha como analista no think tank ESI (European Stability Initiative), aponta um sério problema em relação ao movimento: a falta de transparência. “O Movimento Gülen não é transparente, portando-se quase como algo clandestino”, pontua. “Francamente, não sabemos quais são os planos exatos de Fetullah Gülen, mas certamente ele adoraria ver uma sociedade com maior papel da religião na vida pública e política, mas não há sinais de que isso seria semelhante a um Estado islâmico baseado na sharia [lei islâmica] como Arábia Saudita ou Irã”, completa o analista.

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    Jenkins se arrisca a apontar os passos que o clérigo islâmico estaria disposto a seguir: “Gülen quer remodelar a sociedade turca de acordo com suas crenças islâmicas conservadoras. Ele é um discípulo do ativista islâmico Said Nursi (1873 – 1960), que defendeu uma estratégia em três fases: 1) islamizar o indivíduo; 2) islamizar a sociedade; e 3) islamizar o Estado e introduzir a sharia. Não está claro se os seguidores gulenistas apoiariam a sharia, mas Gülen certamente quer o poder político para tornar a Turquia um país mais conservador”. Um cenário com governo e sociedade controlados por leis islâmicas é tudo o que a Turquia não precisa – desde 1999 o país tenta entrar oficialmente na União Europeia e uma das condições para ingressar no bloco é justamente a laicidade do Estado.

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    Infiltrados – Em reportagem recente, o jornal The Christian Science Monitor destacou que os seguidores do clérigo geralmente são bem barbeados, educados no ocidente e dominam o inglês, contradizendo os estereótipos dos islamitas na Turquia. Opositores de Fetullah Gülen lembram-se de um vídeo que surgiu em 1999, em que ele parecia dizer a seus seguidores para tentar se infiltrar na principais estruturas de poder. “Você deve se mover dentro das artérias do sistema, sem que ninguém perceba a sua existência, até chegar a todos os centros de poder. É preciso esperar até o momento em que você tenha todo o poder do Estado, até que você tenha ao seu lado todo o poder da instituição constitucional na Turquia”, disse o líder religioso. No mesmo ano de 1999, depois de ser acusado judicialmente de conspirar contra o Estado secular turco, Gülen passou a viver exilado nos EUA. Desde então sua influência, inclusive no Ocidente, só aumentou. Enquanto isso, na Turquia, o processo contra o líder religioso foi retirado pela Justiça.

    Nos EUA, ele pleiteou e conseguiu o Green Card – documento concedido pelo governo americano para os estrangeiros que desejam morar legalmente no país. Não pesa sobre ele nenhuma acusação de envolvimento em atos terroristas. Ao que tudo indica, a Casa Branca não o vê como um chefe islâmico radical, mas como alguém que deve ser acompanhado dado o poder financeiro (estima-se que Gülen controle mais de 25 bilhões de dólares) e influência. Morando confortavelmente em um misto de resort e quartel general em Saylorsburg, na Pensilvânia, o líder religioso raramente aparece em público. Numa das suas raríssimas entrevistas – concedida em agosto do ano passado à revista americana The Atlantic (leia a íntegra, em inglês) – ele disse que é um homem doente e tímido, daí sua reclusão. “Eu não tenho necessidade de me promover. Simplesmente compartilho ideias nas quais acredito com as pessoas que estão à minha volta”, disse. Ele também se esquivou ao falar sobre as escolas gulenistas ao redor do mundo, dizendo que não está envolvido pessoalmente na operação de nenhuma das instituições, e que sua função é apenas “pensar e pregar”.

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