Protestos em cidadezinha chinesa incomodam Pequim
Vigor da manifestação torna singular os atos ocorridos nos últimos três meses em Wukan, localidade de 20.000 habitantes
A cidade de Wukan, no sul da China, voltou a ser palco de protestos por disputa de terras nesta quinta-feira, um dia após a morte do camponês Xue Jinbo – que estava preso desde manifestação anterior. O vigor dos protestos na localidade de 20.000 habitantes, iniciados em setembro, começa a incomodar Pequim.
Mais de mil pessoas participam dos atos regularmente. As principais autoridades fugiram. Os militares lotados no local estão sob investigação por terem abandonado a guarnição. Na sexta-feira da semana passada, a polícia contra-atacou, invadindo a localidade e prendendo lideranças. Mas, quando os policiais tentaram reeditar a operação, no dia seguinte, encontraram estradas bloqueadas com troncos de árvores.
Os habitantes da cidade acusam as autoridades locais de terem expropriado suas terras sem compensação e as entregado a empresas – os governantes afirmam que seguiram o procedimento legal. Protestos por terra têm se mostrado relativamente comuns nos últimos anos no interior da China – sobretudo quando autoridades buscam no incentivo à urbanização uma forma de aumentar suas rendas.
Especialistas do núcleo Stratfor – conhecido por análises certeiras a respeito de episódios de conflito como os de Kosovo – enumeram três características que tornam a situação de Wukan singular. Em primeiro lugar, a duração dos protestos. Se, em geral, manifestações do tipo são rapidamente amainadas com a cooptação de líderes ou com a concessão parcial de benefícios, os atos em Wukan já duram três meses.
Em segundo lugar, o número de manifestantes. Os analistas enfatizam que, apesar de aproximadamente mil pessoas terem participação ativa nos protestos, os ativistas conquistaram a simpatia de toda a vila. O terceiro ponto citado pelos analistas é a reação das autoridades. Após a fuga e a resistência encontrada na tentativa de uma segunda incursão na aldeia, os militares tiveram de pedir reforço a localidades vizinhas para cercar o povoado.
Em situações normais, protestos dessa natureza não se configuram em ameaça ao governo central – que tem a possibilidade de intervir contra as autoridades locais, alvo direto dos protestos, e até conquistar simpatia ao fazer concessões. A notória desaceleração da economia chinesa, no entando, tem dificultado esse tipo de atuação por parte de Pequim.
Se novos protestos como o de Wukan emergirem em outras localidades do vasto território chinês, Pequim terá de utilizar a força de forma mais intensa. O risco é o foco de as manifestações se voltar especificamente para o governo central. Neste cenário, o partido comunista pode ser colocado em questão – e o recrudescimento de Pequim será inevitável.