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Por que um terço dos latinos deve votar em Donald Trump?

Apesar de políticas anti-imigração e insultos dirigidos à comunidade hispânica, republicano retém votos cruciais que podem garantir vitórias em swing states

Por Amanda Péchy Atualizado em 1 out 2020, 15h50 - Publicado em 30 set 2020, 10h43

A coleção de insultos do presidente Donald Trump aos latinos é extensa. Não só fez da construção do muro entre os Estados Unidos e México seu grito de guerra pessoal, como também separou crianças de seus pais na fronteira, colocando-as em jaulas.

Trump disse que o juiz da Suprema Corte Gonzalo Curiel não podia ser imparcial, porque era hispânico, que El Salvador era um “país de merda” e que mexicanos eram “estupradores”. No novo livro-bomba do advogado Michael Cohen, ele relembra uma das falas de seu antigo cliente: “Eu nunca terei o voto hispânico. Como os negros, eles são estúpidos demais para votar em Trump”.

Mesmo assim, quase um terço dos eleitores latinos deve votar no republicano. Pesquisas de opinião mostram que Trump terá 30% dos votos do grupo, contra 60% de seu adversário, o democrata Joe Biden. É uma imagem quase estática em relação a 2016, quando recebeu 28% (um ponto percentual a mais que Mitt Romney obteve em 2012).

O presidente Donald Trump, na ‘Mesa Redonda dos Latinos por Trump’, na Flórida – 25/09/2020 (Brendan Smialowski/AFP)

Apesar do Partido Democrata ainda ser o favorito entre o grupo, este um terço pode ser decisivo para o resultado, já que a população latina é expressiva em swing states como Arizona, Flórida, Texas e Pensilvânia – principais campos de batalha na disputa. E embora o atual presidente ainda esteja em desvantagem, o desempenho de Biden é inferior ao de Hillary Clinton em 2016, que liderou o voto latino por 37 pontos percentuais.

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Além disso, pela primeira vez, latinos se tornarão o principal grupo minoritário, ultrapassando afro-americanos pela primeira vez. Um recorde de 32 milhões de pessoas, respondendo por 13,3% de todos os eleitores qualificados.

Mas por que, mesmo com os insultos e calúnias racistas Trump ainda tem apelo dessa parcela dos americanos?

Não é de hoje que latinos votam no Partido Republicano. Desde que o movimento “Latinos con Eisenhower” começou na Califórnia nos anos 1950, pesquisas mostram que de 25% a 30% do grupo demográfico é a favor dos conservadores. A vitória de Richard Nixon, em 1972, foi impulsionada pelo voto latino, e a identidade republicana do grupo se solidificou sob os governos Ronald Reagan e George W. Bush – Reagan concedeu anistia a quase três milhões de imigrantes indocumentados, enquanto Bush falava espanhol e apoiava-se na questão religiosa, obtendo um recorde de 40% dos votos hispânicos.

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“Latinos compartilham muitas opiniões e crenças com republicanos”, diz Loren Collingwood, professor de Ciência Política na Universidade da Califórnia. “Podem não gostar dos insultos, mas seguem fiéis ao partido por conta de sua identidade social”, completa.

As políticas econômicas do Partido Republicano, por exemplo, costumam ser muito atraentes para o grupo demográfico. O livre mercado e impostos baixos ressoam com donos de pequenos negócios. Para se ter uma ideia, o número de empresas de propriedade de latinos aumentou 34% na última década.

Até o início da pandemia, a era Trump havia beneficiado os latinos – pelo menos na frente econômica. As taxas de desemprego do grupo caíram em nível recorde, a renda familiar média estava aumentando e um número crescente de latinos tornou-se proprietário de imóveis.

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Questões sociais também podem exercer uma influência significativa para hispânicos religiosos – geralmente católicos, mas cada vez mais evangélicos. A oposição ao aborto e aos direitos LGBT, por exemplo, pode ser um ponto em comum para muitos latinos. A maioria, inclusive, vêm de países onde o aborto e o casamento gay são ilegais.

O acesso à educação, surpreendentemente, também balança o grupo demográfico para a direita. Latinos priorizam a educação privada, porque na América Latina as escolas públicas são vistas como inferiores. O mantra dos republicanos é a possibilidade de escolha, que significa escolas autônomas (aquelas financiadas pelo governo, mas autogeridas) e vouchers para pagamento pelo ensino privado e, se possível, católico.

A narrativa anti-imigração, principal ponto que poderia afastar os votos desse grupo, pode ser responsável por parte do apelo ao partido. Na tentativa de separar-se dos imigrantes ilegais, que prejudicariam a imagem dos latinos, eleitores ignoram ou não se abalam pelas políticas duras.

“Parte dos latinos tenta distanciar-se de sua linhagem”, diz Collingwood, que também escreveu Campaigning in a Racially Diversifying America: When and How Cross-Racial Electoral Mobilization Works (“Fazendo Campanha em uma América Racialmente Diversa: Quando e como mobilização eleitoral interracial funciona”).

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‘Nem socialistas, nem comunistas, somos capitalistas’: Apoiadores hispânicos de Trump se reúnem para respaldar a campanha ‘Latinos for Trump’ – 25/09/2020 (Marco Bello/AFP)

Trump, que faz a agressiva campanha Latinos For Trump desde março de 2019, também se apoia no discurso da “lei e da ordem” para garantir votos. Ao acusar Biden de ser esquerdista radical, mobiliza hispânicos que vêm de países como Cuba, Venezuela e Nicarágua.

Apoiadores de Joe Biden não hesitam em dizer que o democrata chegou atrasado para a briga pelo voto latino. Ocupado em atingir ex-apoiadores arrependidos de Trump, afro-americanos furiosos com a violência policial e moradores de subúrbios com elevado apreço pela segurança, começou o apelo ao grupo apenas há poucos meses.

“Esse atraso faz com que os latinos se sintam menos importantes aos olhos do Partido Democrata, o que pode prejudicar a campanha”, diz Geraldo Cadava, professor de história da Universidade Northwestern e autor do livro The Hispanic Republican: The Shaping of an American Political Identity, from Nixon to Trump (“O Republicano Hispânico: A formação de uma identidade política americana, de Nixon a Trump”).

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Além disso, Biden é de Delaware, onde a população negra é proeminente e a latina, escassa – o que pode explicar sua defasagem em relação a Clinton, que é de Nova York, quarta maior população hispânica do país. Por enquanto, para tentar alienar seu adversário, a campanha foca-se na má gestão da pandemia de coronavírus, que afetou desproporcionalmente a comunidade hispânica – tanto pelo número de mortos quanto de desempregados.

Foi apenas no dia 15 de setembro que o democrata fez sua primeira visita à Flórida desde tornou-se candidato presidencial. Lá, em uma tentativa ligeiramente constrangedora de causar uma boa impressão, tocou a música “Despacito” no telefone para uma plateia de porto-riquenhos.

O que está em jogo

Trump, por sua vez, fez da Flórida seu estado natal oficial e visita com frequência este importante campo de batalha da corrida pela Casa Branca. Uma nova pesquisa da NBC News/Marist College mostra Trump liderando entre os floridenses latinos, de 50% a 46%.

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Garantir este e outros swing states com o voto latino pode lhe render a reeleição em novembro. Na Pensilvânia, por exemplo, onde Trump venceu em 2016 por apenas 45.000 votos, há 550.000 eleitores porto-riquenhos. É possível obter apoio suficiente para ganhar o voto popular em determinados estados e o voto do colégio eleitoral nacionalmente.

Por isso, o fato de um terço dos latinos se identificarem como republicanos pode fazer toda a diferença nas urnas. Mas ainda não é tarde demais. “Muitos latinos estão insatisfeitos com Trump. Se o Partido Democrata se comprometer, ainda pode usar a mesma estratégia para transformar estados vermelhos em azuis”, diz Cadava.

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