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Nos EUA, Câmara aperta o cerco contra Trump, mas ele resiste

Em depoimento aos congressistas, Robert Mueller fala pela primeira vez sobre as conclusões de seu relatório e frustra quem esperava novas revelações

Por Kátia Mello
Atualizado em 29 jul 2019, 15h14 - Publicado em 26 jul 2019, 07h00

A Câmara de Representantes dos Estados Unidos se animou toda para ouvir, na quarta-feira 24, o depoimento de Robert Mueller III, chefe de uma investigação de quase dois anos para determinar se a interferência russa amplamente detectada no decorrer da campanha eleitoral de 2016 era coisa combinada com Donald Trump — o muito citado “conluio”. Funcionário de carreira do Departamento de Justiça, com passagem de quase doze anos (até 2013) no comando do FBI, Mueller entregou em abril um relatório de 448 páginas concluindo que: 1) não houve conluio e 2) Trump atrapalhou as investigações, mas, na condição de presidente, não pode ser punido por isso. E, assim, encerrou os trabalhos e foi para casa, sem dizer uma palavra. As seis horas de depoimento a três comissões da Câmara foram sua primeiríssima manifestação verbal sobre o tema, e a esperança era que, no calor do questionamento, ele deixasse escapar termos mais fortes sobre as ações de Trump. Nada feito: praticamente só repetiu o que havia escrito.

Mueller começou sua fala avisando que o depoimento seria protocolar. “Fui nomeado para chefiar o trabalho e pretendo seguir à risca esse papel e os padrões do Departamento de Justiça que o governam”, disse. Mostrando certa confusão e lentidão de raciocínio, procurou o tempo todo ater-se palavra por palavra ao que consta no relatório. Mas refutou, sem dizê-lo claramente, o NO OBSTRUCTION — assim, em maiúsculas — que Trump repetiu insistentemente no Twitter após o encerramento dos trabalhos. O presidente apelou, sim, em pelo menos dez ocasiões a medidas que podem ser configuradas como obstrução de Justiça. No entanto, uma norma do Departamento de Justiça determina que o presidente em exercício não pode ser processado, e o assunto foi dado por encerrado. Livrou-­se ali a barra de Trump? “Não é o que o relatório diz”, contemporizou Mueller, diante da pergunta de Jerrold Nadler, presidente do Comitê de Justiça.

Mesmo não detectando conluio, Mueller confirmou ter havido durante a campanha um ataque “amplo e sistemático” por parte de agentes russos. Em um raro momento de veemência, advertiu que a Rússia é uma ameaça à eleição presidencial de 2020 e admitiu temer que a influência estrangeira se repita em todas as votações. “Enquanto estamos aqui sentados, eles se organizam”, disse. A congressista Zoe Lofgren perguntou: “O governo russo sabia que se beneficiaria se um dos candidatos saísse vencedor?”. “Sim”, respondeu o depoente — e mais não disse. No momento de maior comoção entre a oposição democrata, Mueller declarou, cheio de rodeios, que “as conclusões indicam que o presidente não foi inocentado dos atos que supostamente cometeu”. Traduzindo: talvez, quem sabe, ele seja julgado após deixar a Casa Branca.

INABALÁVEL - Trump e Melania na Suprema Corte: tuítes e mais tuítes (Jonathan Ernst/Reuters)

A convocação de Mueller para depor faz parte de um esforço da Câmara, liderada pelos democratas, para apertar o cerco contra o republicano Trump, sobre quem recaem várias acusações que não prosperam na prática: a citada obstrução de Justiça, negociatas bancárias, omissão do imposto de renda, uso do cargo para beneficiar suas empresas e gasto de dinheiro da campanha para comprar o silêncio da stripper Stormy Daniels a respeito do caso que teriam tido, entre outras. Trump entra na guerra com gosto: a saraivada de tuítes contra quatro deputadas novatas — não brancas — especialmente estridentes ao criticarem seu governo, a quem aconselhou “voltar para casa”, continua a render acusações de racismo, por um lado, e concordância, de outro. A liderança do Partido Democrata, tendo à frente a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, não vê com bons olhos o atiçamento dos ânimos anti-Trump, por considerar que ele pode ter efeito inverso e ajudá-lo a reeleger-se no ano que vem.

Antes mesmo de começar a sessão na Câmara, Trump já havia disparado uma meia dúzia de tuítes contra Mueller, contra os integrantes da equipe dele — acusados de militar secretamente na oposição —, contra os democratas e contra opositores em geral. “Então os democratas e outros podem fabricar ilegalmente um crime, tentar grudá-lo em um presidente inocente, e, quando ele luta contra esse ataque ilegal e traidor do nosso país, dão a isso o nome de obstrução? Errado! Por que Robert Mueller não investigou os investigadores?”, bradou logo cedo. Também usou seu canal preferido de comunicação para renovar as críticas ao quarteto de deputadas. A caminho da Suprema Corte com a primeira-dama Melania Trump para prestar homenagem ao falecido juiz John Paul Stevens, devolveu-lhes a acusação de racismo, incrementada pelas expressões “encrenqueiras”, “inexperientes” e, enfiando fundo a faca verbal, “não muito inteligentes”. O tipo de mensagem que leva seu eleitorado à loucura.

Publicado em VEJA de 31 de julho de 2019, edição nº 2645

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