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Malvinas: a guerra que há 30 anos ajudou Thatcher e derrubou a ditadura argentina

Por Por Daniel Merolla
28 mar 2012, 10h25

A guerra das Malvinas que explodiu há 30 anos garantiu a reeleição da vencedora, a primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, enquanto a derrota provocou a queda da ditadura militar argentina, mas não acabou com a disputa pela soberania sobre as ilhas do Atlântico Sul.

A ditadura do general Leopoldo Galtieri, chefe de Estado na ocasião do regime instalado em 1976, cavou a própria cova ao invadir as ilhas na madrugada de 2 de abril de 1982, no que foi considerado como “uma aventura militar, sem preparação nem organização”, segundo o Relatório Rattenbach, nome do general argentino que dirigiu a investigação.

A presidente Cristina Kirchner acaba de suspender o sigilo que pesava sobre o documento, uma grande investigação de pós-guerra feita pelos comandantes militares que sugeriu considerar a prisão perpétua ou pena de morte para Galtieri e outros altos oficiais.

Três dias antes do desembarque de oficiais da Marinha argentina no desguarnecido arquipélago, a ditadura responsável pelo desaparecimento de até 30.000 opositores, segundo organizações de defesa dos direitos humanos, havia sofrido um duro golpe com uma greve da central sindical CGT que comoveu o país, que tinha a economia em colapso.

“Ante a agitação social, a ditadura surpreendeu a população com um ato antiimperialista. Assassinos do porte de Galtieri não podiam encabeçar sinceramente nenhum gesto emancipador”, declarou à AFP o historiador Felipe Pigna, autor do best-seller Os Mitos da História.

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Mas a convocação patriótica ao sentimento de toda uma nação, educada com a informação de que as Malvinas “são e serão argentinas”, produziu uma virada e as praças ficaram lotadas de fanáticos que apoiavam a recuperação das ilhas, ocupadas pelo Reino Unido em 1833, quando expulsaram as autoridades enviadas por Buenos Aires.

A Dama de Ferro britânica passava por um momento ruim por suas impopulares medidas econômicas, mas emergiu da guerra como um paladino da democracia e a libertadora da pequena população das Falklands (a denominação britânica), que hoje tem apenas 3.000 pessoas, em sua grande maioria súditos britânicos.

“Afundem o Belgrano”!

Thatcher despachou uma força-tarefa que combateu nas ilhas e, inclusive, nas áreas vizinhas, onde aplicou um duro golpe com sua ordem “Afundem o Belgrano!”, um antigo cruzeiro americano da II Guerra Mundial que foi torpedeado pelos britânicos, provocando a morte de 323 tripulantes argentinos.

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Os torpedos também destruíram qualquer possibilidade de solução pacífica, num momento em que as nações da América Latina apoiavam uma negociação e a retirada das tropas argentinas com a intervenção dos Capacetes Azuis das Nações Unidas.

Foram 649 os mortos argentinos e 255 os britânicos em 74 dias de conflito, com a rendição das tropas de Galtieri, em sua maioria recrutas sem treinamento, em 14 de junho, três dias depois que o Papa João Paulo II apelou pela paz em sua visita a Buenos Aires.

O Papa calou os falcões da ditadura, que pretendiam duplicar as tropas em defesa do rebatizado Puerto Argentino (Port Stanley, segundo Londres).

A aviação argentina ainda conseguiu danificar e afundar navios da frota britânica, entre eles a fragata “Sheffield”, mas as forças terrestres, mal conduzidas e mal equipadas – que sofreram com o frio, a fome e até torturas de seus próprios superiores – foram arrasadas pela infantaria e pela aviação britânicas.

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“Havia uma Junta Militar que estava tentando sobreviver e fez um cálculo errado de suas capacidades e possibilidades de êxito. O maior erro não foi operacional: foi a guerra”, declarou à AFP Juan Recce, especialista em defesa do Centro Argentino de Estudos Internacionais.

Galtieri, adepto das bebidas, cometeu um erro colossal ao achar que Washington não tomaria partido em favor da Grã-Bretanha e seria neutro, em função da cooperação militar argentina com os contras nicaraguenses e com os governos de El Salvador, Honduras e Guatemala, segundo o Informe Rattenbach.

Se antes da guerra havia colaboração e um ambiente de diálogo com a Grã-Bretanha, depois da guerra Londres se tornou mais dura que nunca na defesa da autodeterminação de seus súditos.

Nada de negociação: nem com ursinhos Puff

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A Argentina tentou desde então quase todos os métodos para que a Grã-Bretanha aceitasse negociar a soberania, como estabelece uma histórica resolução com maioria esmagadora votada pela Assembleia da ONU em 1965.

As relações foram restabelecidas pelo ex-presidente Carlos Menem (1989-1999), que também cristalizou seus sonhos de viajar a Londres, ver a rainha, receber o príncipe Andrew em 1994 e o príncipe Charles em 1999.

Esta estratégia de veludo incluiu ainda que seu chanceler, Guido Di Tella, enviasse de presente aos malvinenses simpáticos ursinhos Puff e oferecesse a eles um milhão de dólares para que aceitassem a soberania argentina.

Tudo foi inútil para realizar uma negociação, assim como tampouco trouxe resultado a dureza dos Kirchner (o falecido ex-presidente Néstor e sua esposa Cristina), ao romper acordos e impedir que até cruzeiros turísticos das Malvinas parassem em território argentino.

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Os malvinenses vivem agora uma era de prosperidade, sob proteção de tropas e barcos britânicos, com elevadas receitas pelas licenças de pesca e de petróleo.

“A novidade é que as comprovadas reservas de petróleo são um ativo estratégico de enorme valor. Isto permite que Londres tenha um recurso vital e dá à ilha um funcionamento autônomo”, disse à AFP Juan Tokatlian, diretor de Ciência Política na Universidade Di Tella e mestre na universidade americana Johns Hopkins.

O cientista político Rosendo Fraga, membro do Instituto de História Militar, disse à AFP que “o grande tema de longo prazo no Atlântico Sul são os recursos naturais da Antártica”.

“O Reino Unido – comentou – reivindica a soberania territorial a partir de sua presença nas Malvinas e esta pretensão se choca com as que sustentam Argentina e Chile”.

Mas, à margem das análises, aquela guerra de 30 anos atrás teve como vencedores Margaret Thatcher, que ganhou muita popularidade e se converteu no primeiro-ministro que permaneceu por mais tempo no cargo em seu país no século XX (1979-1990), e a sociedade argentina, que, enquanto chorava seus mortos e mutilados, recuperou a democracia quando o agonizante regime precisou convocar eleições, em 1983.

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