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Espanha vai às urnas para tentar destravar impasse político

Eleição deste domingo é a quarta em quatro anos; socialista Pedro Sánchez falhou em formar coalizão após pleito de abril e agora luta para sobreviver

Por Amanda Péchy e Caio Mattos
Atualizado em 30 jul 2020, 19h35 - Publicado em 10 nov 2019, 08h00

A Espanha vai às urnas neste domingo, 10, pela quarta vez em quatro anos para tentar formar um governo que tire o país do atual impasse político. O primeiro-ministro socialista Pedro Sánchez foi eleito em abril sem maioria no Parlamento e falhou em formar uma coalizão até 23 de setembro, sendo obrigado a convocar novas eleições. Sánchez tenta desesperadamente se manter no poder, mas, segundo as pesquisas eleitorais, pode mais uma vez entrar em um beco sem saída, e nada garante que não haja uma quinta eleição no ano que vem.

O jornal espanhol El País projeta que seu Partido Socialista dos Trabalhadores Espanhóis (PSOE) vençerá novamente, com menos assentos do que os conquistados no pleito de abril. Dos 350 representantes que compõem o Parlamento espanhol, os socialistas elegeriam apenas cerca de 116, comparados aos atuais 123. Dessa forma, seriam obrigados mais uma vez a tentar negociar uma coalizão. 

Em contrapartida, a direita ganharia espaço. O Partido Popular (PP), de centro-direita, que está em segundo lugar na pesquisa do jornal, pularia de 66 para 94 assentos. A extrema-direita, representada pelo Vox, partido fundado no final de 2013, chega em terceiro, dobrando seu número de parlamentares para 42.

Conquistar outros partidos para formar uma coalizão ou, pelo menos, não derrubar um governo do PSOE continuará difícil para Sánchez. Após as eleições de abril, o premiê tentou negociar com a legenda de esquerda Unidas Podemos para se manter no poder, mas não conseguiu destravar o impasse com o líder do partido, o cientista político Pablo Iglesias.

Dessa vez, o cenário continua problemático. Segundo o El País, o Unidas deve perder assentos no Parlamento após o pleito deste domingo, de 42 para 36 parlamentares. 

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Parlamento fragmentado

Até 2015, a Espanha foi governada pelo PSOE e PP, que se se revezavam no poder. Porém, a partir das eleições de 20 de dezembro de 2015, nenhum governo conseguiu se eleger com maioria e desde então os partidos precisam negociar para formar coalizões e governar. 

Já não basta seduzir apenas partidos de seu próprio espectro político, e insistir no modelo bipartidarista provavelmente não vai resgatar o país do impasse.

“A estabilidade eleitoral foi abalada pela crise econômica de 2008 e os protestos do 15 de maio”, diz Alejandro Tirado, professor de ciência política na Universidade Carlos III de Madrid, referindo-se ao movimento de 2011 contra a hegemonia dos dois partidos e a favor de maior divisão dos poderes. Nas eleições de abril de 2019, a fragmentação cresceu ainda mais; PSOE e PP conseguiram 43% dos votos contra os mais de 47% dos outros partidos. 

A fragmentação foi marcada também pelo fortalecimento do Unidas Podemos e do liberal Ciudadanos (Cs), que no último pleito elegeu 57 parlamentares

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Ascensão da extrema direita

Mais recentemente, a Espanha observou um fenômeno sem precedentes: nas eleições de abril deste ano, o Vox se tornou o primeiro partido da extrema direita a se eleger para o Parlamento desde o fim da ditadura de Francisco Franco, em 1975. Seus restos mortais podem ter sido exumados do mausoléu público, mas seu espírito vive no partido de Santiago Abascal, ex-militante do PP.

Antifeminista, anti-separatismo e anti-imigração, o Vox é a legenda que mais cresce, com um aumento de 9% para 14% das intenções de voto desde setembro. Como um bom partido populista, possui um eleitorado convicto: cerca de 85% dos que votaram na legenda em abril tendem a repetir o ato neste domingo, segundo estudo do instituto de pesquisa espanhol 40dB.

“Mesmo que não se tornem a chave do governo, o estrago já está feito. O Vox obteve representação com um programa quase indistinguível de um partido fascista de quase um século atrás”, afirma Carolina Galais, cientista política da Universidade Autônoma de Barcelona (UAB).

Além de uma base sólida, o partido de Abascal também tem atraído votos do eleitorado mais amplo da direita. Segundo o 40dB, o Vox pode converter até 17% dos eleitores do PP e 14% daqueles que votaram no Cs no último pleito. E, atrás do PSOE, é a segunda legenda que mais conta com apoio daqueles que se abstiveram em abril.

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Ismael Blanco, professor do Instituto de Governança e Políticas Públicas de Barcelona, diz que o crescente apoio à extrema direita pode levar as demais legendas a adotar pautas mais radicais, como a maior repressão aos movimentos independentistas na Espanha, para atrair eleitores. 

“Não apenas o PP e o Cs, mas o PSOE também, estão endurecendo sua posição contra o separatismo da Catalunha”, diz Blanco.

Independentismo catalão

De fato, desde que Sánchez assumiu o cargo de primeiro-ministro, nunca defendeu a independência da Catalunha. Apoiou apenas um novo estatuto regional sobre os direitos dos catalães e de suas instituições políticas e financeiras. A província é a mais rica da Espanha e é responsável por cerca de 20% do Produto Interno Bruto nacional.

Porém, no início de novembro, o líder do PSOE prometeu convencer a Bélgica a extraditar Carles Puigdemont, ex-presidente regional da Catalunha responsável pelo referendo de independência de 2017, para que seja julgado pela Justiça espanhola. O comentário foi visto pelos procuradores do Ministério Público, que são encarregados de processar Puigdemont, como um desrespeito à independência entre os poderes.

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Em protesto contra o Primeiro Ministro Pedro Sanchez em Barcelona, catalães seguram cartazes pedindo que ele ‘sente e converse’ sobre a questão separatista – 30/10/2019 (Albert Gea/Reuters)

A violência sem precedentes nos protestos separatistas nas últimas semanas na Catalunha provocados pela condenação de nove líderes catalães a até 13 anos de prisão pelo referendo de 2017, considerado ilegal ganhou espaço da campanha eleitoral e serviu de munição política contra o líder socialista.

Embora as legendas independentistas como a Esquerda Republicana da Catalunha, que não passou de 15 assentos em nenhuma das últimas quatro eleições tenham pouca potência eleitoral, a radicalização da política na Espanha fortalece o sentimento separatista catalão.

“Um governo sem maioria e com uma presença dominante do Vox aumentaria ainda mais o conflito, tornando impossível um acordo com a Catalunha”, diz Joan Botella Corral, sociólogo e autor de “Democracia na Espanha contemporânea”. Para ele, caso não haja uma reforma política, a escalada violenta na região nordeste do país “pode ser extremamente perigosa”.

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Um novo governo

A melhor chance para Sánchez evitar esse desastre parece ser uma cooperação entre sua legenda e o Partido Popular, que poderia permitir que ele permanecesse no cargo sob uma nova administração frágil e minoritária, já que os dois partidos formariam uma grande coalizão.

Outra possibilidade seria tentar novamente chegar a um acordo governamental com o Unidas Podemos, que também contaria com os partidos catalães pró-independência – tornando-se, também, um gabinete excepcionalmente fraco.

De qualquer forma, o socialista está com as mãos atadas. Para governar e evitar novas eleições no ano que vem, uma coalizão será obrigatória. Alguém vai ter que ceder – e dessa vez, se o impasse permanecer, ficará mais difícil para Sánchez colocar a culpa no radicalismo do Podemos, no sectarismo egoísta do PP ou na tendência de direita dos Ciudadanos.

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