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A política externa da Índia depois das eleições

Novo governo deve buscar alianças estratégicas que afastem ameaça terrorista

Por Jaswant Singh
4 Maio 2014, 16h13

Este mês a Índia vai completar sua maratona eleitoral. Espera-se que um novo governo assuma o poder no final de maio, e se as pesquisas se confirmarem, o partido nacionalista hindu Bharatiya Janata (BJP), que indicou como candidato a primeiro-ministro Narendra Modi, vai liderar esse governo.

Com o lento desempenho econômico da Índia acertadamente dominando a campanha, a questão sobre qual política externa o novo governo deveria seguir permanece sem resposta. Quaisquer que sejam os detalhes, um imperativo é claro: a Índia deve ir além de sua lealdade ao Movimento de Países Não Alinhados (NAM) .

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A melhor demonstração da desordem que a diplomacia NAM provoca talvez tenha sido o recente quase-endosso por parte do governo Indiano da anexação da Crimeia pela Rússia. O primeiro-ministro Manmohan Singh e seu governo parecem ter negligenciado que a China cobiça território indiano e, assim, ficado satisfeitos que a Rússia tenha estabelecido um precedente para que um país poderoso possa menosprezar o direito internacional e apoderar-se de parte de um país vizinho. É como se a política externa indiana estivesse no piloto automático desde a década de 1980, quando o governo quase sempre adotava uma postura pró- Rússia.

A realidade é que o NAM nunca foi particularmente eficaz na hora de manter a Índia fora do conflito, como demonstraram claramente as guerras com a China e o Paquistão em 1962, 1965 e 1971. Em 1971, foi o apoio da União Soviética, e não do NAM, que ajudou a Índia a superar a crise de refugiados causada pelo genocídio do Paquistão em Bangladesh. Da mesma forma, em 1999, a Índia se apoiou na intervenção americana para pressionar o Paquistão a acabar com a agressão nos arredores da cidade Kargil, no Himalaia.

Diante desse histórico, como esperar que a velha diplomacia NAM resolva os desafios de política externa que a Índia enfrenta, especialmente no momento em que a China e o Paquistão estão se unindo para enfrentar a Índia?

A maior ameaça à paz da Índia está em suas fronteiras, especialmente na divisa do Himalaia com a China, a mais longa fronteira disputada do mundo – em particular, porque a incerteza na região facilita a passagem de terroristas empenhados em minar a integridade territorial da Índia e plantar as sementes do conflito étnico e religioso. Enquanto a Índia tem lutado contra o terrorismo por mais tempo que qualquer outro país, o problema agora afeta toda a região, incluindo Afeganistão, China e Paquistão. (Continue lendo o texto)

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Frente à infiltração do terrorismo islâmico em suas fronteiras, a Índia não pode deixar a turbulência no mundo árabe ser administrada por terceiros. Ao invés disso, deve ter um papel ativo nos esforços para contê-la e amenizá-la – e isso significa desenvolver novas alianças estratégicas. Assim como os terroristas criaram uma espécie de ofensiva multilateral, os países que eles ameaçam devem construir uma defesa multilateral.

Para começar, a Índia deve dar as boas vindas – e promover – a distensão nas relações entre os EUA e o Irã. Considerando que ambos os países são amigos da Índia e que os três compartilham muitos interesses estratégicos, um governo indiano ágil poderia ajudar a facilitar uma reaproximação diplomática.

Nesse meio tempo, poderia criar-se lenta e calmamente uma aliança estratégica que apoie a paz nas regiões dos Oceanos Índico e Pacífico – por exemplo entre a Índia, os EUA, o Japão, a Coreia do Sul, a Austrália e o Vietnã – sem impedir a habilidade de quaisquer dos parceiros de estabelecer laços econômicos com terceiros, incluindo a China. A Índia também deve fazer um esforço intenso para renovar as suas relações no Sudeste Asiático, onde corre o risco de abandonar o campo para a China.

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Ao mesmo tempo, a Índia deve desenvolver um acordo estratégico com a China, a Rússia e os EUA em relação à explosão jihadista no Paquistão, Afeganistão e nos países da Ásia Central. Tal acordo teria, é claro, arestas com a Índia, Rússia e China competindo simultaneamente por influência no Afeganistão. No entanto, qualquer tipo de acordo, quaisquer que sejam as suas nuances, é possível e necessário, dado que impedir que o Afeganistão caia novamente em uma guerra civil, ou se converta novamente em uma base exportadora de terrorismo, é do interesse de todos, inclusive do Paquistão.

O próximo governo da Índia também deve estimular a parceria do país com os EUA. Até recentemente, a relação bilateral tendia a ser orientada por uma perspectiva transatlântica, trans-Eurasiana, ignorando a opção transpacífico. Mas a Índia, bloqueada no oeste pelo Paquistão, está cada vez mais olhando para o leste em busca de comércio e parcerias estratégicas. Enquanto explora essas possibilidades, a Índia também pode trabalhar com os EUA para dar forma a uma perspectiva comum na Ásia Central.

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Quanto ao Paquistão, a inação da Índia, impulsionada pelo NAM, deu ao seu inimigo a vantagem de isolá-la estrategicamente. Isso é extraordinário, uma vez que o Paquistão é o principal protetor de forças terroristas da região – e agora, infelizmente, se converteu na vítima dos militantes de seu próprio país.

A saída dos EUA do Afeganistão, em curto prazo, será um revés para toda a região. Mesmo com a retirada de sua infantaria, os EUA não podem ignorar a ameaça que o terrorismo islâmico impõe aos Estados Unidos. É por isso que os EUA vão depender cada vez mais de países como a Índia para garantir o sucesso da sua política global antiterror.

Mas o valor da relação bilateral vai muito além da guerra contra o terrorismo. Os EUA e a Índia também devem estabelecer canais claros para transferência de tecnologia militar, industrial e científica, inclusive no âmbito espacial.

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Qualquer avanço na cooperação EUA-Índia deve ser caracterizado por cuidado e respeito, com objetivos claros, práticos e viáveis. Se ambos os governos dedicarem o tempo e a energia necessários um ao outro poderão criar uma parceria entre as duas maiores democracias do mundo capazes de desempenhar um papel estabilizador chave para o Sul da Ásia e além.

Jaswant Singh, ex-ministro das Finanças da Índia, ministro de Relações Exteriores e de Defesa, é autor de Jinnah: India, Partition, Independence e India At Risk: Mistakes, Misconceptions And Misadventures Of Security Policy.

© Project Syndicate, 2014

(Tradução: Roseli Honório)

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