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Terezinha Guilhermina: ‘O esporte me abriu todas as portas’

Dona de seis medalhas em Jogos Paralímpicos, ela entrou para o livro dos recordes ao correr 100m em 12s01

Por Luiz Felipe Castro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 7 set 2016, 11h06 - Publicado em 7 set 2016, 11h06

O sorriso fácil e o colorido que vai da sapatilha amarela fluo­res­cente ao cabelo rosa irradiam-se pela pista de treinamento. “Trinta e sete anos, com corpinho de 14 e cabeça de 18”, diverte-se Terezinha Guilhermina, dona de seis medalhas em Jogos Paralímpicos, três delas de ouro. Mineira de Betim, Terezinha nasceu de forma inesperada em cima da carroça em que o pai trabalhava — e, naquele dia, carregava a mulher (e prima em primeiro grau). Terezinha e quatro de seus onze irmãos nasceram com retinose pigmentar, uma doença progressiva e incurável que degenera as células da retina. A atleta paralímpica mais rápida do mundo compete na categoria T11, de corredores completamente cegos, com o auxílio de um guia. Ela, inclusive, já teve o parceiro dos sonhos, ainda que por um dia: Usain Bolt, que a guiou num evento no Rio de Janeiro, no ano passado. “Foi maravilhoso, Bolt é muito simpático”, recorda Terezinha.

Apesar da boa lembrança do mito jamaicano e da perfeita sintonia com Rafael Lazarini e Rodrigo Chieregatto, seus guias desde novembro, Terezinha conta que demorou a aceitar sua condição: nunca teve visão superior a 5%. “Achava que eu era normal, que todos enxergavam assim.” Percebeu que estava perdendo o que restava da vista quando começou a trombar mais que o normal, após sua primeira Paralimpíada. “Eu caía, quase fui atropelada, tive medo. Depois de Atenas 2004, procurei um oftalmologista, porque sempre tive pavor de mudar de classe e ter de competir com um guia.” Terezinha enxerga apenas alguns focos de luminosidade e, por isso, compete de venda – personalizada e colorida.

Os irmãos a ajudavam a esconder dos médicos sua real condição. Ao contrário de alguns atletas que fingem ter deficiências mais acentuadas para tirar vantagem na competição, a atleta mineira tentava, na verdade, omitir seu problema. “Queria um laudo que mostrasse que eu tinha visão estável. Meus irmãos entravam antes na sala e me davam dicas para eu não sair trombando: ‘Entra, dá dois passos para a esquerda e senta’.” Sempre divertida, conta que, mesmo sem enxergar nada, falava aleatoriamente todas as letras do alfabeto nos exames. Mas em 2005, sem a ajuda dos irmãos, não conseguiu disfarçar. “Saí da sala chorando, porque meu maior tormento seria depender de alguém para fazer o que mais amo: correr. Eu conseguia treinar sozinha, no sol quente, não tinha dinheiro para pagar um guia. Mas Deus não erra.”

A situação financeira foi seu primeiro grande obstáculo. Terezinha começou a correr em 2000, aos 22 anos, graças a um projeto social da prefeitura de Betim. Tinha acabado de concluir o ensino médio técnico em administração, mas não encontrava espaço no mercado de trabalho. “Primeiro me inscrevi na natação, porque tinha maiô. Mas queria correr, só não tinha tênis.” Ganhou o calçado da irmã e nunca mais parou. Quando conquistou sua primeira medalha, de prata, e uma premiação de 80 reais, Terezinha realizou um sonho. “Eu me senti milionária e comprei um iogurte de chocolate, algo que sempre quis, mas meus pais não podiam me dar.” Multicampeã e referência da Paralimpíada no Rio, a atleta tem hoje cinco grandes patrocinadores.

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Terezinha perdeu a mãe aos 9 anos e sempre foi muito apegada ao pai, que morreu em 2013 — a tempo de ver a filha ganhar duas medalhas de ouro em Londres e entrar para o livro dos recordes, o Guinness, como a mulher cega mais veloz do mundo ao completar a prova dos 100 metros em 12s01. A velocista admite sofrer preconceito e diz ter chorado muito ao longo da carreira, mas não guarda mágoas. “O esporte me abriu todas as portas. Eu me tornei uma atleta profissional, remunerada, tenho patrocínios e me formei em psicologia. Conheci lugares e conquistei o respeito e o reconhecimento da sociedade.” Terezinha vive desde o fim do ano passado em São Caetano do Sul (SP), onde treina, mas mantém um projeto social para crianças deficientes em Maringá, cidade paranaense em que passou a maior parte da carreira. “Ainda quero ter filhos, mas já tenho vários adotivos, as minhas crianças do instituto.”

Fortíssima candidata nas provas de 100, 200 e 400 metros, Terezinha está totalmente focada nos Jogos e disse que não vai levar a família e o namorado ao Rio para não perder a concentração. “A Paralimpíada é um show, e eu estarei no palco e não na plateia. É meu trabalho.” Mas, claro, espera a ajuda da torcida. “Em Atenas, Pequim e Londres, escutava a torcida gritar e sempre acreditei que fosse para mim. Desta vez vai ser mesmo, em português.” Seu visual — “exclusivo”, segundo ela — ajudará os torcedores a reconhecer uma das heroínas do esporte nacional. “Quem for ao Engenhão só precisará procurar a atleta mais colorida e torcer.”

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