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Opinião: tecnologia no futebol é bem-vinda. Mas com bom senso

Lance controverso no Mundial, na estreia oficial do árbitro de vídeo, já deixou um legado: a revisão deve ocorrer na hora - e quando há certeza absoluta

Por Luiz Felipe Castro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 14 dez 2016, 17h07 - Publicado em 14 dez 2016, 16h11

Os retrógrados da bola, aqueles contrários ao uso da tecnologia na arbitragem do futebol, foram ao delírio na manhã desta quarta-feira: em uma incrível ironia, houve um erro – ou ao menos uma decisão muito contestável – logo na estreia do chamado “árbitro de vídeo”, na semifinal do Mundial de Clubes, no Japão. O juiz húngaro Viktor Kassai, auxiliado pelo árbitro na sala de TV, o holandês Danny Makkelie, assinalou um pênalti para o Kashima Antlers contra o Atlético Nacional, mas ignorou – ou não considerou – um impedimento na origem da jogada. Mas mais importante que isso, houve muita demora até que uma decisão fosse tomada: 2 minutos e 17 segundos depois te ter ocorrido o lance. E com a bola rolando. De qualquer forma,  é oportunismo querer enterrar o árbitro de vídeo logo em seu primeiro dia de vida. Testes são para isso.

Diferente do que acontece nos “desafios” do tênis ou do vôlei, a aplicação da ajuda eletrônica no futebol é mais complexa, principalmente por causa das subjetividades do jogo. No tênis, um jogador solicita a revisão de uma jogada assim que um ponto é marcado (ele não pode demorar a pedir a revisão) e a tecnologia é categórica: a bola entrou ou não entrou. Fim de papo. O auxílio das câmeras é fundamental para diminuir erros, que podem decidir campeonatos e, claro, movimentar muito dinheiro. Mas, no futebol, a aplicação da tecnologia ainda carece de acertos, bom senso, e o lance desta manhã comprova isso.

Sucessão de erros

Primeiramente, no teste estabelecido pela Fifa, não há “desafio”: quem solicita a revisão de um lance é o próprio árbitro de vídeo, que tem à sua disposição 23 câmeras, e cabe ao juiz principal julgar se aceita a recomendação. E, conforme a Fifa explica, as mudanças só podem ser confirmadas em quatro situações: gols (se a bola cruzou a linha de gol ou qualquer outra irregularidade, como um impedimento), pênaltis (que inclui lances de mão na bola), cartão vermelho e erro de identificação (quando um jogador recebe uma punição no lugar de outro).

Pênalti polêmico marcado para o Kashima Antlers no Mundial de Clubes da FIFA, com a utilização do recurso de vídeo
Lance do pênalti polêmico para o Kashima Antlers (Reprodução/TV Globo)

Portanto, a priori, o árbitro de vídeo seguiu a recomendação ao avisar o juiz Kassai sobre uma situação de pênalti. Seu erro, humano e não tecnológico, foi não perceber que o japonês Nishi Daigo estava impedido na origem do lance. E, sobretudo, os danos que o atraso para a revisão do lance podem causar.

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Passaram-se incríveis dois minutos e 17 segundos de bola rolando até que o árbitro húngaro fosse avisado e, depois de conferir o lance num monitor à beira do gramado, assinalasse a penalidade. E se ocorresse, por exemplo, um gol do Atlético Nacional? Ou uma expulsão? Seria tudo anulado e o juiz assinalaria o pênalti original? O bom senso pede que as revisões sejam rápidas, na hora do lance, como já ocorre no futebol americano e no basquete, por exemplo.

Há ainda outro ingrediente apimentado na discussão: alguns especialistas em arbitragem, como o ex-juiz Carlos Eugênio Simon, comentarista da Fox Sports, consideraram que a revisão foi correta, pois a bola não chegou a Nishi Daigo, o que não configuraria impedimento. Em seu site , a Fifa usou a mesma justificativa: segundo a entidade, não houve impedimento, pois o jogador japonês não participou do lance – justamente por causa da falta sofrida, ele teria sido impedido de disputar a bola com o colombiano Orlando Berrío. Ou seja: ao contrário do tênis ou do vôlei, nas quais as decisões são muito mais objetivas, o futebol tem regras interpretativas. Arnaldo Cézar Coelho, o pai do termo (equivocado) “a regra é clara”, não só discordou de Simon e da Fifa como considerou o erro “uma vergonha”.

Conclusão: só mude quando tiver certeza (e rápido)

A ajuda tecnológica é, sim, benéfica ao futebol e a qualquer outro esporte, mas sua aplicação precisa ser aprimorada. Testes como o do Mundial de Clubes são para isso e o lance ocorrido nesta quarta em Osaka já deixou um legado: não convém mudar a decisão inicial do árbitro em lances extremamente interpretativos. Isso causa demora muito grande e não acaba com a possibilidade de equívoco. E, se for feito, a bola deve estar parada, nunca em jogo.

Estranha o fato de o projeto VAR (Árbitros Assistentes de Vídeo, na sigla em inglês) já ter sido testado em campeonatos menores na Holanda e nos EUA. Será que ainda não haviam pensado em casos como o de hoje?

Há ainda outras situação impossíveis de resolver: imagine que um jogador receba um lançamento, o juiz assinale impedimento, toda a defesa pare e o atacante marque um gol. Em seguida, o árbitro de vídeo percebe que o impedimento foi mal marcado. Neste caso, o gol não poderá ser validado, pois a defesa não deu sequência no lance e não pode ser punida pelo primeiro erro do árbitro.

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Parece claro que as melhores formas de consertar um erro de arbitragem no futebol são em situações de gols confirmados, não em penalidades ou jogadas anuladas. Uma delas já existe há anos (foi usada na Copa de 2014, em gol do francês Benzema): um chip na bola mostra se a bola ultrapassou totalmente a linha ou não – em caso idêntico ao que ocorre nos desafios de tênis. Um sucesso incontestável.

Outra possibilidade, a mais interessante delas, é a de um gol incorretamente validado ser anulado pelo árbitro de vídeo. Enquanto o time celebra seu gol, o árbitro de campo terá tempo para ser avisado e julgar se houve uma irregularidade clara (impedimento, mão na bola, etc) e anular o gol antes de o jogo ser reiniciado.

O fato inadmissível desta manhã de quarta-feira não foi a revisão em si, mas o fato de a bola ter rolado por mais de dois minutos até que a decisão fosse tomada. É burrice abrir mão da tecnologia por mero “ódio ao futebol moderno”. Mas é preciso saber usá-la para não piorar ainda mais a situação.

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