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Bia Haddad: “Não falo de ranking. Quero ser melhor do que ontem”

A melhor tenista do Brasil estreia nesta terça no qualifying de Roland Garros, onde há 20 anos Guga conquistava seu primeiro título de Grand Slam

Por Alexandre Senechal Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 29 Maio 2017, 15h29 - Publicado em 22 Maio 2017, 18h00

Nesta terça-feira, a tenista paulistana Beatriz Haddad Maia faz sua estreia na fase classificatória do torneio de Roland Garros rodeada de expectativa. Em apenas cinco meses, Bia, como gosta de ser chamada, subiu 88 posições no ranking mundial e alcançou o Top 100 pela primeira vez na carreira, feito que apenas outras sete brasileiras conseguiram até hoje. O título do Aberto de Cagnes-sur-Mer, na França, no início do maio, deu a pontuação necessária para a tenista de 20 anos chegar ao grupo das 100 melhores do mundo e a credenciou como cabeça de chave número 3 do qualifying do Aberto da França – Bia precisa vencer três partidas para chegar à fase principal de Roland Garros.  

Duas décadas depois do título improvável de Gustavo Kuerten no Grand Slam francês, Bia Haddad dá sinais claros de evolução, a ponto de chamar a atenção da Federação Internacional de Tênis (ITF) – Bia é um dos 14 tenistas (de ambos os sexos) que recebeu uma bolsa no valor de 50 000 dólares do Fundo de Desenvolvimento dos Grand Slam, para custear as idas e vindas da carreira profissional. A melhor tenista do Brasil conversou com VEJA na véspera de sua terceira tentativa de chegar à chave principal de Roland Garros. Ela falou sobre a evolução recente, sobre a experiência de ser treinada por Larri Passos, o mesmo que levou Guga ao posto de número 1 do mundo, e sobre suas pretensões no esporte.

Como o tênis entrou na sua vida? Eu comecei a jogar ainda pequenininha com minha mãe e minha tia, que são professoras de tênis. Eu brincava com elas e meus primos. Eu sempre gostei de esportes. Além do tênis, fazia futebol, judô e natação no Clube Sírio, em São Paulo. Com 9, 10 anos, decidi ficar só no futebol e no tênis. Com 13, não teve mais jeito. Fui morar em Balneário Camboriú para treinar na academia do Larri Passos (técnico que se consagrou ao levar Gustavo Kuerten a três títulos de Roland Garros e ao topo do ranking mundial). Eu já morava sozinha desde os 14. Já tinha na cabeça que queria aquilo pra minha vida.

E como era sua relação com o Larri? Ele é maluco (risos). Ele tem um coração imenso, é um cara que trabalha muito duro, deu muito duro na vida, se dedicou para estar com o Guga. Treinei com ele dos 13 até os 18 anos. Foi uma honra. Eu o via na TV e era fã, então poder aprender diretamente da fonte foi um prazer. Ele é um gênio por tudo que fez com o Guga. Na quadra, ele exige bastante. Tem um jeito firme, se impõe, é positivo, e coloca o coração em primeiro lugar. É o diferencial dele. É muito apaixonado pelo que vez e se arrepia toda a vez que entra na quadra. É muito bonito de ver.

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Vocês conversavam sobre a história dele com o Guga? Sim. O Guga é meu ídolo e acabei dando a sorte de treinar na academia do Larri e vivenciar o que ele também viveu. Sempre via vídeos do Guga, li a sua biografia. Conheço sua história desde pequena porque, como a família toda é tenista, a gente acabava falando muito sobre esse assunto.

Ele é a sua maior referência? Guga é ídolo para sempre! A primeira coisa que olhei quando cheguei em Roland Garros foram os nomes dos campeões. Fiz uma foto no Instagram mostrando o nome do Guga três vezes como vencedor. Mas (o suíço Roger) Federer e (o espanhol Rafael) Nadal também são especiais. São dois atletas fora da curva.

E no feminino, em quem você se espelha? Eu gosto muito da (Petra) Kvitova, da República Checa. Ela é canhota como eu e jogamos de forma parecida. Assisto a muitos vídeos dela para aprender.

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Em 2017, o primeiro título de Roland Garros do Guga completa 20 anos. Você acha que pode repetir a história de Cinderela dele? O tênis é imprevisível. Você vai do céu ao inferno em pouco tempo. Procuro sempre fazer o melhor que posso naquele momento. Quero ganhar Roland Garros? Quero. Mas sei não é assim. Todas as meninas jogam muito bem, toda partida é muito dura e o tênis tem muito detalhe, muito pontinho. As condições também influenciam. Eu procuro sempre me preocupar com o próximo jogo, no próximo ponto.

A tenista Bia Haddad durante o Rio Open (Matthew Stockman/Getty Images)

Qual seu principal objetivo hoje? É estar saudável e feliz. Cheguei a conclusão que isso é mais importante do que qualquer outra coisa. É cuidar do físico, porque sou nova e posso jogar mais uns 10 anos ainda. O objetivo é ter condições de estar nesse nível por mais tempo possível e jogar com as meninas que podem me fazer evoluir. Não falo de ranking. Claro que tenho o sonho de ganhar um Grand Slam, virar número 1 do mundo, tudo isso. Mas meu objetivo é sempre ser melhor do que ontem.

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A que fator você atribui o sucesso dos últimos meses? Um ponto crucial foi a evolução da minha parte física. O trabalho com o (preparador físico) Alexander Matoso é muito bom, especifico para as minhas necessidades. Sinto agora que começou a fazer diferença, porque estou jogando jogos mais duros. Tenho força no saque e também consigo jogar pontos longos. O ponto físico foi crucial. Outra razão é o trabalho em pontos específicos no meu jogo que o German (Gaich, seu atual treinador) tem realizado. Fico muito feliz de estar entre as 100 melhores jogadoras do mundo, mas quero evoluir ainda mais. O meu sucesso não aconteceu do nada. Parece que foram três semanas que mudaram minha vida, mas trabalhei pelo menos dez anos para isso.

Com os bons resultados e sua entrada no Top 100 do ranking, aumentou o reconhecimento? Não sinto isso. Como fico muito mais tempo na Europa, por conta das competições, acabo vivendo mais o dia a dia do tênis e não vejo todo esse assédio. A família e os amigos sempre avisam quando veem alguma coisa no jornal, na TV, mas eu não percebo. Mas isso é uma coisa boa, porque assim fico tranquila e foco no que tenho que fazer aqui. Recebo muita energia positiva das pessoas que estão perto de mim e é bom saber que elas estão comigo em momentos bons e ruins, pois sabem o tanto que ralei para chegar até aqui.

Como é dividido seu calendário? De janeiro a novembro a gente joga. É difícil ter planejamento porque é tudo baseado no ranking. Normalmente são blocos de três, quatro semanas em competições, para depois voltar, treinar, recuperar, e aí competir mais três, quatro semanas. Como as viagens são muito caras, às vezes compensa ficar direto e treinar por lá.

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E o seu dia a dia? Acordo e medito logo de manhã. A meditação me ajuda a focar em uma coisa só e eu consigo me concentrar mais nos treinamentos e nos jogos. Normalmente, a gente treina bastante em dois períodos, com dois turnos longos e fisioterapia. Depende muito das condições, e de quanto tempo falta para voltar a competir. No total, dá uma média de 4 horas por dia de treino.

Nessas viagens todas, é impossível não passar por algum perrengue, certo? Nunca me perguntaram isso, mas foi bom que você tenha levantado o assunto. A imagem que as pessoas têm é de que o tenista só viaja de primeira classe, fica nos melhores hotéis e tem tudo do bom e do melhor. A realidade é bem diferente.

Em 2017, Bia já enfrentou a americana Venus Williams no Miami Open: foi derrotada por 2 sets a 0, parciais de 6/4 e 6/3 (Julian Finney/Getty Images)

Você pode revelar alguma história? Certa vez fiquei presa no aeroporto na Alemanha, não me lembro em qual cidade. Eles fecharam tudo porque havia ocorrido um atentado em uma cidade próxima e a gente ficou ilhado. Fiquei lá a madrugada toda porque o voo só sairia na manhã seguinte. Meu técnico até conseguiu dormir por algumas horas, mas eu não pregava o olho. Terça já jogava em Campos de Jordão e estava preocupada com o fato de não chegar a tempo para jogar. A companhia aérea deu um pouco de água, uns chocolates, mas eu não conseguia relaxar. No final, deu tudo certo. Mas não é fácil. Teve também uma em que, para chegar do aeroporto até o hotel, tínhamos que pegar um trem. Só que estávamos com três malas cada um. Olhamos pra cima, havia uma escada gigante e, pra ajudar, a escada rolante estava quebrada. Olhei para o German (Gaich, seu treinador a época) e falei: “Não vou precisar fazer academia hoje”. E olha que ele ainda pegou a maioria do peso, para que eu não fizesse muito esforço. Isso tudo depois do moço da cadeira na frente do avião reclamar que minha perna estava incomodando. Ah, e não foi só ele. A aeromoça também reclamou quando colocava a perna no corredor e ela não conseguia passar com o carrinho.

Já vivenciou alguma situação de preconceito ou assédio? Nunca. Eu tenho o meu jeito espontâneo e sempre respeitaram muito. Eu namoro o Thiago Monteiro, que também é tenista profissional (atualmente, número 95 do ranking mundial), e sempre me dei muito bem nesse meio, não tenho muita frescura. Eu acho que isso ajuda a quebrar o gelo, para que não me olhem diferente, como uma princesa. Sempre fui muito profissional e trabalhei com muito respeito.

Como é para você namorar outro tenista? É legal. Não somos de sair e beber, ou de ir pra ‘night’. Somos muito apegados à família. A gente se entende muito bem pois temos a mesma rotina, os mesmos objetivos e a mesma equipe (ambos treinam na academia Tennis Route, no Rio de Janeiro). Passamos muito tempo longe um do outro, mas nos falamos por mensagem, Facetime e vamos levando. Compreendemos muito o momento do outro. É muito legal quando ele consegue ter resultados expressivos. Para mim, ele pode chegar entre os melhores do mundo. Tem uma bola muito pesada, lida bem com a pressão e com os momentos difíceis. 

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Maria Sharapova acabou de voltar de uma suspensão por doping e não recebeu convite para disputar o torneio de Roland Garros. Qual sua opinião sobre isso? Se pessoa foi pega (no exame antidoping) é porque ela deve ter tomado alguma coisa. No caso, ou ela já sabia, ou já tinha sido avisada que a substância era proibida. Se você faz o acompanhamento, não tem risco. É diferente do caso de uma pessoa, por maldade, colocar algo na sua comida. Mas parece que não foi o caso. Se ela foi pega, tem que pagar por isso. O controle tem que existir e deve valer para todos. É o que acredito ser correto. Somos profissionais e (esse controle) faz parte da nossa carreira. Tanto que não existe só no tênis.

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