‘Tabu’, de Miguel Gomes, racha ao meio a crítica
Não tem meio termo: filme em preto e branco e cheio de referências do diretor português merece o Urso de Ouro ou é insuportavelmente pretensioso
Autor do título mais ambicioso, do ponto de vista formal, da competição da 62ª edição do Festival de Berlim, o português Miguel Gomes não vai ficar muito aborrecido se não levar o Urso de Ouro de melhor filme, que será revelado na noite deste sábado, dia 18. O diretor de Tabu, longa-metragem português realizado em coprodução com o Brasil e França, trouxe o seu de casa. “Foi feito pela minha filha, que me entregou antes de vir para o festival “, diz o diretor ao site da Veja.com, enquanto tira da carteira um pedaço de papel com o desenho de um animal que lembra, muito vagamente, os contornos de um urso, colorido de amarelo. “Ela diz que é de ouro”, ri.
Exbido na noite de terça-feira (14), Tabu dividiu a plateia de jornalistas ao meio: a metade a seu favor o coloca entre os favoritos a prêmios; a outra ficou incomodada com as pretensões artísticas e filosóficas. A começar pela citação explícita ao filme homônimo do diretor alemão Friedrich Murnau (1888-1931), realizado em 1931, e do qual também toma emprestado o título de seus dois capítulos “Paraíso” e “O Paraíso Perdido”. As citações cinematográficas prosseguem aqui e ali ao longo da narrativa, misturando frases e situações de Entre Dois Amores (1985), de Sidney Pollack, e Crocodilo Dundee (1986), com o passado colonial português na África.
O filme foi rodado em preto e branco e o segundo capítulo, rodado com película 16mm, não tem diálogos, como na era do cinema mudo. “Mais do que uma simples homenagem ao cinema, criei uma história que fala sobre a memória de coisas que se perderam no tempo”, avisa Gomes, de 39 anos, conhecido no Brasil pelo festivo e solar Aquele Querido Mês de Agosto (2008). “Desta vez, tentei algo radicalmente diferente de meu filme anterior. Tanto em relação à forma narrativa como também ao espírito da trama. Tabu é um filme nostálgico, pesaroso. Espero muito não desapontar aqueles que adoraram Aquele Querido Mês de Agosto“.
“Paraíso”, a primeira parte, é centrada é centrada em Aurora (Laura Soveral), octogenária solitária e um tanto senil, que vive sob os cuidados da empregada cabo-verdiana Santa (Isabel Cardoso) e da vizinha Pilar (Teresa Madruga). Às vésperas de sua morte, a senhora encarrega as duas outras mulheres de encontrar Ventura (Henrique Espírito Santo), um antigo amante. É este que narra os acontecimentos da segunda metade, O Paraíso Perdido, ambientado em uma ex-colônia africana, nos anos 60. Foi ali que a jovem Aurora (Ana Moreira), dona de uma fazenda de chá e ótima caçadora, conhece Gian Carlo Ventura (Carloto Cotta), amigo de seu marido (o brasileiro Ivo Müller), por quem se apaixona e vive um romance proibido.
“A história de amor entre Aurora e Ventura é melancólica, carregada de um sentimento de finitude. É com ela que traço um paralelo com outras coisas que se extinguiram, como a juventude dos personagens, a colonização, e até mesmo a películo como material básico do cinema”, resumiu o diretor.