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Rui Vilhena, um forasteiro na dramaturgia global

O autor nascido em Moçambique, criado no Brasil e famoso em Portugal é o primeiro estrangeiro a entrar para o time de novelistas da Globo

Por Mariana Zylberkan
21 Maio 2012, 16h55

Portugal e Brasil são dois países que dividem não apenas uma história, mas também a paixão por um tipo de entretenimento. Aqui e lá o apelo popular das telenovelas produzidas pela TV Globo mobiliza multidões em frente aos televisores. Por isso, o país europeu é um dos maiores importadores dos folhetins brasileiros. Neste ano, porém, Brasil e Portugal vão trocar personagens. O autor Rui Vilhena – nascido em Moçambique, criado no Brasil e uma celebridade da TV portuguesa -, de 51 anos, vai deixar o canal TVI para escrever novelas na Globo. Vilhena é o primeiro novelista importado pela emissora carioca. Depois de colaborar com Aguinaldo Silva em Fina Estampa, ele deve estrear como autor titular em 2013 na faixa das 19h, como parte do esforço da emissora para renovar seu time de novelistas.

“É engraçado: em Portugal sou considerado brasileiro e, de volta ao Brasil, sou visto como português. Ninguém se decide quanto à minha nacionalidade. Nos oito meses em que colaborei com Aguinaldo, lia notas na imprensa e achava graça quando se referiam a mim como autor português”, diz Vilhena, que escreve novelas em Portugal há 15 anos.

O dramaturgo foi o responsável por quebrar a hegemonia da Globo em solo lusitano, feito ainda inédito no Brasil. Em 2005, sua novela Ninguém como Tu suplantou em audiência Belíssima, de Silvio de Abreu, exibida pela SIC no mesmo ano. A trama sobre um assassinato misterioso exibida pela TVI chegou a alcançar 43,9% do público. A média de Ninguém como Tu foi de 16,5% de audiência contra 9% de Belíssima. Vilhena também escreveu as novelas Sedução (2010), Olhos nos Olhos (2008) e Tempo de Viver (2006) para a TVI, além de Vila Faia (2007) e Terra Mãe (1998) para a RTP.

A expectativa em torno do último capítulo da trama foi capaz de parar o país. “Eu estava no Brasil com a minha mãe, que estava doente, mas a minha mulher me telefonou e disse: ‘Você não tem noção do que está acontecendo’. A televisão só falou da novela o dia inteiro, entrevistou as pessoas nas ruas. Um helicóptero acompanhou ao vivo o carro-forte que transportou o tape do último capítulo, da produtora até o canal de televisão. Foi mesmo um evento”, lembra o autor Rui Vilhena.

A seguir, a entrevista concedida pelo autor de sua casa em Lisboa, por telefone.

Por que a Globo o chamou agora para trabalhar no Brasil? A Globo está à procura de novos autores. Fazer novela é um trabalho muito complicado, então, eu, por ser experiente, represento mais-valia para a emissora. Não é fácil encontrar profissionais que já disponham desse conhecimento. Por isso, muitos autores trabalham com outros mais experientes até estarem aptos a escrever sozinhos.

O que a sua experiência em Portugal pode trazer de novidade à TV brasileira? O mecanismo de produção das novelas em Portugal é totalmente diferente do Brasil. Eu estou acostumado a trabalhar com orçamentos mais baixos, então, ter a estrutura do Projac à disposição é como a cereja do bolo para mim.

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Por que Ninguém como Tu (2005) foi capaz de desbancar a liderança histórica das novelas da Globo em Portugal? A história era muito boa e a novela tinha um ritmo completamente diferente do que era feito em Portugal — foi influenciada pela telenovela brasileira. Eu assistia às novelas portuguesas e brasileiras e percebia um abismo entre as maneiras de contar histórias. Por isso, as brasileiras sempre tiveram muito mais audiência em Portugal. Na realidade, o que eu fiz foi adaptar uma história portuguesa ao ritmo do Brasil. Ninguém como Tu não tinha tempo morto, era tudo rápido, a trama era recheada de ganchos. A minha preocupação era segurar o telespectador e não o deixar levantar nem para fazer xixi. Eu apostei tudo nessa novela, trabalhei como um louco. A partir daí, o estilo das novelas portuguesas passou a ficar mais acelerado. Até então, a última novela a parar Portugal havia sido Gabriela. No dia em que foi exibido o último capítulo de Ninguém como Tu, o país parou. Eu estava no Brasil com a minha mãe, que estava doente, mas a minha mulher me telefonou e disse: “Você não tem noção do que está acontecendo”. A televisão só falou da novela o dia inteiro, entrevistou as pessoas nas ruas. Um helicóptero acompanhou ao vivo o carro-forte que transportou o tape do último capítulo da produtora até o canal de televisão. Foi mesmo um evento.

A sinopse da sua novela de estreia na Globo já foi aprovada? Eu ainda estou trabalhando na ideia. Eu acabei Fina Estampa em maio, então ainda estou numa fase de reciclagem. Tenho me dedicado a ler muita coisa, a ir ao teatro e ao cinema, a viajar e, no meio de tudo isso, já acendeu uma lampadazinha na minha cabeça. Na Globo, a história é consoante com o horário em que é exibida, tanto que isso deve ser levado em consideração.

Você foi escalado para o horário das 19h? Eu sei que não vou estrear no horário nobre, por razões óbvias. Então, será na faixa das 18h ou das 19h. A Globo é muito cuidadosa e eu acho que eles têm razão. A pessoa tem que primeiro se acostumar com todo o mecanismo de trabalho, a logística da casa, para depois caminhar lá dentro com os próprios pés.

Sua novela de estreia na emissora vai ser uma história atual? Eu sempre fui um autor das 21h em Portugal, portanto, meu estilo sempre foi denso. Eu agora tenho que construir uma história de acordo com o perfil de outro horário. Eu já fiz sitcom, série, programa infantil, muitas coisas, o que me deu bagagem suficiente. Eu considero que a história das 18h e das 19h é muito próxima da apresentada às 21h, só não é tratada com a mesma densidade.

Sua novela vai se passar no Brasil ou há a possibilidade de ter cenas gravadas em Portugal? Confesso que ainda não pensei no assunto. Mas é rovável que a história tenha um tempero português adicionado. Gosto muito do intercâmbio de atores nas novelas. É bem possível que tenha alguma personagem portuguesa na trama.

Como é seu processo criativo? Faço um levantamento dos temas que vão estar na boca do povo nos três meses seguintes à estreia da novela. Aqui em Portugal, eu fiz isso. Sabia que dali a sete meses haveria a votação sobre a legalização do casamento homossexual e adiantei esse assunto na novela Ninguém como Tu.

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Você é visto como um estrangeiro pelos colegas na Globo? É engraçado, porque em Portugal eu sou considerado brasileiro e agora, de volta ao Brasil, eu sou visto como português. Ninguém se decide quanto à minha nacionalidade. Nos oito meses em que colaborei com o Aguinaldo, lia notas na imprensa e achava graça quando se referiam a mim como autor português.

Seu primeiro trabalho na Globo foi como colaborador de Aguinaldo Silva em Fina Estampa. Como se deu a aproximação entre vocês? Eu tinha uma empresa de conteúdos em Portugal. Fiz várias novelas e percebi que a demanda por autores era enorme, por isso, criei uma empresa para reunir talentos. Nós achamos que seria legal ter uma pessoa de peso no mundo das novelas para dar um workshop. Nós escolhemos o Aguinaldo pelas razões óbvias. Ele é um grande autor. Nós nos tornamos amigos e, alguns anos mais tarde, a Globo me convidou para trabalhar no Brasil. Como já havia uma ligação com o Aguinaldo, fazia todo sentido que eu fosse trabalhar com ele.

Você sempre quis ser novelista? Eu tenho 51 anos, então sou daquela época em que as famílias se encontravam na sala de casa para ver novela. Eu tenho capacidade de criar e gosto de contar histórias. Há um cordão umbilical entre a minha história de vida e as novelas. Não tinha como escapar.

Como foi o começo no mercado português? Não foi fácil. Quando cheguei aqui, apesar de ter família em Portugal, não conhecia ninguém do meio. Levou dois anos até eu conseguir furar a muralha. Meu primeiro trabalho foi para o Clube Disney. Depois, comecei a conhecer gente do meio e fui fazer minha primeira novela. Eu faço novelas há uns 15 anos.

Quando você se muda para o Brasil? Na verdade, já estou morando no Brasil, mas vou manter meu apartamento em Portugal. Eu funciono como uma esponja. Ver outros países, outras realidades, é algo muito importante. Inclusive, posso adaptar as histórias que eu vejo aqui ao estilo brasileiro. A globalização não é só de mercadorias, é de pessoas, de ideias, de tudo.

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