‘O Mistério da Felicidade’, um filme em três camadas
Novo longa do argentino Daniel Burman, sua primeira coprodução com Brasil, é uma comédia sobre duplo abandono, mas também melancolia e esperança
Há nove anos, a atriz argentina Ines Estévez resolveu abandonar a carreira e se dedicar à família e a outras paixões. Até que, no ano passado, ela recebeu um convite do diretor Daniel Burman (de O Abraço Partido e Ninho Vazio) para estrelar O Mistério da Felicidade (El Misterio de la Felicidad), coprodução entre Brasil e Argentina que tem sessões nos dias 1º e 8 de outubro, no Festival do Rio. “Eu não queria mais nada com a carreira de atriz. Mas me encantei com o projeto e, graças a ele, redescobri o amor pela profissão. Encontrei o mistério da felicidade nesse trabalho que escolhi”, diz Inés, que no filme interpreta Laura, uma mulher abandonada pelo marido e que, segundo a atriz, transita por lugares dolorosos. “Mas dessacraliza a dor.”
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O saldo final é alto astral, quase solar, embora previsível. O filme se ancora primeiro na amizade masculina. Depois, na crise gerada pela ruptura da rotina. Inés Estévez brilha com uma personagem com variações de humor, que abusa de antidepressivos e remédios para dormir e fala sem parar, chacoalhando a vida previsível de Santiago. Guillermo Francella também está ótimo como um Santiago perplexo ao descobrir que Eugenio não amava a vida que eles levavam.
O filme tem partes gravadas na Argentina, com equipe local, e outras, no Brasil, com equipe brasileira. “Imaginei que filmar com uma equipe em uma semana e com outra na seguinte seria traumático, mas na verdade foi libertador. Percebi que temos uma linguagem comum, que não é o portunhol. Passamos por processos de transformação social parecidos. A única dificuldade foi estrutural. Foi impossível fazer uma coprodução oficial, teve que ser privada”, comenta Burman.
Diretora do Rio Market, área de negócios e workshops sobre o mercado de cinema e TV do Festival do Rio, e produtora de O Mistério da Felicidade, Walkiria Barbosa explica que a burocracia no processo de captação de recursos no Brasil fez com que o filme fosse todo financiado sem dinheiro público. “O que se leva quatro semanas para resolver na Argentina, aqui levou nove meses. Não tínhamos como esperar tanto. Mas a gente já está em conversa avançada com a Ancine para reformulações”, diz ela, revelando que já tem nova coprodução em vista com Daniel Burman: a continuação de O Abraço Partido, longa ganhador do Urso de Prata no Festival de Berlim de 2005 nas categorias melhor ator (Daniel Hendler) e melhor diretor.